Seguimos com a recuperação histórica dos nove meses que passei no comando de Redação do Diário do Grande ABC (entre julho de 2004 e abril de 2005). Apresentamos mais um capítulo da newsletter Capital Digital Online, mecanismo eletrônico que utilizamos para levar a Redação do Diário a todos os setores daquela empresa. Tratamos nesta edição (de 10 de dezembro de 2004) de conceitos pétreos da Teoria de Produtividade Editorial. Boa leitura.
Grande ABC, sexta-feira, 10 de dezembro de 2004
Para entender o sentido das notas
da Teoria da Produtividade Editorial
É natural que nem todos estão preparados para compreender o significado das notas que tenho atribuído a matérias geralmente já publicadas pelo nosso jornal. Não atribuo nota à revelia da lógica jornalística. E que lógica é essa? Ora, de observar atentamente cada matéria como um conjunto de parágrafos que definem o enredo de cada acontecimento, por menos importante que seja. Informar com qualidade é tornar a sociedade mais perceptiva, mais exigente, menos individualista. Por isso, alinhavo 10 pontos que, entrelaçados e entrecruzados, contribuem para o entendimento de critérios do valor de cada nota atribuída como elemento de sustentação da Teoria da Produtividade Editorial:
1) Valor da abordagem.
Um enfoque preciso, contundente, inescapável, com substância, é o carro-chefe de qualquer matéria. Quem não consegue encontrar o foco do material a ser redigido pode repensar a proposta de dedilhar. Não se pode errar o alvo, sob pena de um desastre.
2) Valor da eficiência.
Entenda-se eficiência como resultado do melhor texto possível com o menor número igualmente possível de inconformidades que envolve sintaxe e linguagem. A copidescagem da matéria em papel, não na tela do computador, é a melhor forma de chegar a bom tratamento editorial.
3) Valor agregado.
Toda matéria tem agregado de valor objetivo e subjetivo. Objetivos são as informações a que todos têm acesso diante dos fatos relativos à própria notícia. Subjetivos são os pontos em que o repórter faz a diferença por conhecimento cultural e consulta ao banco de dados.
4) Valor da sensibilização.
Escrever bem é saber amarrar o parágrafo seguinte ao parágrafo anterior. É desencadear movimento simétrico na forma mas acrobático no conteúdo. Textos sem sistematização de informações dispersam a leitura e, por fim, se tornam descartáveis.
5) Valor do tempo.
A copidescagem de uma matéria conectada com a cronometragem contribui imensamente à avaliação do resultado final. Textos de tamanhos semelhantes e de cronometragens desiguais explicitam grau de eficiência maior ou menor dos autores.
6) Valor estratégico.
Um produto editorial não pode ser tratado a cada edição, ou pior, em cada editoria, como ilhota com cultura e objetivo diferentes. Uma matéria tecnicamente perfeita sem compromisso com a estratégia editorial de médio e longo prazo jamais construirá rede de transformações pretendidas.
7) Valor tático.
Um produto editorial não pode ignorar o noticiário publicado no dia anterior. Cada acontecimento objeto de informação continuada ao longo dos dias precisa ser amalgamado de maneira que o leitor não seja levado a ter dúvidas sobre o desencadeamento dos fatos.
8) Valor interpretativo.
Jornalismo qualificado não admite que profissional de comunicação seja única e exclusivamente reprodutor acrítico de informações de terceiros. A neutralidade vazia, de deixar para terceiros a publicação de absurdos, é um dos muitos exemplos de vagabundagem editorial.
9) Valor emocional.
Nenhum texto, qualquer que seja o assunto, pode se despir da emocionalidade intrínseca do jornalismo. Textos relatoriais, expressivamente técnicos, inquestionavelmente formais, são um convite à lata do lixo. Por mais que o assunto seja circunspecto, há sempre uma maneira de enxertar humanismo em alguns parágrafos de forma a passar a idéia de que não foi uma máquina qualquer que construiu todos aqueles parágrafos.
10) Valor da racionalidade.
Por mais emocional que um determinado texto seja, dadas as circunstâncias que o encapsula, a racionalidade precisa estar sempre presente. Brigar contra os fatos é levar a informação jornalística à zona de risco de um salto mortal sem proteção. Escrever é a arte de transformar em realidade a contagem até 10 que se recomenda exaustiva e geralmente sem sucesso nas declarações verbais.
CONTEXTUALIZANDO
Continuo a destilar esses 10 mandamentos no ambiente redacional da revista LivreMercado. Mais que destilar, continuo a exercitar esses 10 mandamentos, quer como repórter que jamais deixarei de ser, quer como copidesque que acredito também jamais deixarei de ser entre outras razões porque é atividade pedagógica à melhoria do próprio texto.
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