Imprensa

Diário do Grande ABC faz cobertura
eleitoral à altura do provincianismo

DANIEL LIMA - 11/07/2012

A cobertura eleitoral desencadeada nas páginas do Diário do Grande ABC é digna do porta-estandarte do provincianismo regional. Sei lá até quando vai essa fórmula de quantidade em detrimento da qualidade, da generalidade à custa do específico, uma fórmula antiga, a bem da verdade, mas se seguir em frente vai ser duro de lascar. Para os leitores comuns nenhum problema, porque basta deixar as páginas para lá, ou dar-lhes outras finalidades. Mas aos mais exigentes, os mais atentos, os mais preocupados com o destino da Província, é uma roubada.
 
Como em outras temporadas, falta massa cinzenta aos jornalistas do Diário do Grande ABC. Duvido que não haja esse material naquela redação, mas provavelmente está subordinado a conceitos arraigados, a ervas daninhas de uma cultura interna esclerosada.
 
Duvido também que entre os profissionais de redação do Diário do Grande ABC não exista um grupo que vai dar um salto na carreira por conta de apetrechos intelectuais e vocacionais. Sempre foi assim. Aliás, os diretores do Diário do Grande ABC sempre se orgulharam mais dos profissionais que debandaram do que dos que ficaram. Complexo de Gata Borralheira é isso mesmo. Eles adoravam dizer que fulano de tal estava no Estadão, na Folha, na Globo.
 
Esqueciam de dizer que todos se escafederam porque jamais encontraram na empresa -- e isso desde sempre, não apenas nestes últimos anos sob nova direção -- um mínimo de organização que os valorizasse. Plano de cargos e salários só valia a outros departamentos. A redação sempre foi um filho bastardo. E só não o foi mais porque Fausto Polesi, que dirigiu o departamento durante anos, era jornalista.
 
Como o horário eleitoral

Mas isso é outra história. Não vou dar consultoria de graça (nem mesmo remunerada) ao Diário do Grande ABC sobre a melhor maneira de cobrir esse período eleitoral. Mas algumas dicas são possíveis de repassar, até porque tenho obrigações com os leitores desta revista digital. Não posso dizer que o Diário do Grande ABC é o símbolo do provincianismo regional se não matar a cobra e mostrar o pau.
 
Sair diariamente à cata dos candidatos nos sete municípios, perseguindo-lhes os passos e registrar sem brilho nem encantamento suas andanças eleitorais é de doer os calos. A repetição de informações, a fragilidade de dados, os slogans mais que manjados, os ataques nem sempre sutis e longe de materialidades, tudo isso e muito mais transformam os textos em fardos pesadíssimos para quem tem alternativas em busca de conhecimento. Duvido que os leitores do Diário do Grande ABC percam tempo semelhante ao que despendo à leitura dessas matérias.
 
Quando se confundem quilometragem e qualificação de insumo informativo, não há possibilidade de fertilidade. O Diário imprime em suas páginas um noticiário que poderia ser transposto com alguma adaptação de forma ao programa eleitoral obrigatório de televisão, caso houvesse essa janela tecnológica no território regional. Prevalece o discurso manjado de candidatos em busca de 15 segundos de fama. Não há contraditórios. Ou seja: é algo muito pior que o programa eleitoral de TV, porque pelo menos naqueles, nos dias seguintes, há réplicas e tréplicas. Na maioria dos casos, apelações, desrespeitos, ataques gratuitos, mas há.
 
O pior da programação eleitoral nas páginas do Diário do Grande ABC não está apenas no volume e na qualidade do conteúdo. Está também nos valores relativos. Explico: duvido que exista no jornalismo brasileiro, entre os principais veículos de comunicação, nos 50 veículos de comunicação mais importantes, algum jornal que proporcionalmente tenha mais páginas de cobertura político-eleitoral que o Diário do Grande ABC.
 
Quando escrevo "proporcionalmente" quero dizer o volume dessas páginas em confronto com as demais editorias. Parece que o Diário do Grande ABC colocou todo o efetivo, já bastante reduzido, a serviço dos candidatos, prestando-lhes espécie de assessoria de imprensa. Nas demais páginas do jornal sobram pouco noticiário informativo local. As agências de notícias aparecem muito mais.



Desproporcionalidade demais

Nem mesmo se o noticiário reservado à cobertura político-eleitoral do Diário do Grande ABC recorresse a uma concepção radicalmente diferente de abordagem, ou seja, se fosse direcionada de forma mais crítica do que bajulativa, valeria a pena tamanha desproporção espacial.
 
Nenhuma temática, por mais importante que seja, resiste à paciência dos leitores quando massificada na dimensão apresentada pelo Diário do Grande ABC Eleitoral. Nem mesmo a conquista da Taça Libertadores pelo Corinthians resiste à exaustão natural. O que o Diário do Grande ABC vem realizando com a jornada eleitoral na Província do Grande ABC é uma obsessão por dar tratamento de Corinthians campeão da Libertadores em todas as edições subsequentes ao título. Com a desvantagem de que o Corinthians por si só gera um estado permanente de confrontos e, portanto, de algum grau importante de tensão e atenção. Já a maioria dos candidatos, convenhamos, não tem essa empatia popular. Para dizer o mínimo.
 
Há uma infinidade temática a ser destrinchada pelos concorrentes municipais em questões que envolvem tanto problemas locais quanto no âmbito da própria Província. Por isso a distância que separa a edição de amanhã da edição do segundo turno poderia ser preenchida com facilidade e muito mais produtividade social. E ainda sobrariam questões a ser dissecadas.
 
É claro que isso tipo de pauta não interessa ao Diário do Grande ABC. Primeiro porque, dada a fragilização da redação, exposta a crises permanentes da mídia impressa, a construção do edifício temático seria por demais complexa e muito provavelmente impossível de ser alcançada na magnitude que exigiria. Segundo porque os próprios concorrentes eleitorais, na maioria dos casos, ficariam em posição desconfortável, porque mal sabem se virar com o atual fast-food de assuntos que não passam da superficialidade que imaginam atender aos interesses dos eleitores.

Risco de multiplicação

Outras publicações impressas da região (e que contam com plataformas digitais) não caíram na pasmaceira de desequilíbrio de cobertura político-eleitoral do Diário do Grande ABC. Tomara que não se deixem contaminar, porque há um mundo disponível na Província do Grande ABC muito além das barras da saia das atividades políticas. Ninguém resiste a essa overdose de salamaleques que se traveste de noticiário.
 
A Província do Grande ABC está tão distante dos bons tempos pré-abertura dos portos que chega a ser um acinte, um desrespeito, uma alienação, esse jogo desigual de entregar tudo aos concorrentes eleitorais e praticamente ignorar os desajustes econômicos e sociais. Mas, como a repetir o passado, sem que se tenha aprendido absolutamente nada, as manchetes sazonais que tratam principalmente de fissuras sociais, acabam por recolocar mesmo que temporariamente o bom senso e a verdade nos eixos.

Para desgosto dos triunfalistas de sempre, estorvos catapultados a posições de destaque sem oferecer nada em troca, apenas o silêncio covarde ou a bajulação imbecil.


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