Era por volta das cinco horas da tarde de ontem quando, preso ao computador, essa invenção que me escraviza porque me retempera porque me acalma porque me leva às alturas porque me seduz, decidi alinhar alguns pensamentos. Faltavam pouco mais de duas horas para as homenagens no Legislativo de Santo André e temia que eventualmente a emoção me tolhesse as idéias e a verbalização de um improviso autêntico que sempre prefiro à formalidade gélida. Sempre dou um jeito de enganar a mim mesmo, numa espécie de jogo de esconde-esconde de minhas fraquezas, fingindo que preciso de dispositivo de segurança para não perder o eixo discursivo.
Por isso passei a dedilhar alguns contrapontos para eventualmente utilizar no discurso da noite. Comecei a escrever e lá fui em frente. De repente me questionei: por que não 53 contrapontos, um para cada 1º de outubro? E lá fui eu, como uma bateria de escola de samba em plena avenida, imaginando, como os sambistas, como as passistas, que os convidados ao evento estariam sintonizadíssimos com meus enunciados. O que não passava inicialmente de um texto despretensioso acabou, na medida em que o batuque do cérebro me cobrava criatividade, transformando-se em espécie de decálogos móveis da maturidade. Ou seja: os 53 contrapontos podem ser compartimentados de tal maneira que formem decálogos, com direito a descartes.
Quem conseguir somar mais pontos do que a metade possível, depois de atribuir valor 10 para cada contraponto, provavelmente estará na estrada da consagração. Agora, para quem ficar abaixo disso, a estrada é mesmo a da perdição. Máximo dos máximos, louvado seja Deus a quem ficar a poucos pontos do teto de 530, porque estaremos próximos da perfeição.
O amigo e jornalista Aleksandar Jovanovic, secretário de Comunicação da Administração Luiz Tortorello, não resistiu a um comentário cortante depois da solenidade de ontem, antes que o coquetel fosse servido. Disse ele que ninguém conseguiria preencher nem 20 dos requisitos. Ao chegar em casa por volta das 22h30, meu filho Dino, de 16 anos, depois da leitura dos enunciados, mostrou-se tão interessado que me levou à decisão de reproduzir o texto, já que também no próprio Legislativo não faltou quem me cobrasse por isso.
Dino foi mais longe, se entendi o que disse. O Teste da Maturidade poderia se transformar em jogo quem sabe de dois ou mais competidores que teriam acesso ao texto, procurariam memorizá-lo e, na sequência, sem o recurso de consultar o material impresso, apresentariam, em revezamento, parte de cada enunciado para que o adversário complemente. Ou seja: o jogador número um explicitaria o ponto e o adversário teria que, sem vacilar, apresentar o respectivo contraponto.
A proposta de Dino provavelmente tenha sido oferecida porque ele estava a exercitar sua porção criativa de adolescente que, órfão circunstancial de um computador avariado, está-se dando ao gratificante direito de curtir mais o ambiente familiar. Tanto quanto sua irmã Lara, igualmente escrava da Internet que introduz na tela de computador amiguinhos e amiguinhas próximos e distantes. Essa troca de emeios eventualmente é observada com espanto pela mãe jornalista, caçadora de inconformidades ortográficas.
Os vícios digitais de Lara, entretanto, esgotam-se no computador, como moeda de reciprocidades de usos e abusos da informalidade da língua portuguesa. Quando se lança à escrita manual, como o da mensagem que me entregou ontem numa folha de papel, Lara apresenta fortes indicações de que jornalista também será, como André, o primogênito. Já Dino é uma grande interrogação, porque se dá tão bem com exatas quanto com humanas, numa dualidade pouco comum. Diferente de Dannyella e sua paixão por animais.
Para participar do Teste da Maturidade, sinceridade é indispensável. Se mentir para terceiros é feio, para si mesmo é imperdoável. Por isso, ao prosseguir nesta leitura e ao debruçar-se sobre cada contraponto que alinhavo, muito cuidado. Antes de botar um grande xis sobre cada quadradinho que antecede os enunciados, pense bem. Não se precipite. O que se verá na sequência é o que pronunciei ontem à noite no Legislativo de Santo André, depois de rápido improviso. Recorri ao texto porque não tenho memória de ator nem tive tempo para isso. Aliás, o tempo foi exíguo até mesmo para redigir o que se segue.
Reconheço que há uma carga imensa de subjetividade em parte do que se lerá a seguir. É muito mais que provável, é certo, que a carga pessoal de conhecimentos que detenho e que está na base da construção do texto não necessariamente se adaptará ao agregado de experiências pessoais e profissionais dos leitores. Mas talvez seja por isso que este Teste de Maturidade ganha robustez, já que há uma banda de semântica suficientemente larga para permitir que todos encontrem espaço para exercitar a autocrítica.
Vamos ao Teste de Maturidade. Não se esqueça de que mentir é pecado. Não interessa a quem.
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19/11/2024 NOSSO SÉCULO XXI E A REALIDADE DE TURMAS