Esportes

São Bernardo sai da euforia à
frustração. Nada surpreendente

DANIEL LIMA - 19/03/2014

Fosse Maria-vai-com-as-outras, teria engrossado o caldo de bajulação que cercou o ambiente em favor do São Bernardo após a terceira vitória consecutiva na Série A do Campeonato Brasileiro, justamente diante do grande Corinthians no Pacaembu. Os comentários eram gerais sobre o que chamavam de sensação do campeonato. Não faltou radialista nem faltaram jornalistas a traçar um futuro próximo glorioso ao time da região. Ganhar nove pontos em nove, dois dos jogos fora de casa, não é para qualquer um. Chamei a atenção logo no título: “São Bernardo não pode esquecer que é uma equipe de operários”. Não deu outra.


 


O texto foi publicado em 27 de janeiro e consta dos acervos desta revista digital. É muito pouco provável que se destaquem acertem praticamente todos os pontos positivos e negativos de uma equipe logo no início de uma competição. Há muita água de transformações que correm sob a ponte de adequações e necessidades técnicas e táticas. Mas com relação ao São Bernardo, se me permitem a falsa modéstia, acertamos tudo. Ou praticamente quase tudo.


 


Basta uma releitura daquele texto para compreender o que viria na sequência.


 


Não foi o fato de o São Bernardo não ter chegado à classificação às quartas de final do Campeonato Paulista e menos ainda o insucesso em busca de uma vaga na Série D do Campeonato Brasileiro que justificam aquele texto. O time poderia ter alcançado aos dois objetivos e nada daquilo requereria um senão sequer. O São Bernardo desenhado aqui no final de janeiro foi o São Bernardo que encerra neste domingo a terceira participação na Série A Paulista. Com retoques consequentes do andamento dos jogos, é claro, mas estruturalmente sem maiores solavancos.


 


Vaga desperdiçada


 


Chegar às quartas de final do Campeonato Paulista seria quase uma proeza mesmo, porque Santos, Portuguesa e Ponte Preta têm mais lastro histórico e mais pegada. Deixar escapar a Série D foi lamentável porque o sistema de disputas favoreceu o time da região. Expliquei essa dualidade em texto específico, no qual dividia a participação do São Bernardo no Grupo da Morte e no Grupo da Vida. Ou seja: para classificar-se no Paulista o grupo era mesmo indigesto, mas para beliscar uma vaga no Brasileiro era mais que apetitoso.


 


E o São Bernardo teria chegado à Série D do Brasileiro se no confronto com o Rio Claro não se dedicasse tanto a entregar a rapadura ao adversário. Terminar um primeiro tempo vencendo por 3 a 1 com um jogador (volante) a menos, porque expulso, e não providenciar o fortalecimento do sistema defensivo foi uma senhora burrada do técnico Edson Boaro, registrada aqui mas incrivelmente omitida pela imprensa da região e também de fora que cobriu o jogo. Foram aqueles cinco a cinco que fizeram o São Bernardo derrapar em entusiasmo. Tanto que no jogo seguinte, de novo em casa, fez sua pior apresentação e apenas empatou com o Mogi Mirim de Rivaldo prestes a anunciar despedida do futebol sem que se desse conta de que o futebol já se despedira dele havia muito tempo.


 


O ponto alto do São Bernardo no campeonato foi o sistema defensivo, não só pelo entrosamento dos zagueiros de área, pela regularidade do goleiro Wilson Júnior mas também porque a quase totalidade da equipe sempre trabalhou para reduzir ao máximo os espaços aos adversários. Um sistema defensivo que se revelou queijo suíço quando o São Bernardo precisou correr atrás de vitórias inadiáveis nas últimas rodadas e relaxou na marcação.


 


Marino, destaque maior


 


Já o melhor jogador do São Bernardo no campeonato foi o meio-campista Marino. Longe do estilo clássico de um Bady badalado, Marino notabilizou-se pela regularidade, pela entrega física, pelo desempenho tático e até mesmo como esporádica opção ofensiva, aparecendo às costas dos zagueiros em jogadas preparadas em ações em profundidade ou em bom posicionamento à frente da grande área. Marino é desses jogadores que todos os treinadores gostariam de ter na equipe porque é versátil como meio-campista. Renderia mais se atuasse como segundo volante. A deficiência técnica de não entender a mecânica de transições ofensivas a partir do meio de campo limita o poder bélico em jogadas que exigem tramas rápidas. Marino é um jogador que precisa de espaço para jogar. Um ponta de lança geralmente não conta com vazios à frente, o que exige habilidade que os volantes convencionais, ofensivos ou defensivos, geralmente não têm. 


 


Não se pode afirmar que entre os titulares alguém tenha decepcionado e comprometido o rendimento do grupo durante o campeonato. Assim como não há um só exemplar de relevância extraordinária. O São Bernardo se confirmou um time de operários, de linha de montagem, como escrevi desde as primeiras rodadas. E time de operários significa que não pode perder o foco e tampouco a disposição de lutar. Quando perdeu a concentração emocional pressionado pela imperiosidade de somar pontos a qualquer custo, o São Bernardo se mostrou desequilibrado taticamente. Ou seja: não resistiu ao ambiente interno de confirmar em campo o favoritismo à vaga nacional. 


 


Quando se delega a operários funções mais nobres no campo da estratégia, não se pode esperar nada além de muita disposição e organização tática. O São Bernardo dos últimos jogos entrou em parafuso porque a base do desenho tático, de rapidez de contragolpes em jogadas em diagonal e pelas laterais, foi abalroada por adversários que marcaram as principais virtudes da equipe.


 


Numa disputa com o grau de competitividade da Série A do Campeonato Paulista não se pode subestimar antídotos dos concorrentes. Faltou ao São Bernardo alternativa tática, especialmente passagens centrais com rapidez e fluidez. Algo que várias equipes de pequeno e médio porte apresentaram. Casos do Rio Claro, do Penapolense, do Audax, do Botafogo e do Mogi Mirim, por exemplo, entre outras.


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