Menos mal que o São Bernardo venceu o Botafogo de Ribeirão Preto por 1 a 0 sábado à noite no Estádio Primeiro de Maio, porque o futebol que apresentou pode ser uma casca de banana no caminho que pretende construir para chegar à Série D do Campeonato Brasileiro. O time foi decepcionante, mesmo descontando-se como deve ser descontado o fato de que se trata de início de temporada. A torcida de mais de oito mil pessoas lubrificadas pelo marketing esportivo-eleitoral do presidente Luiz Fernando Teixeira fez o que lhe competia: assistiu ao jogo quase em silêncio, exceção aos grupos organizados que dançam e gritam até em cobrança de lateral.
Explodiu daqueles 90 minutos um grito de alerta que deve ter ressonância na comissão técnica: há jogadores claramente mal escalados. O enredo tático pretendido não combina com as características técnicas. E esse é um dos piores indicadores à projeção de qualificação coletiva. Escapar do rebaixamento talvez seja fácil, porque o agrupamento das equipes ajuda, mas conseguir classificar-se ao circuito nacional do futebol é outra história, porque o mesmo agrupamento das equipes é um forte empecilho. Coisas do regulamento da Federação Paulista de Futebol. O São Bernardo está simultaneamente no Grupo da Vida (de manter-se na Série A do Paulista) e no Grupo da Morte (de ficar fora da Série D do Campeonato Brasileiro).
Pretender construir um desenho tático do São Bernardo durante os 90 minutos é perda de tempo. O time dirigido por Edson Boaro foi um amontoado de imperfeições e de apenas alguns momentos de virtudes. Salvou-se quase que exclusivamente pelo entrosamento da dupla de zagueiros que vem atuando como titular desde o ano passado – Fernando Lombardi e Luciano Castan – pelo voluntarismo de marcação no meio de campo e, seriamente, mais nada. Ou mais precisamente um ponto: o meia-atacante Bady, mesmo longe dos melhores momentos, até porque foi vigiado o tempo todo, fez o gol da vitória no final do primeiro tempo ao explorar o que tem de melhor: um chute preciso, de esquerda (ele também chuta muito bem de direita) após jogada quase acidental, de chutão de um zagueiro (Lombardi), cabeceio em bola dividida de um atacante (Careca) e sobra da bola livre de marcação ao autor do gol.
Potencial de melhora
Como é uma equipe parcialmente herdada da Copa Paulista, enxertada de reforços contratados nos últimos meses, o São Bernardo não se enquadra no figurino da maioria dos times que começaram a Série A do Campeonato Paulista praticamente do zero. Por isso as projeções são mais sombrias, porque o potencial de evolução é menos intenso. O meio de campo é inóspito em técnica (Daniel Pereira é puramente marcador, Edson é um volante que se mete a atacar mas produz pouco e Marino não tem habilidade, senso de colocação e noção de espaços dos meias de ligação que saem de trás). O ataque viveu o tempo todo de bolas escorridas, divididas. Raramente os atacantes contaram com o apoio organizado do meio de campo e dos laterais. Pior: Careca é um centroavante deslocado demais da área, sem habilidade, explosão e velocidade para levar perigo nos contragolpes. Marcio Diogo, pequenino entre os zagueiros, procurou espaços sem sucesso às costas dos laterais ou entre os volantes, mas geralmente sem ter com quem dialogar. O São Bernardo não soube ocupar os espaços ofensivos.
É muito pouco provável que com a formação que enfrentou o Botafogo o São Bernardo se saia bem na competição. O técnico Boaro vai precisar fazer mexidas. Jogar o tempo todo sem um atacante de referência entre os zagueiros só teria sentido se o time contasse com movimentação coletiva que induzisse a ocupação do espaço central de ataque por qualquer um dos atacantes e até por meio-campistas que avançassem. Como o São Bernardo foi estático durante todo o tempo, os zagueiros do Botafogo só encontraram dificuldades quando falhavam em jogadas bisonhas.
Falta letalidade
Entre o time do São Bernardo que na Série A do ano passado encontrou a forma de jogador com o técnico Wagner Lopes, agora no Botafogo, e o desta temporada, a diferença é tremenda. Aquele time que se entrosou durante a competição contava com pelo menos duas jogadas letais: os avanços do lateral/ala Regis e a velocidade, os dribles miúdos e as finalizações de Gil, principalmente em infiltrações em diagonal pela esquerda. Sem contar a experiência de Fernando Baiano, um centroavante que tornava o time lento mas que contrapunha inteligência no posicionamento. O time da estreia contra o Botafogo não esboçou uma única jogada que previamente coloque o adversário em posição de cautela. O gol salvou a barra, mas deve ter elevado a temperatura de desconfiança de quem sabe que é preciso muito mais para ficar entre os dois primeiros de um grupo que tem Santos, Portuguesa, Ponte Preta e Paulista, para tentar chegar ao circuito nacional.
Já o Botafogo, que contratou 21 jogadores para a temporada paulista, só poderia mesmo mostrar em campo que não há milagres no futebol: embora tenha tido o controle do jogo durante a maioria do tempo, não soube o que fazer com a bola. Criação ofensiva pressupõe organização coletiva, algo que possivelmente só alcançará nível satisfatório com o decorrer das rodadas. Mas mesmo com tantas deficiências de organização, o time de Ribeirão Preto deu a impressão de que é mais qualificado tecnicamente. Nada melhor que as próximas 14 rodadas para comprovar ou não.
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