Regionalidade

Clube dos Prefeitos vai a Brasília
e não sabe o que quer de Dilma

DANIEL LIMA - 31/01/2013

É de lascar o voluntarismo do Clube dos Prefeitos do Grande ABC, também conhecido como Consórcio Intermunicipal do Grande ABC: liderado pelo prefeito dos prefeitos Luiz Marinho, petista que conta com todo o respaldo do ex-presidente Lula da Silva, seu padrinho político, a entidade esteve ontem em Brasília com a presidente Dilma Rousseff.

 

Ficou combinado que ainda vai apresentar, em 60 dias, uma agenda de propostas para beneficiar os quase três milhões de habitantes. O Clube dos Prefeitos já soma duas décadas de existência pífia, há uma década conta com o governo federal petista à mão e só agora, e mesmo assim esticando prazo, paciência e bom senso, vai elaborar propostas Deus sabe lá sob quais pressupostos.

 

Quando escrevo “só agora” não sou necessariamente preciso, porque algumas vezes o Clube dos Prefeitos encaminhou solicitações ao governo federal. E sempre com o mesmo destino: o esquecimento quase completo, tanto de um lado quanto de outro, porque um lado (governo federal) tem um mundaréu para cuidar e o outro lado (os prefeitos) faz apenas um complemento mal-ajambrado das prioridades municipais. Ou seja: o distanciamento entre Província e Brasília brota da falta de competência institucional de quem dificilmente arranja algum tempinho para estruturar-se até mesmo para encaminhar com substância o que pretende de retorno a tudo que nos é arrancado em forma de tributos.

 

Fosse a Província do Grande ABC doutrinada culturalmente à governança regional, o Clube dos Prefeitos que ontem foi em peso a Brasília e posou para fotos com a presidente da República não só teria na ponta da agulha um grupo seletivo de propostas de curto, médio e longo prazos para a região como, principalmente, contaria com pelo menos um profissional de suporte de marketing, com ampla dimensão político-institucional, para desvendar todos os meandros do poder na Capital Federal, contando para tanto com o suporte dos partidos da base do governo. O lobby presencial é irrevogável mesmo nestes tempos internéticos.

 

Como aprendizado

 

É claro que os prefeitos da Província do Grande ABC carregam um caminhão de responsabilidades por viajarem a Brasília apenas com a cara e a coragem, e os evidentes e justos interesses políticos, para colocar a região na pauta da presidente. Novatos no gerenciamento público dos respectivos municípios, vencedores que foram nas últimas eleições pela primeira vez ao cargo máximo de poder, exceto o reeleito Luiz Marinho, eles têm visão pouco nítida da realidade histórica e factual da integração regional.

 

Se cada um deles – inclusive Luiz Marinho – for sabatinado sobre nuances da regionalidade que remontam há duas décadas – o tempo de criação do Clube dos Prefeitos – muito provavelmente se embaralharão. Duvido que sequer um deles tenha se dado ao trabalho de buscar no passado registrado em páginas de jornais, de revistas e também de publicações digitais, uma quantidade suficiente de informações para encurtar o caminho entre os projetos e as realizações, bem como as demandas mais emergentes e aquelas que se cristalizaram como indispensáveis à sustentação de uma reviravolta institucional do organismo.

 

Como nosso interesse sempre esteve focado no adensamento contínuo do arsenal de informações que possam conduzir a Província do Grande ABC a dias melhores, e dias melhores vão e voltam sem jamais recuperarem os bons tempos, colocamos à disposição dos prefeitos e de seus assessores o mais completo arquivo sobre as questões de regionalidade.

 

São documentos diversos de múltiplas fontes, principalmente das ações que desenvolvemos em veículos de comunicação na região. Um aprendizado elementar sobre as peculiaridades da regionalidade abortada na Província do Grande ABC é base a qualquer projeto desenvolvimentista. O material disponível encurta o caminho a novos horizontes, sem se deixar contaminar pelo voluntarismo, pelo politiquismo, pelo ideologismo e por tantas outras deformações que atravancam a vida regional nestes tempos em que as instâncias regionais concorrenciais que pretendem chegar a um nível de produtividade elevado o fazem de forma bastante profissional.

 

Marinho acordou

 

O único lado positivo no noticiário que dá conta da recepção da presidente da República às autoridades municipais da Província do Grande ABC, além da própria notícia em si, guardadas as devidas precauções, é que o prefeito dos prefeitos, Luiz Marinho, parece ter caído na real de que desdenhou demais a importância do Clube dos Prefeitos.

 

Quatro anos depois de resistir à ideia de assumir a presidência, e mesmo depois de fazê-lo esnobando a democracia, impondo como condicionante a consensualidade dos pares, eis que aquele que pensa em se tornar governador do Estado se dá conta de que o Clube dos Prefeitos é uma instância que pode favorecê-lo entre outras razões porque lhe retiraria o véu de provincianismo a que se dedicou até agora na Prefeitura de São Bernardo.

 

Salvo engano mais uma vez fundamentado na pegadinha típica dos políticos, que fingem que jogam o jogo regional enquanto praticam municipalismo empedernido, Luiz Marinho acena com perspectiva menos inquietante para quem não consegue enxergar saída senão quando observa o território de 840 quilômetros quadrados sem fracionamentos.

 

Sei lá o que vai sair da cartola dos prefeitos da região nos próximos 60 dias, tanto quanto o valor intrínseco da lista de pedidos à presidente da República como, principalmente, à exequibilidade de atendimento prático. Como sou gato escaldado em regionalidade, depois de passar por inúmeras decepções entre os atos de entusiasmo de agendas mirabolantes e pífios atendimentos no campo da materialidade, prefiro me colocar na posição de expectador crítico.

 

Um expectador privilegiado, podem acreditar os leitores, porque conheço bem a trajetória do Clube dos Prefeitos. Uma trajetória sobre a qual tenho inúmeras queixas. Entre as quais, o abusivo distanciamento da sociedade em forma de reuniões fechadíssimas tanto à Imprensa quanto ao conjunto representativo de instâncias sociais, econômicas e políticas, embora, devo reconhecer, o processo de esfacelamento dessas representações tenha se acentuado de forma preocupante principalmente desde a morte de Celso Daniel, eterno prefeito dos prefeitos. Um título que poderia ser estendido a Luiz Marinho nos próximos anos, contando como conta com um ambiente político e econômico completamente oposto ao vivenciado por Celso Daniel.

 

Apenas a título de curiosidade informativa, sugiro aos leitores uma boa passada de olhos e de mente no texto proposto abaixo, um dos mais antigos nos arquivos desta revista digital que versa sobre a integração regional, datado de 1997 e publicado na revista LivreMercado, da qual fui criador e diretor de Redação durante praticamente duas décadas. Há centenas de textos sobre regionalidade e seus entornos nesta revista digital. E serão muito mais na medida em que, mesmo com dificuldades, atualizamos o resgate de um legado que ninguém com sensibilidade regional ousaria desconsiderar, porque se trata do mais bem apanhado conjunto de informações e análises sobre o movimento das pedras de imbricamentos envolvendo os sete municípios locais.

 

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