A hemorragia arrecadatória de municípios que perdem base tributária industrial como os do Grande ABC deixa ainda mais clara uma necessidade tão conhecida de especialistas em federalismo fiscal quanto negligenciada pelo governo federal: a de conferir tratamento diferenciado às regiões metropolitanas, que ao longo dos anos se converteram em focos de problemas urbanos, ambientais e socioeconômicos pela combinação de overdose populacional e anorexia de recursos e investimentos. Um dos melhores instrumentos de que o governo central disporia para assistir às regiões mais problemáticas do País seria a criação de um Fundo de Participação das Regiões Metropolitanas, que não implicaria em novos impostos, mas apenas no redirecionamento de recursos existentes. O autor da proposta é o economista Marcos Mendes, consultor do Senado Federal e membro do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial.
A proposta de Marcos Mendes não é nova. Ele sugeriu a criação do fundo metropolitano em 1994, na condição de economista do Banco Central, em trabalho sobre novas diretrizes para o federalismo fiscal brasileiro. Mas a idéia está mais fresca do que nunca. Afinal, o comprometimento de regiões e microrregiões metropolitanas como a Grande São Paulo e o Grande ABC deve-se muito à falta de ações e políticas específicas como a concebida por Marcos Mendes no ano do lançamento do Real.
Recursos estáveis -- O maior achado do fundo proposto pelo economista é constituir fonte permanente de recursos às caóticas regiões metropolitanas, uma vez que a escassez de recursos estáveis é o nó górdio do modelo brasileiro de metropolização desde que foi concebido pelo regime militar na década de 60. Marcos Mendes explica que o Fundo de Participação das Regiões Metropolitanas seria formado por fatias do FPM (Fundo de Participação dos Municípios), do FPE (Fundo de Participação do Estado) e do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
"A idéia não seria simplesmente pegar esse dinheiro e dividir entre municípios metropolitanos de acordo com algum critério objetivo, como tamanho da população ou índice de pobreza. O melhor seria usar os recursos para financiar investimentos metropolitanos. Dois ou mais municípios apresentariam um projeto -- como corredor de transporte, usina de lixo, despoluição de rio, remoção de habitações em áreas de risco e políticas de inclusão social e prevenção da violência -- e o fundo financiaria parte do projeto, que deveria contar também com verbas dos municípios envolvidos" -- explica o consultor do Senado. "Obviamente seria preciso criar um conselho para gerir os recursos, como existe para a gestão do FGTS" -- completa.
Como o repasse do FPRM não seria automático e incondicional como o do FPM, a aprovação do fundo traria desafio aos governantes do Grande ABC: prefeituras que se especializaram em oferecer programas de assistência social para amenizar os efeitos da miséria crescente teriam que ficar experts também em formatar projetos integrados e convincentes para atrair recursos adicionais.
Para que os recursos à disposição das regiões metropolitanas cresçam sem que haja criação de impostos, os recursos voltados a cidades e regiões não metropolitanas têm necessariamente de diminuir: eis o obstáculo prático para a implementação do FPRM. Levando-se em conta que o FPM (composto com a arrecadação do Imposto sobre Produtos Industrializados e Imposto de Renda) é a principal fonte de financiamento de um sem número de pequenas cidades brasileiras e o ICMS é o principal tributo estadual, alterar o critério de partilha equivaleria a mexer num vespeiro de interesses. "Para aprovar o fundo, seria necessário não só a mobilização de parlamentares das regiões metropolitanas, sub-representadas no Congresso, mas também o convencimento de parlamentares de regiões interioranas, que ao contrário são sobre-representadas no Congresso. "De qualquer forma, a aprovação de lei complementar não exige fórum qualificado. Basta o voto favorável de metade mais um dos presentes à seção de votação" -- explica.
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