Fora do eixo do G-12, formado pelos 12 maiores clubes brasileiros, nenhuma agremiação brasileira alcançou neste século tanto sucesso quanto o São Caetano, fundado há exatos 24 anos. Uma final de Libertadores, duas finais de Brasileiros, duas finais do Campeonato Paulista, das quais venceu uma. Tudo isso deve ser levado em conta ao contraporem os dois rebaixamentos desta temporada, no Campeonato Paulista e no Campeonato Brasileiro.
A simples formulação de uma pergunta como a do Diário do Grande ABC na edição de hoje ao presidente do São Caetano, Nairo Ferreira (“O São Caetano chega aos 24 anos de existência com retrospecto de altos e baixos no futebol. O clube tem mais motivos a comemorar ou lamentar?”) e a repergunta à argumentação naturalmente positiva de Nairo Ferreira (“Apesar dos dois rebaixamentos em 2013, você entende que existem mais alegrias que tristezas?”) denotam senão certa provocação ao chamado Azulão, no mínimo falta de informação histórica.
Tudo é válido em jornalismo, desde que o questionamento não estimule a ideia de que o objetivo seria minimizar um histórico de sucesso indiscutível.
Se nas demais atividades humanas vivenciadas na Província do Grande ABC o retrospecto fosse semelhante ao do futebol – e vamos ficar apenas nos atuais clubes profissionais – não seríamos o que somos. Na política, na economia, na cultura, no entretenimento, no engajamento social, em tudo que se pretender observar com lupa crítica, o futebol prevalece com respostas mais eficientes em produtividade e meritocracia. E olhem que fazer futebol na região é quase heroísmo nestes tempos, em tempos já passados e em tempos que virão, porque sofremos as consequências da invasão bárbara dos clubes grandes da Capital vizinha.
Nossos torcedores/consumidores são cada vez mais escassos. O Ramalhão das arquibancadas, do Conselho Deliberativo, da Diretoria e de tudo o mais envelheceu; o São Caetano sofre por representar um Município cada vez mais coalhado de aposentados; e o São Bernardo que emerge é apoiado por uma massa mais volumosa que participativa, fruto de ação de marketing extraordinária mas que ainda não enseja sustentabilidade.
Brava resistência
Nosso futebol profissional tem sérios problemas a resolver mas, mesmo em circunstâncias inteiramente desvantajosas, resiste bravamente num mundo em que somente os grandes clubes têm espaço. A televisão concentra todo o marketing nos índices de audiência que apenas as grandes equipes podem assegurar. Para agravar o quadro, não contamos com mídia de massa para manter acesa e permanente a chama da regionalização do futebol.
Diferentemente de tantas outras praças com retransmissoras das grandes redes de TV com programações locais, estamos entregues à escuridão, situação que limita a potencialidade de adicionar receitas com patrocinadores que se converteriam em fortalecimento das equipes.
Fazer futebol profissional na Província do Grande ABC é quase um ato de coragem, mas nem por isso os responsáveis pelas agremiações devem estar acima de tudo e de todos. Eles precisam ser cobrados permanentemente para que superem desafios. O contexto econômico e social deve estimulá-los em busca de alternativas que possam contornar os obstáculos específicos que colocam nossas agremiações em situação de inferioridade estrutural ante equipes assemelhadas situadas em territórios menos inóspitos ao marketing.
Assim como a economia da região, que insiste em desprezar consultoria especializada para dar à regionalidade sentido de integração e complementaridade produtiva e consumista hoje subjugada pelo individualismo e oportunismo, o futebol profissional requer parada técnica de dirigentes e todo o entorno socioesportivo regional.
Salvadores da pátria
Não podemos insistir num roteiro em que os atuais dirigentes se sentem salvadores da pátria, como expressou o presidente do São Caetano, Nairo Ferreira, na entrevista de hoje do Diário do Grande ABC, dizendo como disse que quando deixar o clube o clube desaparecerá e, também, avocando o mesmo sentido catastrófico em relação ao Santo André de Celso Luiz de Almeida e Jairo Livolis e ao São Bernardo de Luiz Fernando Teixeira. Uma confissão tácita de extrema dependência a individualidades quando uma agremiação esportiva mesmo em área periférica da Capital deveria pautar-se pela densidade de representação social.
O futebol profissional da Província do Grande ABC não pode cair na besteira de pretender concorrer em decadência com tantas inutilidades regionais, de instâncias sociais, políticas, culturais e econômicas que contribuíram e contribuem para a própria situação de subalternidade na Região Metropolitana de São Paulo.
Os 24 anos de história do São Caetano são emblemáticos de que, mesmo com inúmeras adversidades, podemos e devemos ocupar espaços nobres no noticiário esportivo nacional. Quem ganharia com isso seriam os municípios e a região como um todo porque não existe marketing institucional mais valioso no mundo da comunicação que um bom posicionamento esportivo.
O que o São Caetano fez na primeira década deste século em favor de São Caetano e da região não tem preço que pague e nem questionamento que se sustente quando colocado em forma de perdas e ganhos históricos.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André