A mentira tem mesmo pernas curtas. Venderam ao presidente Lula da Silva e a seus assessores que o Grande ABC é um primor de institucionalidade, de integração regional, de interesses convergentes, mas bastou o antigo líder sindical ceder aos anseios de um grupo de políticos desejosos de ver instalada na região a Universidade Pública Federal para que a máscara caísse. A prova provada de que não passamos de uma republiqueta — como, aliás, escrevo no mais recente livro que publiquei, lançado em outubro do ano passado — está na disputa de egos reproduzida em manchete de página na edição de ontem do Diário do Grande ABC que, diga-se de passagem, tem sido bastante benevolente com essas mesmas lideranças.
O prazo de 15 dias que o governo federal deu aos emissários do Grande ABC para que formatassem um modelo consensual da universidade que eles tanto reivindicaram é uma sentença de morte aos aparvalhados. Resolveram compor um grupo de 16 membros de variadas representações regionais que por si só é um ensaio à derrapagem, porque não contempla forças produtivas.
Exceto por delegação generosa das demais entidades convidadas, haverá apenas um representante do setor empresarial no agrupamento. No caso, José Batista Gusmão pela Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André) que, como todos sabem, é um mar de improdutividade institucional.
Exemplos de omissões não precisam ser rememorados. Não bastasse o descaso dos alquimistas do conselho no primeiro encontro preparatório com os nove deputados estaduais que alguns chamam de Bancada do ABC, o quebra-pau se estabeleceu. Desse grupo deverá ser indicado um dos 16 membros do conselho que definirá o perfil da universidade.
Embora o mencionado noticiário seja confuso, depreende-se que o deputado estadual Vanderlei Siraque esteja preocupado em perder o fio da meada de anos seguidos de investimento no temário, justamente agora que o presidente da República resolveu, ao que parece, dar um presente de grego. Sim, presente de grego porque na medida em que digladiam forças até então desconhecidas, o tempo passa na catinga da fumaça e tudo pode terminar em grande vexame de fraturas expostas ao governo central.
Será que estouraremos o prazo presidencial? Provavelmente não. O problema é de outra grandeza: a Universidade do Plástico, que de tão óbvia nem precisaria ser mencionada como a linha do horizonte que devemos mirar, poderá ser olimpicamente chamuscada por descuidados festeiros metidos a baloeiros políticos.
Menos mal que Vanderlei Siraque, deputado que trabalha intensamente, já se tenha colocado à frente dos debates oficiais em defesa de um modelo voltado à produção industrial das áreas química, petroquímica e automobilística. Ou seja: adotou o que chamamos de Universidade do Plástico que, com perdão do trocadilho, teria potencialidade de dar elasticidade intersetorial.
A impressão que se tem ao se registrar no Diário do Grande ABC uma declaração da prefeita de Ribeirão Pires e presidente do Consórcio Intermunicipal de Prefeitos, a professora Maria Inês Soares, é que a trapalhada regional será motivo de sobra para repassar o planejamento da Universidade Federal do Grande ABC aos técnicos do Ministério da Educação. Maria Inês, que tem enormes dificuldades de trabalhar em equipe, admite que o projeto vai andar com ou sem consenso regional. Talvez seja essa mesma a melhor solução.
Hoje mesmo voltarei a manter contato com o ministro da Educação, Tarso Genro, que, semana passada, atendendo a solicitação do presidente Lula da Silva, se colocou à disposição para incorporar nossas ideias ao projeto. Enviei-lhe, semana passada, cópia da Reportagem de Capa da revista LivreMercado de maio do ano passado. “Nosso Futuro é de Plástico” resume a premente necessidade de combinarmos uma obra fora das prioridades regionais — a universidade federal — e a prometida expansão do Polo Petroquímico de Capuava. A elevação da capacidade da Petroquímica União, empresa-mãe do polo, possibilitaria entre outras vantagens regionais a oxigenação da cadeia de pequenas e médias empresas de transformação de plástico que há muito sofrem com as dificuldades de suprimento da matéria-prima gerada a partir do nafta.
Exatamente porque deve contemplar o setor de plástico, a concepção do conselho dos 16 membros que definirá a vocação da Universidade Federal do Grande ABC é um atentado ao bom senso.
Além de apenas um representante empresarial — solicitado a uma entidade que se tem constituído em fracasso no compromisso de mudanças econômicas, além de instigar a ruptura integracionista com descarado bandeamento político-partidário –, simplesmente foram esquecidos da listagem representantes dos setores químico, petroquímico, automotivo e de autopeças.
Nada surpreendente porque o modelo de gestão pública no Grande ABC é prevalecentemente social. Não será surpresa, também, que salte das pranchetas de iluminados uma universidade que desperdiçará a grande possibilidade de o Grande ABC revolucionar os conceitos de escola superior pública, abrindo espaços para a formação de técnicos que possibilitariam, com a expansão petroquímica, a recuperação das forças produtivas e o surgimento de novas matrizes industriais.
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11/11/2024 GRANDE ABC DOS 17% DE FAVELADOS