A renúncia de Milton Bigucci à presidência da Associação dos Construtores, Imobiliárias e Administradoras do Grande ABC (Acigabc) é o caminho mais curto, eficaz e também menos desgastante para a retomada de uma entidade que pretende modernizar-se para contribuir com a cidadania regional, entre outros objetivos. O movimento de oposição ao regime centralizador, autoritário e isolacionista do empresário Milton Bigucci entranha-se principalmente entre os pequenos e médios empreendedores do setor, desencantados e afastados da entidade.
A recente cerimônia que Milton Bigucci promoveu em homenagem à cúpula da Polícia Militar do Grande ABC, por si só fora do esquadro de relevância a uma entidade que representa um setor em ebulição, foi um tiro no pé do dirigente. A completa ausência da classe de construtores, guarda-chuva da instituição, afundou a expectativa de Milton Bigucci fazer do encontro uma plataforma à blindagem contra as críticas de todos os segmentos do setor. Constatou-se, novamente, a falta de representatividade da direção conduzida pelo titular da MBigucci, uma das maiores empresas do setor na região. Não fossem os militares presentes, e uma literal meia dúzia de amigos do anfitrião, o coquetel seria doado a alguma instituição assistencial.
O desgaste da fuselagem institucional de Milton Bigucci é uma constatação que se contrapõe ao brilho empresarial. Os opositores à permanência de Milton Bigucci na Associação dos Construtores são praticamente os mesmos que o enaltecem como empresário. Deixam claro com o posicionamento que as decepções geradas com mandatos seguidos de improdutividade não tem conteúdo pessoal nem empresarial. Trata-se de desencanto com os rumos da Acigabc.
Cartas marcadas
Como as eleições na Associação dos Construtores sob a inspiração de Milton Bigucci são uma encenação de democracia, já que as cartas são todas marcadas, os empreendedores que pretendem colocar a instituição longe das inutilidades da atual direção esperam pela renúncia do titular. Sabem eles que ainda há dois anos de mandato e, mais que isso, muito mais que isso, que o arcabouço estatutário é de tal maneira preservacionista dos membros da situação que é praticamente impossível derrotar Milton Bigucci.
Traduzindo a equação: há armadilhas estatutárias que tornam a tarefa reeleitoral de Milton Bigucci uma articulação sem grandes dificuldades de alcançar sucesso, ao passo que àqueles que pretendem mudar o quadro da entidade restará flertar com o quase impossível. As manobras que se traduziriam em votos favoráveis a Milton Bigucci são uma concessão estatutária gestada sob medida para que não haja nenhuma possibilidade de surpresa nas urnas.
Traduzindo ainda mais a equação: a Associação dos Construtores do Grande ABC é na prática uma grande Cuba, porque os mecanismos habilitadores do eleitorado e, mais que isso, de prevalecimento de uma maioria sob medida, são indecifráveis ou incontroláveis para os oposicionistas. Transparência é o que menos transborda das linhas estatutárias.
Gestão reprovada
O esvaziamento presidencial da Associação dos Construtores é tão escancaradamente público que já não se disfarça. Há antagonismos latentes a dividir os empreendedores imobiliários. A gestão de Milton Bigucci já não é mais questionada. É duramente reprovada, porque constatou-se irrecuperável. O vexame ante autoridades policiais-militares ganha o formato de uma senha à rebelião mais explicita. Mas nem mesmo assim há garantias, entre os inconformados, que também podem ser chamados de rebelados, de que Milton Bigucci desistirá da presidência. Quem o conhece sabe que é mais fácil reagir na tentativa de dourar a pílula do descredenciamento corporativo a que está entregue. Para tanto, conta com o respaldo de uma parte da mídia da qual sempre se aproximou e com a qual, inclusive, mantém laços mais que próximos.
O esfarelamento da autoridade de Milton Bigucci na Associação dos Construtores não se restringe à fragilidade técnico-operacional e institucional de uma entidade a léguas de distância de representar um dos setores mais importantes da economia regional. As queixas ganham volume na medida em que se cavoucam desventuras de outras ordens. Como a mistura do que é institucional, de interesse supostamente de toda a categoria, e do que é particular, de interesse privativo da MBigucci.
O viciado leilão de área pública de São Bernardo, denunciado por CapitalSocial e que está entregue ao Ministério Público, é apenas um dos gargalos de respeitabilidade que Milton Bigucci expôs como prova de que primeiro estão seus interesses privados, depois veem de novo seus interesses privados e, por fim, outra vez seus interesses privados. Tudo com o dístico da Associação dos Construtores a lhe fomentar, supostamente, mais prestígio.
Mais derrotas
Como o dirigente odeia quem lhe opõe críticas fundamentadas, não é difícil acreditar que mais uma vez ele recorra à Justiça, como o fez já três vezes, sempre com derrotas, para tentar inserir este artigo em supostas manobras ofensivas, quando não injuriosas. Perderia de novo porque escrevo fundamentado em informações de gente que quer dar novos rumos à Associação dos Construtores. E também, ou principalmente, com base na inexistência de um legado mesmo que incipiente de atuação naquela organização socioeconômica.
Os empreendedores imobiliários da região estão em estado de rebelião, mas reconhecem que não existe uma força maior de adesão aos desejos de renovação e reestruturação senão emanada do próprio centro de gestão e de difusão do processo de esquartejamento coletivo da atividade – isso mesmo, o presidente Milton Bigucci.
A expectativa é de que o dirigente que transformou a Associação dos Construtores num clubezinho de Terceira Divisão encontre alguma justificativa para afastar-se da direção, abrindo espaço à completa reformulação do estatuto por um colegiado representativo de fato da classe e, em seguida, o encaminhamento de composição de uma chapa de conciliação para dar novos rumos à entidade. O Clube dos Construtores sonhado pelos pequenos, médios e grandes empreendedores figuraria como ponta de lança de mudanças institucionais na região. Inclusive com a produção de estatísticas que não sejam desmoralizantes como as anunciadas praticamente todos os meses por Milton Bigucci.
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