O prestígio do prefeito Luiz Marinho no governo federal, sempre a reboque do amigo Lula da Silva, ex-presidente da República, não conseguiu seduzir a cúpula da Petrobras. Acabou de ruir um dos projetos mais aguardados pelo petista que lidera o partido na Província do Grande ABC. A Petrobras não incluiu São Bernardo e a Província do Grande ABC na relação dos APLs (Arranjos Produtivos Locais) no entorno de grandes empreendimentos da companhia, como refinarias e polos de construção naval e offshore. Em parceria com o Ministério do Desenvolvimento (Mdic) e com a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), a Petrobras definiu cinco projetos-piloto de APLs ligados à indústria do petróleo e gás: Rio Grande (RS), Itaboraí (RJ), Ipatinga (MG), Maragogipe (BA) e Ipojuca (PE). A notícia foi divulgada com destaque nesta sexta-feira pelo jornal Valor Econômico sem fazer qualquer referência à proposta de Luiz Marinho. Acredita-se que a Administração petista procurará minimizar o estrago político.
A ausência de São Bernardo na lista de municípios que estarão no centro das atenções da Petrobras é um duro golpe na Administração Luiz Marinho e coloca em dúvida até onde iriam os tentáculos de aderência do prestígio do ex-presidente Lula da Silva para abrir portas ao petista que pretende concorrer ao governo do Estado em 2018. O APL de petróleo e gás é um dos eixos estratégicos da política de desenvolvimento econômico anunciada com insistência e estardalhaço pelo prefeito de São Bernardo.
Em junho deste ano, Jefferson José da Conceição, secretário de Desenvolvimento Econômico Trabalho e Turismo de São Bernardo, escreveu em conjunto com João Mendes, assessor econômico da secretaria, um artigo que dimensionava o sonho de São Bernardo inserir-se no mundo de petróleo e gás. “O Município e o ABCD têm grande potencial para contribuir com o desenvolvimento nacional desta cadeia produtiva. Temos o maior parque produtivo da América Latina e nosso território localiza-se muito próximo à bacia de Santos, onde será extraída grande parte da riqueza do Pré-Sal” – escreveram. E seguiram: “Tendo definido uma estratégia clara, a Prefeitura passou a atuar em diversas frentes de trabalho com o objetivo de mobilizar as empresas para que estivessem atentas às oportunidades do Pré-Sal. Foram realizados diversos encontros empresariais sobre o assunto. Um deles contou inclusive com a participação da atual presidente da Petrobras, então diretora de Gás e Energia, Maria das Graças Foster. Além disso, abrimos um diálogo com as instituições de ensino na região, com vistas a ajudá-las no cadastramento na rede de universidades da Petrobras. A intenção é possibilitar que possam captar os vultosos volumes de recursos que estão previstos para a área de ensino e pesquisa no setor” --- afirmaram.
Uma má notícia
A notícia que define as localidades que estão mais imediatamente no raio de ação das APLs propostas pela Petrobras é um balde de água fria nas pretensões de Luiz Marinho iniciar uma empreitada que visaria a minimizar a exagerada dependência de São Bernardo – e da Província como um todo – do setor automotivo.
Entretanto, o resultado dos estudos da Petrobras não causam surpresas. Embora propalasse uma série de iniciativas, a Prefeitura de São Bernardo não conseguiu reunir para valer elementos técnicos e um plano estratégico que convencesse a alta direção da Petrobras. A Secretaria de Desenvolvimento Econômico de São Bernardo segue figurino semelhante ao das mesmas secretarias dos demais municípios da Província: não conta com recursos humanos, tecnológicos e financeiros para liderar um processo de reconstrução da economia regional, cada vez mais deslocada no ranking dos principais municípios paulistas.
A Administração Luiz Marinho converteu-se nos primeiros quatro anos em sucessão de obras de infraestrutura, contando para tanto com fartos recursos federais estrategicamente aprovados graças à atuação da ministra de Planejamento, Miriam Belchior, nos bastidores da gestão petistas. Entretanto, há limites orçamentários federais que exigem maior torque político-institucional para a ampliação de ações.
A reportagem da edição desta sexta-feira do Valor Econômico diz que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) vai participar dos financiamentos dos diferentes APLs:
Paulo Afonso, coordenador-executivo do Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural (Prominp), disse que a implantação dos APLs vai exigir mecanismos de financiamento. “Daí a importância do BNDES”, diz. (...) O objetivo é ter esses APLs implementados em cinco anos e, em meados de 2014, outros projetos de APLs poderão ser selecionados. Há demandas de muitos Estados para que outros APLs ligados ao setor sejam implementados, mas Afonso disse que os primeiros se situam em regiões onde a demanda por bens e serviços surge com mais força.
Efetividade sob desconfiança
Como explica didaticamente o jornal paulistano, APLs são aglomerados de empresas de um setor que se situam em uma mesma área geográfica e que cooperam entre si sem deixar de concorrer, aproveitando sinergias de estarem próximas. Ainda segundo o Valor Econômico, entre as empresas de um APL aumentam oportunidades de colaboração e há condições de utilizar melhor os recursos aplicados. Pode-se, por exemplo, fazer certificação técnica para um conjunto de empresas. No caso do petróleo, segundo o jornal, o desafio é maior já que a cadeia de fornecedores é diversificada.
Não faltam especialistas a desdenhar do projeto de Luiz Marinho para São Bernardo. A matriz automotiva, com emaranhado de complicações econômicas, trabalhistas, culturais e sindicais, entre vários pontos, dificilmente seria adaptada à cadeia de óleo e gás. Resultados pontuais de uma empresa ou outra que se deslocaria do eixo sobrerrodas para a especialidade da Petrobras seriam a regra da nova configuração da matriz produtiva de São Bernardo e também da Província. Nada, entretanto, que alteraria o ritmo da economia regional.
As dificuldades poderiam ser ainda maiores porque a própria Petrobras encontra dificuldades para o desenvolvimento os Arranjos Produtivos Locais, como admitiu o executivo da companhia, Paulo Afonso, ao Valor Econômico:
Afonso disse que a Petrobras tem tradição de desenvolver fornecedores de forma pontual, mas fazê-lo dentro de APLs é algo diferente para a companhia. Ele disse que os projetos selecionados estão em estágios diferentes de desenvolvimento: Rio Grande está mais avançado, Ipatinga encontra-se em fase intermediária, mas já tem uma base metalomecânica instalada, e Pernambuco conta com vários empreendimentos da Petrobras, o que impulsiona a iniciativa. Já o Rio possui ações públicas para desenvolver a região de Itaboraí, onde vai operar o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), e, em Maragogipe, onde será construído um grande estaleiro, ainda há trabalho a ser feito. “O esforço é organizar polos para atender a Petrobras de maneira mais orientada”, afirmou Heloisa Menezes, secretária de desenvolvimento da produção do Mdic. Nos APLs, os projetos da Petrobras vão funcionar como espécie de âncoras, que tem um lado bom, pois sinaliza de forma clara aos fornecedores quem é o cliente. O que precisa se evitar nesses casos é a dependência em relação a somente um grande comprador, no caso a Petrobras.
Importância relativizada
A advertência do jornal Valor Econômico relativiza a importância estratégica da divulgada cadeia produtiva de óleo e gás proposta por Luiz Marinho para São Bernardo. O Município que apresentou o pior resultado nos quesitos Emprego e Renda entre os integrantes do G-20, o grupo dos 20 maiores endereços econômicos paulistas, segundo dados de pesquisa da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro, poderia, mesmo ante eventual sucesso da empreitada propalada pela Administração petista, ficar refém de dois setores vulneráveis demais à concorrência nacional e internacional: o automotivo e o de petróleo e gás.
A eventualidade de São Bernardo ser incluída nos próximos anos numa segunda lista de APLs a serem desenvolvidos com suporte da Petrobras não está descartada. Luiz Marinho terá mais quatro anos de mandato e retomaria a carga para colocar a região no mapa de investimentos da Petrobras. Mesmo que tudo não passe, também nos quatro anos, de um anúncio mais voltado ao fortalecimento político do prefeito em busca de novos voos, sem compromisso sólido como o cronograma de ações efetivas.
Em tempo e para melhor compreensão do texto sugerido abaixo, um dos muitos que constam dos arquivos desta revista digital: APL é a condensação de uma expressão aportuguesada de cadeia de produção que em terras estrangeiras ganhou a denominação de cluster. Optaram os especialistas verde-amarelos por Arranjos Produtivos Locais porque, ao que parece, tem uma ligação cognitiva mais direta.
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