A omissão e a dificuldade de mobilizar interessados em torno de um projeto de transformação repetem-se mais uma vez no Grande ABC. A primeira instância regional para discutir o Ensino Superior e seu engajamento nas políticas públicas e ações da iniciativa privada é ignorada por grande parte da comunidade, do empresariado e da própria classe acadêmica. Criado há cinco meses, o Unifórum ABC caminha a passos lentos por trilha que não chegou à conquista da adesão esperada de educadores e dribla curvas e atalhos para alcançar os empresários e ouvir o que esperam dos futuros empregados. Mesmo assim, coordenadores e poucos participantes unem energia, vontade e boas expectativas em discussões que esboçam as primeiras guinadas para colocar em prática o que corre o risco de encerrar-se na retórica.
"Além da falta de tempo peculiar a todos, a maioria não se envolve em causas de interesse coletivo" -- justifica Márcia Célia Kumschlies, integrante do comitê Projeto de Vida e professora de Marketing do Iesa (Instituto de Ensino Superior de Santo André). O consenso diante da falta de mobilização é de que a condensação dos grupos pode ser vantajosa à medida que define melhor o foco de trabalho.
No lançamento em maio deste ano, o Unifórum reuniu autoridades públicas, reitores e professores das 10 universidades que abraçaram a instância, numa demonstração de entusiasmo diante da possibilidade de articular ações para a melhoria da qualidade de ensino e seu protagonismo na solução dos problemas regionais. Mas os comitês, que reuniram cerca de 20 participantes nos primeiros encontros, sofreram esvaziamento, a ponto de uma média atual de seis integrantes. A baixa adesão dos próprios educadores reflete o desinteresse da comunidade acadêmica. "Apesar de lento, o processo inicial serviu de aprendizado para nos conhecermos e centralizar melhor as práticas daqui em diante" -- confia Amália Fernández Gómez, uma das coordenadoras da instância e assessora de Relações Institucionais da Umesp (Universidade Metodista de São Paulo).
Dentre os três comitês inicialmente definidos, o grupo Projeto de Vida, que se propõe a suscitar no universitário a importância da etapa que atravessa na academia, é o único que engata a segunda marcha após cinco reuniões que discutiram o tema. Os participantes expressam boas expectativas e apostam na sinergia dos que restaram para transformar a temática discutida em ações de fôlego e eventualmente conquistar novos integrantes a partir da apresentação de resultados, já que um dos motivos que podem ter desestimulado os convidados iniciais foi a falta de uma linha de ação. "Em contrapartida, agora temos certeza de que os que restaram querem arregaçar as mangas" -- argumenta Amália.
A unificação do grupo comitê Projeto de Vida ao comitê Universidade Cidadã revelou que o tema deve ser adiado por exigir a preparação que o Projeto de Vida se propõe a estruturar no jovem e que, de alguma forma, inclui a cidadania. A idéia é apresentar esquetes teatrais nas universidades em parceria com o Núcleo de Formação Cidadã da Umesp para levar o estudante à reflexão. "Queremos trabalhar com o lúdico e não-convencional para despertar o interesse do jovem, levá-lo a pensar em suas perspectivas e prepará-lo para a apresentação de seminários itinerantes, o segundo passo do projeto" -- planeja a coordenadora Amália Gómez.
Empresários desinteressados -- Encarregado de analisar a aplicabilidade dos ensinamentos da sala de aula no mercado de trabalho, o comitê Formação Universitária não consegue sair do ponto morto. A idéia de ouvir os empregadores para saber que tipo de mão-de-obra o Grande ABC demanda e estimular parcerias empresa-escola engasga no fechar de olhos dos empresários. Ciesps e associações comerciais têm demonstrado completo desinteresse e confirmam o histórico de ausência dos grandes temas regionais. O Ciesp São Bernardo chegou a participar de um único encontro.
A preocupação com formação acadêmica é um dos últimos itens na lista de prioridades das empresas à beira de contratações minguadas em um cenário onde prevalece o desemprego. "Nossa proposta é uma novidade que, em momento de crise, não atrai o empresário, mais preocupado com a própria sobrevivência" -- observa o professor da Faenac (Faculdade Editora Nacional), Siegfried Wehr. Além disso, engajamento ainda é verbete ausente no dicionário dos quadros institucionais regionais.
De qualquer forma, o coordenador do grupo e reitor da UniFEI, Rubens da Silva Mello, insiste na importância da pauta e acredita na conquista de adesões. "Estamos tentando convocar dirigentes e empresários para café-da-manhã onde possamos expor nossas idéias, que são de benefício mútuo, tanto para empregadores como para a universidade" -- ressalta. Ele reforça que abrir o ambiente corporativo para um aluno orientado por professores deve resultar em rica pesquisa revertida em benefícios para o empresário, que poderá aplicar as descobertas, além de colaborar para o aprimoramento da mão-de-obra. "Se conseguirmos ao menos uma empresa que se habilite, já estarei feliz" -- conforma-se.
Os entraves nas discussões que engatinham não só confirmam o histórico de papel reduzido da academia na história do Grande ABC como adiam uma temática que sequer foi citada: a regionalidade. A participação mais incisiva das universidades nos destinos locais e a colaboração para o desenvolvimento regional mais uma vez parecem sonho longe de chegar à realidade.
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