Vou enviar essa Carta Aberta ao Todo-Poderoso, também conhecido como o Dono do Mundo. Somente o Todo-Poderoso pode corrigir o que o Todo-Poderoso fez. Nada contra o Todo-Poderoso. Diferentemente disso. Não fosse o Todo-Poderoso, nem aqui estaria mais.
Aliás, é por conta disso, de ter passado o que passei, tiro na cabeça e coisa e tal, que provavelmente o Todo-Poderoso me iluminou a escrever esta mensagem a ele. Qual seria a explicação, então, se estou bom da cabeça e nada doente do pé?
Está certo que há controvérsias sobre estar bom da cabeça e nada doente do pé. Canso de ouvir recomendações para ser uma maria-vai-com-as-outras no jornalismo de lantejoulas, porque me daria muito bem, como muitos supostamente se dão. Mas minha cabecinha maluca não deixa. Escrever é coisa sagrada sujeita a chuvas e a trovoadas.
Preciso aprender com João Doria, com Paulinho Serra, com Geraldo Alckmin, e com tantos outros políticos e empresários, que conveniência vale mais que dignidade.
PONTE DE FLEXIBILIDADE
Resumidamente, o que vou sugerir ao Dono do Mundo é que haja alguma saída, ou pelo menos um pedido de desculpa do Todo-Poderoso, por não haver pensado no que pensei. Não me chamem de pretensioso. Esse trecho é apenas uma brincadeira.
Trata-se do seguinte: acho uma barbaridade de radicalismo não haver a ponte da Pausa entre a Vida e a Morte. Repito: uma Pausa entre a Vida e a Morte.
Isso mesmo: Vida e Morte são medidas extremistas demais. Nestes tempos de polaridades, não sei como os extremistas ainda não evocaram o Todo-Poderoso como fonte de inspiração para justificarem atos e abusos. Incluído na lista aquela togado brilhante da cabeça pelada.
Há gente perniciosa que faz da Religião gato e sapato. Não entendo mesmo como os radicais não aportaram falso discurso para justificar atos insanos à dualidade monolítica da estreiteza inelástica entre a Vida e a Morte.
SEGURANDO O DINO
Vou dar um exemplo prático que que seria a Pausa entre a Vida e a Morte. Depois, explico os conceitos e mais detalhes.
Houvesse Pausa entre a Vida e a Morte, o ministro da Justiça, Flávio Dino, não seria colocado, como determina o presidente Lula da Silva, à aprovação mais que compulsória do Senado a uma vaga no Supremo Tribunal Federal.
Com a Pausa entre a Vida e a Morte, Flavio Dino entraria no modo descanso forçado por tempo determinado de conhecimento único e exclusivo do Todo-Poderoso, assim como o são a Vida e a Morte.
Fora de combate, Flávio Dino estaria garantido no Hibritério, o estágio de repouso na faixa intermediária à ocupação de uma vaga em qualquer cemitério. Hibritério é uma junção de hibridismo e cemitério. É a Pausa de descanso providencial entre a Vida e a Morte. Nada contra Flávio Dino isoladamente, mas ao Flávio Dino exuberante em todos os sentidos num momento da vida nacional em que precisamos mesmo é de um STF contido.
Trocando em miúdos: com a Pausa em campo e sem avarias, entre a Vida e a Morte, Flavio Dino ficaria inabilitado a ocupar o Supremo Tribunal Federal. A vida nacional seguiria normalmente. Os desdobramentos institucionais e operacionais do País contariam com nuances insondáveis aos humanos.
Somente o Todo-Poderoso seguiria a controlar o Universo. Não podemos abrir mão de um xerifão, queiram ou não os incrédulos.
JANELA A NOVA ROTA
A Pausa entre a Vida e a Morte seria uma inovação à presença humana na Terra. Seria a abertura de uma janela que mudaria a rota dos acontecimentos. Lá atrás, quem sabe, um Hibritério teria barrado do baile de desumanidades um Hitler. Possivelmente tudo poderia ser diferente na ordem dos acontecimentos. O Hamas poderia nem existir.
Tantos outros personagens e coadjuvantes da Terra estariam sujeitos a entrar no modo Pausa com a intervenção soberana do Todo-Poderoso. Essa falta de um meio de campo nesse jogo de ataque versus defesa, de Vida e Morte, é o que chamaria de desequilíbrio perturbador.
Todo ser humano deveria ter oportunidade de entrar no modo Pausa. E desde muito tempo. Desde que o Todo-Poderoso criou o mundo. As ciências jurídicas já teriam tratado desse intervalo sem qualquer dor de cabeça. Haveria naturalidade na aplicação de regras legais.
SEM ATROPELOS
O que parece ser novidade, quando não profanação, não passaria de jurisprudência automática. A Pausa entre a Vida e a Morte teria sido organicamente sistematizada como a própria Vida e a Morte. Ou seja: minha proposta ao Todo-Poderoso não passaria de uma besteira típica de maluco de pedra. Seria como sugerir ao Todo-Poderoso que criasse a Vida e também a Morte, que já existem.
Andei pensando mesmo em enviar essa recomendação ao Todo-Poderoso. No começo, quando a ideia ganhou luminosidade, imaginei que ao divulgá-la, poderia levar algum fanático religioso a obrigar minha internação imediata numa casa de repouso. Se há casa de repouso mental, porque não poderia haver no cardápio de Vida e Morte uma casa de repouso biológico? Um campo neutro.
Passar a frequentar por tempo incerto um Hibritério, o cemitério temporal entre a Vida e a Morte, seria estágio extraordinário. Todos poderiam contar com a possibilidade divina de ganhar um tempo de suspensão que não afetaria o tempo ativo.
CRONOMETRAGEM
A adoção do critério de cronometragem sujeita a interrompimento de dias a viver, determinada pelo Todo-Poderoso quando nascemos, não sofreria interferência. Haveria apenas um período de suspensão. O cronômetro congelaria o tempo convencional.
Por exemplo: se o Todo-Poderoso determinou que você viverá 36 mil dias, oito horas e cinco segundos, esse será seu roteiro de Vida. O tempo que estiver no Hibritério não interferiria na medição. Sua programação de Vida e de Morte estaria mantida. Apenas o calendário gregoriano seria esticado. Ou seja: o tempo de Hibritério não seria acionado como tempo ativo. E seria retomado com a Vida de volta, até que fosse definitivamente desativado com a chegada da Morte.
Portanto, não haveria escapatória com a Morte entrando em campo. A Morte não estaria proibida de chegar antes da Pausa. Mas o Todo-Poderoso poderia ser benévolo, mais do que é. Toda Morte seria repensada pelo Todo-Poderoso. Mais que isso: a Pausa poderia ser mais de uma Pausa, intervalada, seguida ou prolongada. Quem decidiria seria o Todo-Poderoso.
TEMPO Á REFLEXÃO
A Pausa entre a Vida e a Morte possivelmente provocaria mudanças. Muitos enredos pessoais, institucionais e corporativos poderiam passar por remanejamentos, reprogramações, essas coisas.
Como o Todo-Poderoso quer o bem da humanidade, acho que teríamos um mundo mais interessante e melhor. Quando se pede tempo para alguma coisa, o que vem em seguida geralmente é mais bem calibrado. Menos quando alguém do casal pede tempo na relação. Tudo indica que a tempestade já está chegando.
Tempo não é só dinheiro. Tempo é o tempero da vida. Reflexão é o tempo que pedimos a nós mesmos. A maioria não se dá conta disso.
Você acha que estaria enganado quando imagino um mundo melhor se o pressuposto da Pausa entre a Vida e a Morte é dar tempo também ao Todo-Poderoso? Acho que Ele não correria o risco de se atrapalhar diante do painel de controle de cada um dos mais de oito bilhões de terráqueos a frequentar esse planeta cada vez mais ebulitivo, desgastado e complexo.
MAIS SAPIÊNCIA
Está bem que o Todo-Poderoso é infalível. Mas num novo contexto de Pausa entre a Vida e a Morte, quem sabe seja ainda mais sábio?
Como se fosse um tempo de descanso obrigatório que no futebol só se utiliza quando a temperatura é insuportável, a Pausa entre a Vida e a Morte provocaria rearranjo geral.
Pense naquele criminoso prestes a invadir uma residência para trucidar uma família inteira. Já imaginou se, de repente, como ocorreria em todas as situações em que se acionaria o botão de Pausa pelo Todo-Poderoso, o criminoso fosse contido por uma paralisia geral?.
Exames clínicos constatariam o estado de Pausa entre a Vida e a Morte. Seria imediata a transferência ao Hibritério. Seriam dispensados quaisquer outros procedimentos. O automatismo da ocupação de uma vaga no Hibritério seguiria processo jurídico semelhante ao cerimonial fúnebre. A humanidade trataria a Pausa com naturalidade procedimental assim como trata a Vida e a Morte.
TEMPO, TEMPO
O criminoso em questão só retornaria ao campo de jogo, ou seja, à Vida, quando o Todo-Poderoso autorizasse. E encontraria o mundo sem intervalo para descanso. A roda da Vida continuaria a girar. A Pausa seria apenas do criminoso. Ele retomaria a Vida com a mesma identidade, encontraria a Vida que temporariamente deixou, mas não poderia reclamar das mudanças no período de Pausa.
Se a mulher se casou com outro, se o chefe da quadrilha engordou as estatísticas de assassinatos, se o cargo de diretor da escola de samba conta com outro titular, se tudo isso e muito mais ocorreram, faz parte do jogo. A Pausa não seria prêmio nem castigo. Seria apenas uma período de tempo à reconfiguração da Vida individual e coletiva na Terra.
O importante nesse bregueço todo é que a Vida na Terra não sofreria qualquer descontinuidade para os vivos e tampouco alteraria o destino dos mortos. Haveria apenas um novo elemento a ser considerado justamente para o encaixe mais ajustado dos bilhões de seres humanos que se digladiam ao escalarem cordilheiras de objetivos e ambições.
CORREÇÃO DE RUMO
O procedimento da Pausa entre a Vida e a Morte seria uma correção de rumo, que vou sugerir ao Todo-Poderoso, a ser implantado entre nós como num passe de mágica. Ou seja: de repente, não mais que de repente, como se surgisse por acaso, alguém ou muitos seriam contemplados com esse intervalo providencial. Seria um entreposto entre a Vida e a Morte sem ninguém desconfiar de que o Todo-Poderoso decidiu aperfeiçoar o modelo de viver e de morrer.
Acho que a Pausa entre a Vida e a Morte poderia fazer com que o Rei Pelé ainda estivesse entre nós. E que supostamente, com sua presença forte, teria iluminado o Santos a ponto de ter evitado o rebaixamento agora.
Ou seja: com Pelé ainda vivo, o Santos não teria caído agora. Poderia cair depois de Pelé ter esgotado seu tempo cronometrado, não linear, de Vida. A queda do Santos só seria evitada se o Todo-Poderoso assim o decidisse. Com Pelé vivo, os santistas teriam a vantagem de ter evitado aquela noite de terror e as 38 rodadas da Segunda Divisão do ano que vem.
TEMPOS DE PAUSA
Como assim? Ora, se Pelé viveu uma contagem de dias, horas e segundos que corresponderam ao total de anos de vida, que passou de 82, ele teria essa cronometragem vital respeitada com a Pausa entre a Vida e a Morte. Portanto, o tempo linear não teria se esgotado. O Todo-Poderoso teria providenciado uma ou quantas vezes quisesse e achasse conveniente ter instalado o Rei do Futebol num Hibritério.
Os dias, horas e segundos da vida de Pelé poderiam ser consumidos quem sabe até os anos 2040. Indo e voltando do Hibritério, Pelé sempre seria Pelé, a identidade estaria garantida e assegurada. Possivelmente encontraria a cada despertar do estágio de Pausa uma situação distinta da temporariamente compulsória, mas isso é outra história.
O Todo-Poderoso existe exatamente por causa disso, ou seja, para concentrar toda a sapiência da Humanidade.
Já imaginou quanta repaginação de história de vida dos seres humanos haveria na agenda do Todo-Poderoso, entre a Vida e a Morte, com uma parada geral para a Pausa?. O estágio, não custa repetir, seria individual, com efeitos vinculantes à ausência circunstancial. O mais humilde dos seres humanos possivelmente teria reescrito a própria biografia. A vida de todos, portanto, poderia ganhar novos acontecimentos e emoções.
DESTINO TRAÇADO
O destino de cada um estaria traçado. O tiro que me atingiu o rosto não deixaria de sair da Taurus de meu agressor, mas as circunstâncias poderiam ser outras se entre a Vida e a Morte houvesse uma Pausa. Quem sabe ao invés de um pet shop meu agressor fosse um torcedor fanático do time que acabou de ser derrotado pelo meu time numa final de campeonato?
Acho que a justificativa poderia ganhar algum foro explicativo. Afinal, a maioria não entende que o incidente tenha ocorrido numa casa especializada em cuidar de cachorros. Foi um assalto? – eis o que mais me perguntam.
O Todo-Poderoso vai receber minha Carta Aberta. Ele saberá separar sugestão de pretensão. Ele me conhece desde outros carnavais. Sem exagero, acho que o vi naquela UTI inesquecível. Talvez seja por conta disso que estou a dedilhar essa proposta. Acho que seria uma aberração ter sido despachado à Morte pouco tempo depois de estar de chinelo de dedos, bermuda e camiseta em pleno goza de vida.
SEM DISCRICIONARIDADE
Um intervalo para descanso em local preparado que não lembre nem de longe uma UTI seria um pedido razoável. Se cemitério causa temores, sendo público ou privado, porque geralmente o impacto da Morte é sempre angustiante, quem sabe com o Hibritério tudo passasse a ser diferente? Ou não seria, levando-se em conta que o cemitério da Pausa, porque é disso que se trata, seria uma preparação psicológica à Morte que um dia sempre chega?
O Todo-Poderoso saberá me julgar melhor que os humanos ao lerem essa Carta Aberta. Ele compreenderá que não se trata de intromissão no Ministério Celestial. No máximo, numa das demandas, seria mesmo uma tentativa de evitar a ocupação indevida do Supremo Tribunal Federal.
Tudo isso, Vida, Pausa e Morte, é apenas uma ideia que valeria a pena levar adiante. Acho que a Humanidade ganharia muito. Ou não valeria a pena interromper a carreira pública de Flávio Dino sem tirá-lo do jogo da Vida, porque o jogo da Vida e da Morte deve ser sempre respeitado e glorificado sem discricionaridade?
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11/11/2024 GRANDE ABC DOS 17% DE FAVELADOS