O Consórcio Intermunicipal de Prefeitos é espécie de vitrines da Avenida Paulista em noite de comemorações da torcida são-paulina. Celso Daniel, o maior de todos em planejamento integrado, quebrou a cara e, desiludido, recuou da generosidade regionalista nos dois últimos anos de vida porque sentiu que malhava em ferro frio. Provavelmente William Dib, prefeito de São Bernardo, chegue à conclusão semelhante quando encerrar a temporada de 12 meses à frente da instituição.
O Consórcio de Prefeitos é muito mais a multiplicação de confrontos dissimulados do que a soma de consensos expressos. Abundam pautas e escasseiam soluções. Quem se precipitar em apontar má-vontade deste jornalista não sabe o quanto está arriscando. Disponho de arsenal poderosíssimo para provar por todas as provas que nadamos, nadamos e morremos na praia. Tudo porque o Consórcio é um festival de diplomacias vazias. Sobram gentilezas, faltam resoluções. A velha camaradagem nacional, que literatos do passado tanto apregoaram, exibe a contra-face da improdutividade.
Já perdi a conta do quanto escrevi sobre o Consórcio de Prefeitos. Tive até arranca-rabo com Celso Daniel, num debate no Imes, em São Caetano, quando, ao cumprir rigorosamente o que entendia lhe competir, ou seja, manter o bom relacionamento com os demais titulares de paços municipais, o prefeito de Santo André derramou-se em elogios nas comemorações de mais uma data de aniversário de fundação da entidade. Lembro-me que o encontro se deu dois meses antes da desgraça nos três tombos. Celso Daniel e Daniel Lima sabiam entender-se nos desentendimentos.
Tanto que no mês seguinte lá estavam eles num Clube Atlético Aramaçan de 2,5 mil convidados no lançamento da maior obra coletiva da região, o “Nosso Século XXI”, com a participação de 29 articulistas. Celso Daniel estava lá e, mais que todos, procuradíssimo aos autógrafos.
O Grande ABC teima em não levar em conta lições da história. Discorremos muito sobre as razões de o Consórcio de Prefeitos não acompanhar o ritmo da chuva de mudanças macroeconômicas que nos levaram para o terreno escorregadio de perda de boa parte da riqueza de nosso coração desenvolvimentista — a indústria automotiva. Agora, pelo que se observa, William Dib está repetindo enredo dos antecessores: deixa-se levar por uma democracia excessivamente permissiva de sete prefeitos que não neutralizam individualidades.
Vamos a um exemplo prático que é rotina nos encontros do Consórcio: a reunião de ontem envolveu temário tão extenso que é impossível dar conta das demandas, porque não se sedimentam prioridades. Aliás, essa posição enfatizava ainda recentemente o prefeito de Paris, convidado a evento em São Paulo no qual discorreu sobre gestão metropolitana. Ele foi claro na definição de produtividade: que se elejam alguns poucos problemas mais emergenciais e se trabalhe intensamente para resolvê-los. Infelizmente, o Consórcio dos Prefeitos está tão baratinado na prática da quantidade em vez da qualidade que se perde nas próprias pernas.
O encontro de segunda-feira última foi uma overdose de dispersão. Vejam só, com paciência, o que se discutiu. Primeiro, a Lei do PDPA Billings. Traduzindo: o prefeito Clóvis Volpi, de Ribeirão Pires, coordenador da área de implementação de Meio Ambiente do Consórcio e presidente do Subcomitê das Bacias Hidrográficas Billings e Alto Tamanduateí, informou sobre as atividades da comissão de elaboração do projeto de lei estadual do Plano de Desenvolvimento e Proteção Ambiental da bacia, com previsão de encaminhamento à Assembléia Legislativa até o final deste ano. Só a reprodução do enunciado temático tira o fôlego.
Finda essa etapa, o que se debateu foram os chamados Ecopontos de Coleta de Pneus Usados, apresentado aos prefeitos por Renato Maués, coordenador da área de infra-estrutura do Consórcio. Ele detalhou as propostas de localização dos pontos de coleta nos respectivos municípios, de forma a facilitar acordo por meio da Câmara Regional referente ao Projeto Via Viva, para reciclagem e utilização como agregado flexível de concreto, empregando no processo pessoas deficientes. Transplanto vários trechos da programação enviada pela assessoria de imprensa do Consórcio de Prefeito integralmente aos leitores.
Seguindo com a toada de calhamaço consorciano, discutiu-se também convênio com a Opas, uma exposição sobre convênio para atuação dos SUSs no Grande ABC, envolvendo a Faculdade de Medicina do ABC, o Ministério da Saúde, os municípios e a Organização Panamericana de Saúde.
Pretendia dar sequência ao detalhamento do programa do encontro dos prefeitos na última segunda-feira, mas sinto que se está tornando cansativo. Sucintamente, foram ainda colocados à mesa a Campanha para Coleta de Sangue, o Comitê da BH-AT (deliberação específica sobre os membros titulares e suplentes do Grande ABC no Comitê da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê), o Projeto Jica (da bacia da Billings), e o Projeto Mananciais Sul, além da Universidade Federal do Grande ABC.
Convenhamos: trata-se de elefantismo temático incapaz de alcançar racionalidade e produtividade. As reuniões do Consórcio de Prefeitos precisam sair do quartinho de despejo de generalidades e varejismos e atacar de frente um grupo de problemas que fazem a diferença entre o Grande ABC que temos e o Grande ABC que queremos. Entregar a técnicos das prefeituras deslocados para o Consórcio a orquestração desses encontros é ótima oportunidade para que aqueles profissionais provem que trabalham, que suam a camisa, mas, infelizmente, e isso está provado pela derrocada da economia regional, não altera favoravelmente o placar de um jogo de competitividade que está além dos limites nacionais.
O presidente do Consórcio Intermunicipal de Prefeitos William Dib precisa adotar na entidade o mesmo princípio reformista que infligiu à burocracia gerencial da Prefeitura de São Bernardo, ao criar três supersecretários que lhe dão condições para destrinchar macroproblemas do Município. Levar os sete prefeitos do Grande ABC a debates mensais explicitamente diversos é desperdício tão cansativo quanto frustrante.
O Fórum da Cidadania e a Câmara Regional caminharam para o desfiladeiro de desilusões exatamente porque seus dirigentes pretenderam agarrar o mundo. A inclusão da Universidade Federal do Grande ABC no temário da entidade somente agora, depois que já deitaram e rolaram sobre o assunto, com o PT dando as cartas e jogando de mão, parece tardia, embora, evidentemente, não possa ser desprezada. O Consórcio de Prefeitos precisa fugir da camisa de força de orquestração de gentilezas mútuas que escondem latentes conflitos, principalmente de gerenciamento de resultados.
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24/10/2024 UFABC fracassa de novo. Novos prefeitos reagirão?