Imprensa

Expectativa confirmada: ninguém
topa fazer jornalismo sem vícios

DANIEL LIMA - 28/05/2012

Já completou um ano (foi na edição de 11 de maio de 2011) que decidi fazer uma provocação sob o título "Quer ser acionista de CapitalSocial? Então se prepare para as cláusulas". O resultado foi o esperado, previsto já nas primeiras linhas daquele texto: a Província do Grande ABC não tem gente com dinheiro suficiente, com coragem necessária ou com autonomia indispensável para integrar uma empreitada à produção de uma revista impressa sob a orientação deste jornalista. No fundo, no fundo, ainda bem. Não tenho saudade alguma do dia a dia de escravagismo dos tempos de jornalismo impresso. Além disso, ou principalmente, o momento presente da informação converte-se em combinação que procuramos a todo custo durante todo o tempo: o jornalismo interpretativo e analítico em plataforma digital.
 
A leitura do texto de maio do ano passado é importante para entender o significado do subsequente mutismo. Estamos muito mal acostumados com a forma de fazer jornalismo na região e na maioria dos endereços nacionais de publicações de porte pequeno e médio. As dificuldades cada vez maiores para manter produtos impressos numa região em decadência histórica conduzem os caminhos da mídia a rotas desgastantes. Poucos conseguem resistir aos cantos de sereias mais que manjadas. É preciso especializar-se em esgrima e contorcionismo.
 
Repito que aquela proposta foi sim uma provocação. E também a sinalização de valores dos quais não abriria mão para dirigir o projeto. Sob outras condições jamais aceitaria. Sei qual é o resultado final: vou dar com os burros nágua e ainda caminharia celeremente à degola ética e moral.
 
Não é de hoje que a sustentação de um produto jornalístico impresso de nível na Província do Grande ABC, especificamente na seara de revistas, é quase impossível. Tanto é verdade que não existe uma publicação sequer que resvale em algo substanciosamente comprometido com a sociedade, exceto se esse comprometimento for o concubinato com os incluídos deslumbrados que adoram festinhas mequetrefes.
 
Declínio e dependência
 
A revista LivreMercado, que dirigi editorialmente por duas décadas, começou a declinar do poderio comercial muito antes de repassada a um aventureiro que apareceu na praça para salvar a lavoura de dívidas com funcionários e fornecedores esticadas havia muito tempo por empréstimos bancários. A partir de 2000 começaram a aflorar as dificuldades. O projeto editorial seguiu praticamente incólume às desventuras comerciais e administrativas originárias de primarismos diretivos e de um quadro econômico regional em forte declínio. Com a livre iniciativa regional abatida a cada novo grande investimento de conglomerados nacionais e internacionais na área de comércio e de serviços,  LivreMercado passou a depender demais de recursos públicos.
 
Fiz das tripas coração para evitar contaminações, mas sabia que, minoritário como acionista, poderia ser colocado na rua a qualquer instante pelos demais sócios, Diário do Grande ABC à frente, caso excedesse no confronto direto com os prevaricadores, os quais não poupo críticas desde que alcancei completa independência com este veículo. Por conta daquela situação trabalhei o tempo todo no coletivismo do fracasso institucional da região, com reflexos automáticos na economia e na sociedade. As individualidades das administrações municipais pesavam muito menos no conjunto da obra. Era preciso driblar a censura econômica implícita e quase compulsória à continuidade do projeto editorial.
 
O legado da LivreMercado que comandei editorialmente é reconhecido por quem não tem rabo preso. A recuperação gradual dos arquivos daquela publicação nas páginas desta revista digital é uma forma de manter a história de um jornalismo revolucionário que a Província do Grande ABC jamais mereceu justamente por ser Província. Foram duas décadas de intensa dedicação em favor de objetivos que se constataram oníricos, como a inovação que terminou patética do Fórum da Cidadania, as lambanças do Clube de Prefeitos, as promessas de obras e iniciativas que jamais ultrapassaram os limites dos gogós de demagogos, entre tantas outras desventuras que nos tornaram céticos às promessas que se repetem com novos personagens.
 
Protagonismo editorial
 
Mas tudo aquilo valeu muito a pena porque, com nossa equipe de redação, acabamos protagonistas editoriais dos anos mais promissores desta Província. Infelizmente, as perspectivas alvissareiras viraram resultados desastrosos só aliviados, mesmo com todos os problemas, após a substituição presidencial ditada pela democracia do voto.
 
A chegada de Lula da Silva ao poder quebrou o galho da Província do Grande ABC mas o novo modelo está longe de alcançar o grau de resolutividade de que necessitamos. Se o PSDB de Fernando Henrique Cardoso maltratou o coração automotivo da Província, castigando-o com guerra fiscal e abertura descomunal dos portos, o PT partidariza demais nossos destinos, impingindo-nos, inclusive, uma Universidade Federal que não passa, como bem definiu o educador Valmor Bolan, de barriga de aluguel. Uma universidade sem entranhamento regional. Alguns penduricalhos espertamente introduzidos na agenda acadêmica são uma tentativa clara de enganar os bobos dos crédulos com a casca do ovo de marketing.
 
Este texto talvez seja autoexplicativo à fuga de eventuais investidores de projeto jornalístico que rompa com  obviedades e falsas unanimidades. Jamais nutri ilusões com a possibilidade de CapitalSocial tornar-se impressa. Cada vez mais estou convicto de que essa medida torna-se mais e mais dispensável, ante o sucesso de audiência que alcançamos e elevamos a cada novo dia. Nossa tiragem original diária de 121 mil exemplares nos dá a garantia de que estamos cada vez mais plantando o ideário de cidadania reflexiva. É esse o nosso propósito de sempre.


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