Já há os primeiros indicativos de que o prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho, potencial candidato a governador numa das próximas duas ou três eleições, estaria decidido a tentar recuperar parte do tempo perdido, entregando-se à regionalidade tão desprezada durante quatro anos. Mas, por enquanto, ele vai disfarçar o interesse em nome da democracia, porque outros seis prefeitos dividem o comando da Província do Grande ABC, Mas tudo não passa de encenação. Marinho só não será prefeito dos prefeitos se sentir que pode virar bucha de canhão.
Marinho teria sido tocado pelo bom senso. Não tem sentido mesmo alguém com tantos sonhos e ambições subestimar como subestimou até agora a ampliação do raio de atuação além de fronteiras municipais. A intervenção regional no campo partidário, como principal líder petista, é muito pouco. Exceto se aprovarem um regime político que limite aos petistas o direito a voto nas eleições ao Palácio dos Bandeirantes.
Mais importante agora que discorrer sobre a imersão de Luiz Marinho na regionalidade é saber o que pretende à frente do Clube dos Prefeitos, também conhecido como Consórcio Intermunicipal.
O que vai fazer Luiz Marinho para ganhar visibilidade como líder de políticas públicas que enriqueçam o currículo de gestor público? Como prefeito obreiro que curte merecidamente uma lua de mel de recordistas financiamentos públicos do governo federal, preparado que foi sua Administração para amealhar recursos vultosos, Luiz Marinho sabe que é preciso dar um salto qualitativo, que terá de se desdobrar entre a gestão de São Bernardo, o comando partidário regional, os relacionamentos estaduais e nacionais no partido e também na base aliada para irrigar o projeto do Palácio dos Bandeirantes e, paralelamente, liderar um ou outro programa que tenha a geografia regional como campo de prova.
Fico a perguntar onde se meterá Luiz Marinho como gestor regional se intramuros municipais o primeiro mandato restringiu-se basicamente a obras.
Derrocada ignorada
A derrocada econômica da região e também de São Bernardo ao longo dos anos não foi sequer levada a sério. Algumas quinquilharias varejistas, de intervenções tópicas, como o fechamento de parte da Rua Jurubatuba para festival dos moveleiros, são cafés pequenos ante a grandiosidade de complicações que se acumulam desde que a abertura econômica no começo dos anos 1990, e o governo Fernando Henrique Cardoso em particular, botou fogo no paiol da industrialização. Ou seja: Marinho cuidou durante quatro anos da recuperação do galinheiro, mas se esqueceu do plantio. Poderia ter feito as duas tarefas.
Embora acredite sinceramente que Luiz Marinho possa se dedicar a valer ao Clube dos Prefeitos, ninguém me tira da cabeça que o marqueteiro que o concebeu no primeiro mandato como administrador enclausurado na geografia de São Bernardo, exceto nas questões partidárias, errou clamorosamente.
Goste-se ou não, agora vai ser preciso esforço redobrado para Luiz Marinho apagar a desconfiança de que não está nem aí com o cheiro da brilhantina da regionalidade, o qual desde Celso Daniel ganhou outros odores, nada agradáveis por sinal.
Não posso acreditar que Luiz Marinho ceda à tentação da regionalidade de araque, de apenas marcar presença curricular, ou que tenha mesmo boas intenções, mas que aportaria no Clube dos Prefeitos sem uma base sólida mesmo que restrita de programas que separem sua gestão das mais recentes, todas burocráticas, fechadíssimas em si mesmas, quando não protocolares.
Fosse assessor de Luiz Marinho, não o submeteria a uma fria institucional de metê-lo Clube dos Prefeitos adentro sem levar na bagagem um projeto curto e grosso para ser aplicado em tempo recorde, porque o período de mandato passa voando. Tempo para essa injeção de adrenalina Luiz Marinho teve de sobra, porque ficou quatro anos preparando-se para assumir a instituição.
Cumprir tabela, não
Chegar ao Clube dos Prefeitos apenas para cumprir tabela seria a pior das opções que os auxiliares recomendariam a Luiz Marinho. Se tiver um grupo de apoio comprometido com o futuro da região, o mínimo que deveriam e devem fazer é abastecer o prefeito com um memorial elucidativo sobre as principais demandas regionais e, mais que isso, especificar o destino individual que lhes deram ao longo dos tempos, separando-se as mais viáveis e representativas de pretensões que se perderam no tempo e que, portanto, viraram cacarecos.
Filtrar as demandas possíveis e eleger um grupo de medidas são a porta da felicidade a novos saltos do prefeito de São Bernardo. Se repetir os antecessores, de derreter-se de paixão por um caudal de propostas, cairá do cavalo. Quem elege muitas prioridades não prioriza nada. O Clube dos Prefeitos tornou-se um pato, que pensa que anda, que pensa que corre, que pensa que voa, que pensa que nada, porque não estabeleceu prioridades em conexão com a crise das metrópoles. A começar com políticas de curto, médio e longo prazo voltadas à mobilidade urbana, disciplina que está longe do espectro meramente formal de transporte. A influência do corruptor mercado imobiliário é dilacerante.
Se está decidido que Marinho vai mesmo mergulhar nas águas da regionalidade, que ao menos não seja surpreendido com a descoberta de que a profundidade não é uma ilusão de ótica a lhe causar sérios hematomas políticos. E que também haja com cautela suficiente para não prometer o mundo e o fundo, porque o primeiro mandato do petista já lhe deve ter servido de lição.
Ou será que seu staff esqueceu que o Aeroportozão virou um Aeroportozinho de difícil consecução, que a rede de fornecedores do Pré-Sal é uma guerra de foice que demanda muitos anos de preparação em vez de um passe de mágica como foi vendida, que o grupo de relacionamento com o setor automotivo não passou de discurso e que a indústria de defesa também é de demorada maturação, sujeita a lobbies nacionais e internacionais?
Momento muito especial
Ter Luiz Marinho com ambições políticas mais que justas e o relacionamento privilegiado no governo federal, somando-se a isso o controle do Clube dos Prefeitos, contando para tanto com três votos petistas e um voto do neopetista disfarçado de peemedebista Paulo Pinheiro, significa momento extraordinariamente especial para a Província do Grande ABC. A contraface dessa boa notícia e dessas perspectivas, em forma de quebra da expectativa, seria um novo golpe à sofrida autoestima da região. Luiz Marinho não pode perder essa perspectiva antes de ser levado a eventual cadafalso pelos bajuladores de sempre.
Talvez seja essa gama de responsabilidades cruzadas que desestimule Luiz Marinho a assumir o Clube dos Prefeitos, como insinuou numa matéria publicada na edição do hoje do Diário do Grande ABC. Mas há forte aparato dos petistas que o querem pela primeira vez como prefeito dos prefeitos. Inclusive de gente graúda no governo federal. A Província do Grande ABC reclamou tanto da necessidade de formalização da instituição e o PT defende tanto o modelo de consorciamento entre municípios que não tem sentido a maior das estrelas do partido na região fugir da raia e, também, da centralização de um marketing regional com suporte do governo Dilma Rousseff. Com a ministra Miriam Belchior fazendo o meio de campo, é claro. Como o fez ao desenhar os projetos que lubrificaram a engrenagem de investimentos federais nos primeiros quatro anos de Marinho em São Bernardo.
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