A seriedade da administração Luiz Marinho em São Bernardo e a tradição, pelo menos a tradição, do Diário do Grande ABC, exigem que tanto um quanto outro se manifestem sem mistificações quanto ao anunciado aeroporto na Capital econômica da Província do Grande ABC. Um aeroporto que de fato não é outra coisa senão um aeroportozinho.
E mesmo um aeroportozinho muito difícil de ganhar forma, porque, não bastassem questões econômico-financeiras, a área escolhida, de mananciais, é contraproducente a tamanho impacto ambiental.
O Diário do Grande ABC fiou-se numa fonte da Prefeitura de São Bernardo para transformar em manchete principal de primeira página, em 15 de outubro último, uma informação disparatada: a administração petista estava preparando um projeto que se rivalizaria com Caieiras e Mogi das Cruzes como alternativa à construção do terceiro aeroporto internacional metropolitano na Grande São Paulo.
Está aí o que dá a pressão de repassar informações sem mecanismos de controle. Nada contra repórteres abelhudos, até mesmo exagerados no ímpeto, porque sem isso geralmente não se tem grandes matérias. Mas aonde estava a chefia, geralmente mais experiente, para filtrar as informações? Principalmente porque aeroporto na Província do Grande ABC é assunto tão antigo quanto a neblina que cobre os mananciais, únicas áreas supostamente disponíveis para tal empreendimento.
Prova do crime
Reproduzo alguns trechos da matéria do Diário do Grande ABC no sentido de que não tentem desclassificar a informação que presto aos leitores:
A Prefeitura de São Bernardo, chefiada por Luiz Marinho (PT), planeja entrar na briga com o município de Caieiras para receber o terceiro aeroporto da Região Metropolitana. Mogi das Cruzes corre por fora na briga. O projeto está sendo desenvolvido e guardado a sete chaves pelo secretariado do Paço, inclusive com perspectiva de áreas com potencial para receber o empreendimento. Em reuniões fechadas para formulação da peça orçamentária de 2012, Marinho chegou a tocar no assunto com o primeiro escalão e conselheiros do Orçamento Participativo e disse que São Bernardo quer acolher o terminal aéreo. As áreas preferidas são próximas ao Trecho Sul do Rodoanel, mas a União poderia ser fundamental para viabilizar o projeto, com capacidade de atrair investidores privados para o empreendimento. O secretário de Desenvolvimento Econômico e Turismo, Jefferson José da Conceição, deu mostras de que o plano não está em estágio tão primário na administração, tanto que afiançou que há um projeto executivo finalizado. Esse documento é responsável por demarcar o terreno do aeroporto, delinear estratégias de mobilidade urbana e até a estipular capacidade de funcionamento. “Estamos empenhados. O prefeito lidera essa questão do aeroporto, mas não posso dar detalhes. É uma discussão série e não é ideia, é projeto executivo”.
Conto da carochinha
A reportagem do Diário do Grande ABC de 15 de outubro traz outras informações, mas o básico está nos parágrafos reproduzidos acima. O jornalista caiu no conto da carochinha porque acreditou demais no secretário da Prefeitura de São Bernardo. Fixou-se no entusiasmo do funcionário público. Deixou de pesquisar, um dos quesitos básicos do bom jornalismo. Foi o que fizemos quando soubemos do assunto e nos lançamos a publicar textos nesta revista digital.
Aliás, antes mesmo disso, por conta de um pronunciamento espetaculoso de Valter Moura, ao assumir alguns meses antes a presidência da Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC, interviemos para colocar ordem no triunfalismo do dirigente. À falta de planejamento minimamente factível para a economia da região, Valter Moura meteu-se numa seara que lhe é totalmente desconhecida. Entretanto, para quem procura 15 linhas de fama, atingiu o objetivo, já que ganhou manchetes de jornais da região ao propor aeroporto na região, como outros o fizeram em passado remoto. Quando, mais tarde, surgiu a notícia de aeroporto em São Bernardo, Valter Moura não perdeu tempo: correu para escrever um artigo louvatório a Luiz Marinho. Uma tentativa de aliviar a barra do relacionamento nada satisfatório entre o dirigente público e o também e vitalício presidente da Associação Comercial de São Bernardo.
Tudo ficou mais claro esta semana quando o prefeito Luiz Marinho acabou por dar indicativos de algo que traduzi nesta revista digital como espécie de aeroportozinho que não tem nada a ver com a disputa que grandes investidores mantém para construir a obra em Caieiras.
O que São Bernardo quer de verdade é um campo de pouso para pequenos aviões de executivos, com demandas comerciais de carga e descarga de pequeno porte também.
Mesmo com informações escassas mas esclarecedoras prestadas por Luiz Marinho durante o evento de aniversário do Clube dos Prefeitos, tanto o Diário do Grande ABC como os demais jornais da região mantiveram o tamanho do negócio submerso à impressão anterior de que seria um grande investimento. Nadaram, portanto, de braçadas contra os fatos.
Insistindo no erro
O Diário do Grande ABC, responsável pela bola furada, teve o desplante de, na edição de terça-feira, repercutindo declarações do prefeito Luiz Marinho, gargantear que dera com exclusividade a informação sobre o aeroporto. A tal daquela edição de outubro. O mínimo que deveria proceder para ter relação honesta com os leitores seria esclarecer ao distinto público que em vez de uma autoestrada poderemos ter, se tivermos, uma estrada vicinal.
Agora o que resta ao prefeito Luiz Marinho não é outra saída senão acabar com os segredinhos processuais que envolvem o projeto do aeroportozinho em São Bernardo e esclarecer todos os pontos, retirando o assunto de um pauta ibopeana de baixa qualidade técnica.
Embora aeroportozinho, embora bastante inviável financeiramente e também nos aspectos ambientais, a obra pretendida por Luiz Marinho não pode ser catalogada de patética. Dependendo do espaço físico que exigiria para sair do papel, caso contorne todos os obstáculos que saltam à vista de qualquer cidadão minimamente bem informado, o aeroportozinho de São Bernardo seria bem-vindo como ferramenta logística suplementar.
Aliás, desde o princípio, optasse a administração de São Bernardo por informação qualificada, esse deveria ser o tom empregado no suprimento à Imprensa. A cronologia dos fatos e das especulações coloca o temário numa situação diversa da que seria possível.
Explico: fosse o aeroportozinho tratado como aeroportozinho desde de o princípio, não como aeroportozão como se manipulou, a iniciativa teria obtido grau muito maior de receptividade e de credibilidade. E mostraria saudável inquietação do prefeito Luiz Marinho em lidar com um dos nós mais complexos da economia regional, que é o paradoxo de contar com a serpentina do trecho sul do Rodoanel sem, entretanto, ter conquistado com a obra a penetrabilidade logística econômica desejada. Uma caçapa cantada neste espaço.
O transporte aéreo, mesmo tendo como ponto de inflexão um aeroportozinho, e desde que viabilizado sem cometer a loucura de fragilizar ainda mais o meio ambiente regional, seria muito bem-vindo.
Não custa nada o prefeito Luiz Marinho corrigir a rota de desinformação ou de excessivo entusiasmo de seu secretário e, por tabela, dar uma lição de transparência e responsabilidade informativa ao Diário do Grande ABC.
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