Regionalidade

Luiz Marinho espera novo mandato
para dedicar-se ao regionalismo?

DANIEL LIMA - 22/08/2011

Estou cada vez mais convicto de que seria indispensável um mais que provável segundo mandato para o prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho, virar regionalista. A expectativa que jamais escondi de que pudesse dar sequência, com as devidas adaptações, ao legado de Celso Daniel, frustrou-se até agora, após dois anos e meio de controle da Prefeitura mais poderosa da Província do Grande ABC.


Luiz Marinho está atarefadíssimo demais com os desequilíbrios sociais e infraestruturais de São Bernardo e também com a determinação de partir rumo a uma vitória consagradora nas próximas eleições. Por isso, simplesmente não estende os braços aos demais municípios, o que poderia ser simbolizado na disputa pela presidência do Clube dos Prefeitos.


Como o controle gerencial do Clube dos Prefeitos é equação política, sob concessões de tucanos e aliados, Luiz Marinho não entra em dividida que possa lhe custar prestígio. Mario Reali, prefeito de Diadema e menos visado pelos oposicionistas do PT, porque não tem pretensões de chegar ao governo do Estado, foi uma costura menos problemática. Somente a reversão dos 4 a 3 dos tucanos nas próximas eleições daria a Luiz Marinho ambiente político semelhante ao que gozou Celso Daniel no segundo mandato. O PT dominava o placar regional de prefeitos por 5 a 2.


Por tudo isso, portanto, Luiz Marinho só faz mesmo regionalismo de viés político-partidário como espécie de prefeito regional do Partido dos Trabalhadores. Celso Daniel foi o prefeito regional daquilo que, durante aquele período, não poderia ser rotulado de Província.


O que aflorou decisão de voltar a escrever sobre a perspectiva de liderança regional de Luiz Marinho foram as declarações dele a dois veículos de comunicação no final de semana, a propósito do aniversário de São Bernardo.


Ao ABCD Maior, publicação impressa e digital de centro-esquerda, Luiz Marinho nem de leve tocou em qualquer assunto que ultrapasse diretamente os limites da Capital Econômica da Província do Grande ABC.


Ao Diário do Grande ABC, jornal de difícil conceituação ideológica, porque navega por todos os mares sem que se possa concluir que seja independente, Luiz Marinho disse o suficiente para incrustar a certeza de que não quer e não pretende fincar os pés institucionais além de São Bernardo.


Talvez tanto num caso como noutro tenham faltado aos jornalistas mais questionamentos sobre regionalidades diversas. Este jornalista não teria perdido a oportunidade de tocar em algumas entre as muitas feridas regionais.


É claro que Luiz Marinho não está desatento ao que se passa em outras cidadelas dominadas ou sob atenções do PT. É impossível acreditar que esteja alheio ao que se passa ao redor de um território que há muito está no horizonte de votos.


Reproduzo integralmente a pergunta e a resposta de Luiz Marinho ao suplemento especial do Diário do Grande ABC de sábado, no único trecho da entrevista dedicado à pauta regional:


bullet_quadrado Diário — Outras questões não têm de ser trabalhadas de maneira conjunta com outras cidades, como o sr. acabou de exemplificar?


bullet_quadrado Luiz Marinho — Precisamos fazer e o Consórcio (Intermunicipal) vem debatendo. São Bernardo busca puxar o debate quando leva, por exemplo, o debate da usina de lixo, na questão de resíduos sólidos. Já estamos conversando e vai funcionar. Temos de tomar a decisão hoje para daqui a 10 anos não continuar do mesmo jeito. Têm debates que ocorrem hoje e que se traduzem em projetos para serem executados. Temos a discussão da gestão de trânsito em que vamos fazer conjuntamente a travessia segura. Vamos formatar. Porque se fosse esperar a formatação do Consórcio eu iria passar (pela Prefeitura) e o projeto não iria sair. O que digo é o seguinte: se a região não for, eu vou sozinho. Executo e depois outros vêm. Mas sempre tentamos trazer todo mundo. Nós olhamos como está o problema da cidade e vamos fazendo. Paralelamente, propomos para a região. Não dá para esperar. É a maior cidade, com o maior orçamento, mas temos buscado contribuir para o Grande ABC.


Repararam bem nas declarações de Luiz Marinho? São frases que exalam certa exaustão com o Clube dos Prefeitos, essa Torre de Babel de projetos que não decolam jamais. Luiz Marinho só faltou dizer que está pouco se lixando para a entidade, ao sugerir que vai em frente e o Clube dos Prefeitos que trate de seguir a marcha. Educado e preocupado com a imagem pública,  jamais seria tão contundente. Isso é para jornalista mal-educado.


E querem saber de uma coisa: a trajetória e as circunstâncias históricas do Clube dos Prefeitos o absolvem. A entidade é um amontoado de projetos de soluções geralmente fantasiosas no campo prático. Até mesmo alguns resultados reais, como os piscinões, teriam sido alcançados de qualquer forma porque são obras do governo do Estado que beneficiaram outras áreas da Região Metropolitana sem qualquer relação com ações coletivas de municipalidades.


O pragmatismo de Luiz Marinho em voltar-se para São Bernardo enquanto o circo do Clube dos Prefeitos mantém-se com ocupantes que se revezam anualmente no picadeiro de propostas invariavelmente sem execuções é horrorosamente correto. Celso Daniel também não resistiu à inoperância do organismo, depois de uma fase espetacular de avanços programáticos que se seguiram à letargia do começo dos anos 90. O passado não só permite como estimula Luiz Marinho a converter-se em espécie de Luiz Tortorello do Clube dos Prefeitos. Com a vantagem de que Tortorello era avesso ao regionalismo apenas porque esbravejava bairrismo municipalista.


Celso Daniel construiu luta intestina pela regionalidade e oferecia a perspectiva de que, após o recuo desiludido, poderia lubrificá-la como mentor respeitável num posto de destaque durante o governo Lula da Silva, do qual seria um dos principais ministros. Luiz Marinho possivelmente terá de, num eventual segundo mandato, dedicar-se a dinamitar as inutilidades do Clube dos Prefeitos, até mesmo como currículo de quem não pode prescindir de experiência executiva na administração metropolitana desse que é o pedaço mais importante da Grande São Paulo, depois da Capital.


Sem passar pelo estágio do comando do Clube dos Prefeitos, entregando-se a jornadas de mudanças conceituais da frágil institucionalidade da Província do Grande ABC, Luiz Marinho terá tido, regionalmente, uma obra incompleta. Por mais que seja o maior prefeito fazedor de obras de São Bernardo.


Luiz Marinho está autoconstruindo as linhas de um gerenciador público voltado aos mais necessitados no primeiro mandato como prefeito de São Bernardo. Não será impossível, por isso, convencer a classe média regional de que, à frente do Clube dos Prefeitos, seria um prefeito de inclusão institucional dos incluídos.


Não há maneira mais fácil de chegar à classe média formadora de opinião do que entregar-lhe parte da responsabilidade de buscar novos caminhos rumo a um futuro menos intrigante.


Celso Daniel foi mestre nisso. Otários são todos aqueles que fecharam as portas do Clube dos Prefeitos à participação da sociedade.


Celso Daniel lutou quase isoladamente contra essa barbaridade perpetuada em duas décadas.


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