Imprensa

Vou ao Corregedor-Geral do MP
contra perseguição de promotores

DANIEL LIMA - 13/06/2013

Este é um desabafo endereçado principalmente e por enquanto ao Corregedor-Geral do Ministério Público do Estado de São Paulo, que acaba de mandar abrir investigações sobre o escândalo do leilão arrematado de forma fraudulenta pela MBigucci.  Não sei que caminhos jurídicos tomarei, se forem necessários. Vou consultar especialistas. Provavelmente irei a instâncias máximas do Judiciário e também do próprio Ministério Público para afirmar com todas as letras: alguns integrantes dessa importante instituição para o equilíbrio do ordenamento jurídico do País não me perdoam e me perseguem porque não me alinhei à tese de que o assassinato do então prefeito de Santo André, Celso Daniel, deu-se por conta de suposta rede de propinas no Paço Municipal.


 


Só existe uma possibilidade de integrantes do Ministério Público da região, sobretudo vinculados ao caso Celso Daniel e suas ramificações mais próximas, não estarem a me mover perseguição: se não entenderem absolutamente nada de investigação criminal para esclarecer pelo menos três casos denunciados por este jornalista: as irregularidades ambientais e processuais-burocráticas do condomínio Residencial Ventura, no Bairro Jardim, em Santo André, as aberrações jurídicas e administrativas da Cidade Pirelli, também em Santo André, e os mais que provados desvios licitatórios que levaram a MBigucci a arrematar por valor muito abaixo do mercado um terreno privilegiadíssimo, hoje estimado em pelo menos R$ 70 milhões e sobre o qual anuncia decisão de construir o chamado Marco Zero, em São Bernardo.


 


Fontes confiáveis


 


Disponho de fontes para assegurar completa indisposição de alguns integrantes do Ministério Público a tudo que este profissional apresentar como atividade jornalística, como poderia ser definido um trabalho histórico porque mais completo que o de qualquer outra mídia sobre a cobertura do caso Celso Daniel. Alguns deles não teriam esquecido o quanto colidimos durante os anos de desdobramentos daquele assassinato. Já outros, mais sensatos, entenderam as especificidades de abordagens dos mundos profissionais que vivemos.


 


A diferença entre o trabalho que realizei e o que os promotores criminais apresentaram é que ouvi todos os lados, inclusive os promotores criminais, e eles partiram de uma ideia fixa de que o empresário Sérgio Gomes da Silva fora o mandante do crime. Uma tremenda barrigada investigativa que só obteve credibilidade maciça e coloca meu trabalho jornalístico submerso àquelas fantasias porque a maioria da mídia não teve acesso ao contraditório das forças policiais, impedidas durante três anos de dar informações.


 


Não interessou jamais ao Ministério Público, especialmente ao Gaerco então instalado em Santo André, que, ao ouvir tantos outros lados, acabei por cristalizar a convicção de que o crime foi ocasional. Nada a diferenciar-se da conclusão de uma força-tarefa da Polícia Civil de São Paulo, que contou com 35 homens, e também da Polícia Federal. Sempre é bom lembrar, porque em tudo há conjecturas à politização do crime, que a Polícia paulista contava com o comando da Secretaria de Segurança Pública vinculada ao PSDB, como hoje e como antes do assassinato. E que o governo Geraldo Alckmin reagiu com virulência tática à ofensiva do PT que politizou o crime por conta do estado de abandono da Região Metropolitana de São Paulo à bandidagem naquele começo de novo século.


 


Tanto que uma das primeiras providências pós-assassinato, além do paralelismo autônomo de investigações do Gaerco, foi a troca de comando na Secretaria de Segurança Pública do Estado. Saiu o defensor dos Direitos Humanos Marco Vinício Petrelluzzi legado por Mário Covas e entrou em campo um trator chamado Saulo de Castro.


 


Nem Veja acreditou


 


Costumo dizer aos mais próximos que a síntese de que Sérgio Gomes da Silva foi quase tão vítima quanto Celso Daniel é que nem mesmo a revista Veja, numa edição histórica, teve a ousadia editorial que normalmente não lhe falta nas bolas divididas, para afirmar que o crime se desenrolou conforme a versão dos integrantes do Gaerco. Ao colocar um imenso ponto de interrogação sobre a motivação do assassinato, a publicação da Editora Abril revelou senso de responsabilidade que as esquerdas não costumam lhe atribuir.


 


Por razões estritamente éticas, jamais revelarei o conteúdo do diálogo que mantive com o repórter especial daquele trabalho, com quem me encontrei em Santo André pouco tempo antes de a apuração jornalística tornar-se Reportagem de Capa. O ponto de interrogação diz por si. Veja preferiu deixar no ar uma dúvida que as investigações da força-tarefa policial dinamitaram e o Gaerco artificializou. Ou seja: a maior revista semanal do País também não acreditou no desempenho dos promotores criminais instalados em Santo André.


 


Fosse este jornalista uma maria-vai-com-as-outras, teria aderido prontamente à tese de crime de encomenda, de crime político que integrantes do Gaerco cansaram de caracterizar. Seria mais simples, mais cômodo e mais tranquilizador. Afinal, nem conhecer conhecia Sérgio Gomes da Silva, sempre tive um pé atrás com o Partido dos Trabalhadores, como o tenho com todas as demais agremiações políticas, e sabia de antemão que nada me prejudicaria mais como profissional então à frente da revista LivreMercado que eventual antipatia de grande parte da classe média da região, a quem a revista era direcionada, avessa como se sabe ao PT e aos sindicalistas.


 


Mergulhei no caso Celso Daniel certo de que poderia ser mal visto pelo Ministério Público local, mas jamais imaginei que chegasse ao ponto que chegou. Sempre acreditei que ao realizar as denúncias dos três casos mencionados, seria prontamente chamado a novos esclarecimentos, a um compartilhamento de informações. Qual nada. Houve sim hostilidades sutis, como no caso da MBigucci, quando não total descaso.


 


A promotora Mylene Comploier me convidou apenas uma única vez para prestar informações, depois de insistência minha, por conta de um primeiro e precipitado engavetamento do processo. À apresentação de mais provas e documentos, e de novo engavetamento, simplesmente me ignorou. Mesmo depois de lhe enviar 123 mil caracteres do pacote final de matérias que tipificam o crime cometido em São Bernardo – tudo consubstanciado por provas materiais.


 


Não é esse Ministério Público insensível a informações que a sociedade deseja como instrumento de construção de contraditórios que favoreçam decisões do Judiciário. Esse Ministério Público que conheço na Província do Grande ABC, fortemente contaminado pelo caso Celso Daniel, não é o exemplo que me leva a estimular uma de minhas filhas, estudante de Direito, a ingressar na carreira. O MP que aprecio e que coloco como meta para que ela tenha um objetivo de responsabilidade social é o MP que coleciona ações para desbaratar quadrilhas de colarinho branco, de empreiteiras, de emendas parlamentares, de tudo o que a sociedade aprecia como ancoradouro de esperança, principalmente no combate à metástase de setores públicos sempre em conluio com quadrilhas de espertalhões da iniciativa privada.


 


Vou remeter cópias deste texto a variadas instâncias do Ministério Público porque não posso acreditar que seja apenas uma coincidência a inaptidão investigativa dos casos relacionados, principalmente porque, como jornalista que não se contenta com apenas transcrever declarações nem sempre confiáveis de terceiros, fui a fundo no trabalho de campo entre outros motivos porque não engano os leitores e tampouco me satisfaço com superficialidades.


 


Dou de ombros a todos que, por conta do caso Celso Daniel, me relacionam ao petismo, ou àqueles que, por conta dos desdobramentos do escândalo da Cidade Pirelli, um projeto concebido por Celso Daniel e do qual o PT de João Avamileno e o PTB de Aidan Ravin jamais opuseram resistência à degringolada de obscuridades e irregularidades, me chamam de direitista.


 


Não acredito sinceramente que esteja a ver fantasmas sobre a retaliação que tenho sofrido de alguns integrantes do Ministério Público da região. Nada que uma corregedoria longe dos tentáculos da Província do Grande ABC não possa avaliar. Quem se habilitará em proporcionar esse direito inalienável a quem quer apenas continuar a prestar serviço de interesse público, essência do jornalismo?


 


Esse é um desabafo que pode contribuir para desanuviar o ambiente mas que também tem uma carga de potencialização de hostilidades. É melhor correr o risco do que manter-me em silêncio, um silêncio que representa ônus para os consumidores de informações. Peço sempre a Deus que entre tirar-me a vida e me sonegar a coragem, que execute a primeira alternativa.


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