Regionalidade

DETROIT À BRASILEIRA
É DESAFIO GERAL (5)

DANIEL LIMA - 30/01/2025

Um cruzamento devastador de dois tributos de arrecadação municipal desnuda o tamanho de uma das janelas da encrenca de competitividade da Economia do Grande ABC e ajuda a explicar o fenômeno de Detroit à Brasileira. Neste quinto capítulo desta série, decidimos confrontar os números do ISS (Imposto Sobre Serviços) e do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). Um imposto retrata um recorte importante da dinamicidade econômica. O outro, com interferência fiscal direta do Estado em forma de Município.

No caso da região, num desenho que reúne  cinco dos sete municípios, os resultados são desanimadores e exigem reestruturação com barreiras de contenção legais.

O IPTU no Grande ABC ocupa espaço arrecadatório elevado demais ante o ISS. Há notório contraste quando comparado a outros endereços do Estado.

O fato é que quanto mais a arrecadação em valores absolutos do IPTU se aproxima da arrecadação do ISS numa mesma temporada, mais saltam sinais de fissura na estrutura econômica de um Município. 

PREÇO SALGADO

O preço da terra ocupada ou não ocupada economicamente também para moradia não pode se rivalizar com a atividade econômica em forma de negócios. Se os valores arrecadados com o IPTU estão próximos demais ou mesmo superam o ISS, a sinalização parece clara: há em alguma dimensão a ausência de atividade econômica do setor e  fome de arrecadação de outro. Deixar ao deus-dará esse desequilíbrio não é a melhor solução. Muito longe disso. Não à toa o Grande ABC padece de competitividade, palavra mágica de Desenvolvimento Econômico.

A cada R$ 100,00 arrecadados pela Prefeitura de São Paulo com o ISS, R$ 54,75 são arrecadados com o IPTU. São Paulo é a maior praça imobiliária brasileira e também tem uma economia de serviços expressiva. Poderia servir de paradigma? Isso não é tão relevante assim. Há outros exemplos a sugerir diversidade de idealização.

Comparação entre os  três principais municípios do Grande ABC é emblemática da distância em relação à Capital vizinha. Para cada R$ 100,00 que Santo André coloca nos cofres com a atividade de serviços, medida pelo ISS, outros R$ 69,04 aparecem na forma de IPTU. A correlação em São Bernardo é de R$ 76,32 e em São Caetano  de R$ 83,64. Em Diadema e em Mauá, que completam a lista dos cinco maiores municípios da região, o IPTU tem maior peso relativo de arrecadação que o ISS. Esse é o pior dos mundos.

SOROCABA SURRA SANTO ANDRÉ

Sorocaba e outros municípios de grande porte do Estado de São Paulo são menos pesados no tributo imobiliário. Do tamanho demográfico e semelhantemente a Santo André no PIB Geral, que envolve todas as atividades econômicas, Sorocaba arrecada com o IPTU, para cada R$ 100,00 de ISS, o valor de R$ 38,32. Ou seja: praticamente a metade relativamente ao que  Santo André arrecada na mesma situação.

Um terceiro vértice dessa equação reunindo ISS e IPTU também será analisado neste capitulo que terá sequência amanhã. É exatamente a relativização do crescimento do PIB Geral dos municípios colocados sob escrutínio.

Sorocaba, por exemplo, avançou economicamente muito mais que Santo André e demais endereços da região neste século. E tem custo imobiliário menos proeminente que o Imposto Sobre Serviços.

SUPERANDO O G-100

Talvez o melhor aferidor da competitividade do Grande ABC no confronto entre ISS versus IPTU seja a média dos valores arrecadados na temporada de 2022, de acordo com a Secretaria do Tesouro Nacional, fonte sobre a qual CapitalSocial lança todas as analises. Esse grupamento (G-100) também revela média de participação do IPTU abaixo do registrado no Grande ABC: para cada R$ 100,00 de ISS do G-100, R$ 60,41% correm em paralelo como receita de IPTU.

Os números são ainda inferiores com a retirada da lista da cidade de São Paulo, cujo peso é elevadíssimo na equação, como também os números dos cinco municípios do Grande ABC. Ou seja: o G-100 vira G-94.

Para se ter à mão maior entendimento do estágio do Grande ABC na grade dos dois impostos em confronto, a média dos cinco municípios locais é de R$ 78,32 de IPTU para cada R$ 100,00 de ISS. Ou 23% acima da média do G-100.

PRIORIDADE À TURMA

Entre os vários desafios à nova turma de prefeitos do Grande ABC, na plataforma do Clube dos Prefeitos, certamente a correção gradual e ajustada envolvendo o IPTU e o ISS precisa ser prioridade. Não será fácil. Há o obstáculo da Lei de Responsabilidade Fiscal que determina compensação a eventuais quebras de receita ditadas por medidas administrativas.

O que se sugere é que os secretários de Finanças e os secretários de Desenvolvimento Econômico se lancem para valer à empreitada. Aumentar a distância representativa de receitas do IPTU em relação ao ISS é condição básica para que se coloque no tablado de competitividade algo que possa seduzir investimentos.

Não adianta tapar o sol com a peneira: investimentos privados não são uma decisão aleatória. Todo calhamaço burocrático, entre tantos outros fatores, é observado atentamente. É uma indigestão irreparável acreditar que alíquotas elevadas demais às atividades de serviços e também do IPTU não interferem nas definições estratégicas dos empreendedores mais bem articulados com fatores de competitividade.

A outra saída para o Grande  ABC contornar essa armadilha de gulodice na tributação de uso e ocupação da terra em contraposição à concorrência de municípios que fazem desse fator uma força propulsora a novos investimentos é encontrar uma maneira de elevar os valores arrecadados com o tributo próprio, ou seja, que não dependa de esferas externas, do governo do Estado e do governo federal.

A dúvida que se instala é desafiadora, porque corre-se o risco de cair no dilema de quem nasceu primeiro, se o ovo da tributação ou se a galinha do empreendedorismo. Como assim?  Afinal, como será possível ganhar a guerra de guerrilhas por investimentos na área de serviços sem rebaixar o custo de ocupação e uso da terra, entre outros fatores? 

QUEIMAR AS PESTANAS

Essa é uma questão de deveria levar o Clube dos Prefeitos a queimar as pestanas de prospecções fundamentadas em realidades sacramentadas. O inescapável em tudo isso é que o Custo ABC, expressão cunhada por Fausto  Cestari nos anos 1990, quando integrava o Fórum da Cidadania, entre outras instituições, é, como afirmava, sobressalente ao Custo Brasil, que impacta a economia nacional. Ou seja: o Custo ABC é um preço salgado adicional ao que temos de exageros tributários no País.  

Na edição de amanhã vamos dar mais detalhes sobre essa guerra até agora perdida entre o Grande ABC de IPTU elevado demais em relação ao ISS e outros municípios do Estado.

Não custa lembrar que cromossomos do IPTU são sonegados à mídia. A decomposição dos valores por área é um segredo de Estado praticado nos municípios. Os valores arrecadados são divulgados sem recortes relevantes das áreas industrial, habitacional e de serviços,  atividade que também abarca o comércio.

Entretanto, esse vazio de detalhismos não impede conjecturas que tomam o todo da arrecadação como montante sustentável a avaliações. O que se sabe mesmo é que o IPTU residencial representa a maior parcela das receitas do imposto. Ou seja: o bolso do contribuinte é diretamente atingido pela cobrança de morar na região, e também indiretamente por causa do custo empresarial. Valerá a pena esperar pela edição de amanhã.



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