Economia

IBGE dimensiona as perdas
do nosso setor automotivo

DANIEL LIMA - 03/07/2002

Conseguimos do IBGE documento que, se não preenche todas as necessidades de desvendar minúcias da economia do Grande ABC, pelo menos nos alimenta com mais informações. Na esteira da queda de participação relativa e absoluta da Capital paulista e do Grande ABC na Pesquisa Industrial Anual do IBGE, dispomos de algumas informações adicionais que simplesmente revelam parte do tamanho do rombo que a descentralização industrial provocou na economia da Grande São Paulo, principalmente no Grande ABC.


 


Todos sabem que somos alimentados historicamente pelo setor automotivo. Então, vejam só o relato do documento que recebi daquele organismo ligado ao Ministério do Planejamento, cujo conteúdo se refere ao comportamento de alguns setores industriais (justamente os mais representativos do Grande ABC) no período de 1985 a 2000 no Brasil:


 


 Das desconcentrações concentradas, destaca-se a fabricação e montagem de veículos automotores. Alvo primordial da guerra de incentivos fiscais travada por Estados para atrair investimentos, dado os seus efeitos de encadeamento, algumas novas inversões em plantas foram realizadas fora de São Paulo, levando à redução de 17,9 pontos percentuais desta atividade no Estado. Esta perda foi distribuída da seguinte forma: ganhos de 6,4; 2,6; 5,1; e 2,3 pontos percentuais para Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul, respectivamente. Com relação às máquinas e equipamentos, o decréscimo de 12,7 pontos percentuais em São Paulo direcionou-se essencialmente para o segundo parque fabril desse ramo, ou seja, o Sul. Este foi também o movimento no ramo de artigos de borracha e plástico. Sobre máquinas e materiais elétricos, pode-se dizer que houve perda generalizada em favor de Minas Gerais e do Sul do País.


 


O relatório do IBGE só não é mais preocupante porque não separa territorialmente as perdas relativas e absolutas do Estado de São Paulo no período de 1985 a 2000. Se faltam números mais aprofundados, sobram conceitos porque, se boa parte da riqueza industrial da Grande São Paulo (sobretudo de São Paulo e mais ainda do Grande ABC) deslocou-se para o Interior do Estado, e se a média de perdas dos paulistas expressa pelo relatório é elevadíssima em toda a cadeia automotiva mencionada, está na cara que não é por acaso que a Capital e os sete municípios do Grande ABC, que formam a chamada microrregião de São Paulo, definida pelo IBGE, caíram de 26,8% para 13,9% de participação relativa no bolo nacional de produção industrial.


 


Convém lembrar que o conceito de "pontos percentuais" nem sempre dá a dimensão das perdas. Para aqueles que eventualmente não dominam a diferença entre "pontos percentuais" e "percentagem", damos apenas um exemplo: quem tinha 10% e fica com 5% de um determinado mercado, perde cinco pontos percentuais, mas 50% de participação.


 


Tombo de 67%


 


O tombo da Capital e dos sete municípios do Grande ABC na riqueza industrial vasculhada pelo IBGE é espantoso. A combinação de queda relativa e queda absoluta é inexorável quando se tem os seguintes números: em 1970, São Paulo, Santo André, São Bernardo, São Caetano, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra participavam com 42,2% do valor de produção industrial do País. Trinta e dois anos depois, caíram para 13,9%. Ou seja: 28,3 pontos percentuais a menos, ou um tombo de 67%. Traduzindo ainda mais: de cada R$ 100 de riqueza industrial produzida nos oito municípios em 1970, quando o Brasil tinha 70 milhões de habitantes, R$ 42,20 eram gerados na Capital e no Grande ABC. Agora, com o Brasil de 170 milhões, os mesmos oito municípios geram apenas R$ 13,90. Queda relativa significa perda decorrente do crescimento de outros municípios do País. Queda absoluta significa menor produção mesmo. São Paulo e Grande ABC sofrem dos dois males e ainda não encontraram maneira de estancar os desdobramentos da ensandecida quebra de qualidade de vida decorrente desses fatores.


 


É ou não é necessário formatar urgentemente uma nova Grande São Paulo?


 


Por falar em Grande São Paulo, é impossível deixar de lembrar do Estado da Grande São Paulo, tema de Reportagem de Capa de LivreMercado, recentemente. O jornalista Gilberto Dimenstein, em sua coluna domingueira na Folha de S. Paulo, voltou a falar do assunto nesta semana. Vejam o que ele escreveu:


 


 Da primeira vez que ouvi a idéia de transformar a Região Metropolitana de São Paulo em Estado, com governo e bancada federal, considerei-a estranha, quase tresloucada. Mas a idéia faz sentido. A Grande São Paulo tem problemas tão complexos e tão graves, que alteram tanto a vida de tanta gente e vendem a imagem de um país caótico, que até mereceria ter seu próprio governador, identificado até o fundo da alma com a temática metropolitana. Definitivamente, é um absurdo deixar o centro financeiro, econômico e intelectual do País na condição de vítima de tamanha vulnerabilidade  -- escreveu Dimenstein.


 


Apenas dois adendos: a) o jornalista teve humildade para reconhecer que se precipitou na avaliação, algo que o deputado federal Duílio Pisaneschi está devendo, ou estará devendo, se conseguir entender o projeto ao qual respondeu, à revista LivreMercado, com desmesurado desinteresse e sarcasmo. b) A ótica do jornalista da Folha contempla prioritariamente a cidade de São Paulo, aonde vive, enquanto nosso foco está na Região Metropolitana como um todo. Se o Estado da Grande São Paulo mirar apenas nos olhos lindos da Cinderela paulistana, a emenda do gataborralheirismo tende a ser pior do que o soneto da desintegração regional.


 


Ainda viverei para ver jornalistas da região que, como o deputado Duílio Pisaneschi e tantos outros, desdenharam a proposta do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial e terão, mais dia, menos dia, de reconhecer que o arcabouço constitucional da Grande São Paulo é um convite à hecatombe.


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