Regionalidade

Alô, alô, inconformados!

DANIEL LIMA - 07/01/2010

A arma dos acovardados sociais que permanecem em silêncio — quando não em tratativas divisionistas — diante de fatos que exigem tomada de posição é apontar os poucos que se manifestam como supostos agentes do mal, contra os quais, aliás, não faltam injúrias e difamações. Por isso é ótimo anunciar que no pequeno batalhão de regionalistas que não perdem o senso de responsabilidade social está a escritora e agitadora cultural Dalila Teles Veras. Pobre Dalila que, como este pobre Daniel, insiste em sensibilizar gente que perdeu completamente o respeito pelos cargos que exercem, pelos descendentes que deixarão.


O texto que Dalila Teles Veras escreveu no final do ano passado e que está publicado no endereço eletrônico pelo qual responde como reduto em defesa da cultura regional é um bálsamo para este jornalista.


Tomei conhecimento do assunto ontem, quando efetivamente voltei de férias, e me dei ao trabalho diário de vasculhar os endereços eletrônicos de minha seletiva preferência. Lá está Dalila, inesgotavelmente contundente, para fazer um balanço no Núcleo Estratégico de Cultura do Clube dos Prefeitos.


bullet_quadrado Para quem, como eu, participa da vida cultural da região há 30 anos, é sempre desanimador constatar que, após a luta para galgar dois degraus, despencamos cinco. É como se estivéssemos praticando um alpinismo constante num terreno improvável, no qual jamais se alcança o topo, típica tarefa de Sísifo — escreveu Dalila Teles Veras.


Seria ótimo se além de Dalila outras cabeças pensantes do Grande ABC se mobilizassem para ocupar veículos digitais já disponíveis ou blogs a serem construídos. Precisamos aumentar a densidade de inconformismo e não podemos depender dos veículos de comunicação tradicionais ou mais recentes do Grande ABC, porque a maioria não tem compromisso com a essencialidade de liberdade de expressão — apenas com a liberdade de expressão que interessa ao dono do negócio.


bullet_quadrado Em março de 2008, o Grupo de Trabalho Cultura no Consórcio, coordenado pela primeira vez por um representante da sociedade civil, conseguiu o feito de reunir sete secretários municipais de cultura que, à época, encontravam-se no último ano de suas respectivas gestões públicas e curiosamente sequer se conheciam pessoalmente, muito menos haviam, até então, levantado quais possibilidades de ação integrada regional. Pois bem, houve ali uma demonstração de vontade em fazer valer as propostas (apresentadas pela sociedade civil) de revisão do Planejamento Estratégico Regional no eixo da cultura, visando a ações integradas regionais, à cultura como centralidade e transversalidade. Essa vontade foi igualmente manifestada no início deste ano de 2009 pelos secretários que representam as atuais administrações, à época, recem-empossados, bem como durante a Oficina de Planejamento Estratégico do Núcleo Estratégico Cultura promovida pelo Consórcio, realizada nas dependências do Senac. (…) Apesar dos nítidos esforços do setor administrativo do Consórcio que contratou funcionário com a função específica de acompanhar, sistematizar informações e lhes dar o devido encaminhamento às propostas do NE, pouco se avançou. A apresentação pela sociedade civil do projeto de um Censo Cultural regional amplo, de caráter analítico e quantitativo foi acatada e passou-se a aperfeiçoar esse projeto. Assim como esse, outros projetos e intenções foram debatidos e, lamentavelmente, nenhum deles concluídos. De concreto mesmo, conseguimos que a agenda cultural regional (limitada, até o momento, às atividades bancadas pelo poder público) fosse incluída no Portal do Consórcio. É muito pouco, convenhamos, para dois anos de trabalho — escreveu Dalila Teles Veras.


Os inconformistas do Grande ABC, entre os quais seria este jornalista hipócrita de carteirinha se não se colocasse nas primeiras filas, não podem mais seguir rumo ao cadafalso do que muitos consideram exotismo intelectual, quando não comportamental, enquanto os prevaricadores, os omissos, os descompromissados, riem às gargalhadas. O desabafo de Dalila Teles Veras na área de cultura é apenas uma fração da ressonância muito mais ampla que outros especialistas de outras atividades humanas certamente acondicionam no saco de paciência de observação do cenário regional que, um dia, certamente, também explodirá.


bullet_quadrado  Tudo continua patinando, simplesmente porque os senhores (as) secretários (as) habitam alguma espécie de cápsula (tomara que seja hiperbárica e esteja oxigenando seus cérebros) que os deixa inacessíveis e incomunicáveis. (…) A inteligência regional, que não é chamada nem ouvida, está sendo jogada no ralo por essa gente que aceitou um cargo, apenas por vias políticas, via de regra, não sabe exatamente o que fazer com ele. Sua idéia de cultura é a mais simplória possível. Eventos, eventos, eventos…. Balcão e agenda. (…) Chega de torrar caraminguás destinados à cultura, contratados a peso de ouro, com a justificativa esfarrapada de que “é disso que o provo gosta”. O povo só não gosta do que não conhece e também, por outro lado, conhece coisas que são solenemente ignoradas e descartadas por essa gente que acha que sabe o que o povo gosta — escreveu Dalila Teles Veras no mesmo artigo.


Ocorre-me a idéia de um levante forjado por gente de boa vontade, com capacidade, discernimento e independência para colaborar de forma crítica, bastante crítica, na reestruturação do ambiente regional. Imaginar que os males que nos atacam estão restritos aos braços econômicos ou ao cérebro cultural é um tremendo engano. Somos um corpo em contínuo processo de metástase. Num momento como esse, de iniciar de um novo calendário gregoriano, a intervenção de Dalila Teles Veras torna-se providencial, porque nos estimula a não esmorecer.


bullet_quadrado Estou desanimada, é bem verdade (como tantos…). Estou desanimada, realmente desapontada em ver, a cada mudança de administração pública, apagada a memória de tudo quanto foi discutido e realizado nas gestões anteriores. Estou farta de ouvir gente que não se preocupa com indicadores, desconhece a cidade e suas pulsações, mas jamais desce do palanque, como se permanecesse em eterna campanha para eleição. (…) Ainda que “persona non grata”, continuarei a participar de todo e qualquer movimento que vise a valorização da causa do livro, da leitura, da memória, da cultura, enfim. Espero que a inteligência regional a que me refiro, pessoas com quem convivi/convivo (e também as que não conheço pessoalmente, mas sei que existem), igualmente desapontadas, também não desistam nem se calem — completou Dalila Teles Veras.


Para completar, estou começando a me interessar por um movimento de gente intelectualmente qualificada para contribuir criticamente com o Grande ABC. A responsável por essa alucinação é Dalila Teles Veras. Ou seriam os oportunistas que saltam de galho em galho para manter seus cargos, seus salários, suas ambições, e nos gozam a todos, pobres inconformistas?


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