Economia

Grande ABC perde para Estado
e Brasil em emprego industrial

DANIEL LIMA - 20/07/2010

Nos últimos 30 meses, período no qual a indústria automotiva bombou para valer, estimulada também pela política fiscal anticíclica do governo Lula da Silva, o Grande ABC seguiu emitindo sinais de esgotamento do veio industrial como sinônimo de emprego formal. Quem não levar em conta essa equação corre o risco de morrer de inanição mental. Emprego industrial formal é o que mais se leva em conta no tabuleiro da baiana de uma economia emergente como a do Brasil, para equilibrar o jogo de investimentos tecnológicos. Quando mais se distanciarem indicadores de produtividade e de emprego, mais esparadrapos sociais deverão ser aplicados no futuro. O Grande ABC já conhece essa operação e os resultados não são nada agradáveis.


Quem detém carteira profissional assinada conta com direitos intocáveis e salários comprovadamente maiores. Pelo menos, em média, 50% acima dos empregos das demais atividades.


Quem cai na informalidade precisa rezar. Os vencimentos dependem de tantos fatores que só existe uma certeza ao final de cada mês: o salário do empregado informal e os vencimentos do empreendedor informal geralmente perdem a corrida para o calendário gregoriano, porque não dão conta do recado das obrigações que religiosamente batem à porta a cada 30 dias.


Pois no período de 30 meses que acabo de levantar, o Grande ABC só apresenta números menos insatisfatórios que a também desindustrializada Grande São Paulo. Quando a comparação abrange o Estado de São Paulo e também o Brasil, considerando-se a massa de empregos de todos os setores, perdemos de goleada. Geramos 31% empregos industriais acima da média do universo de empregos formais de todos os setores registrados na Grande São Paulo, mas estamos 30,49% abaixo do Estado de São Paulo e 34,31% abaixo do Brasil.


Todo o estardalhaço que a imprensa faz mais de uma vez por mês quando anuncia balanço de empregos criados e eliminados é resultado de números verdadeiros, mas em estado bruto. Não se levam em conta especificidades econômicas do emprego industrial, ainda o carro-chefe da qualidade de vida na maioria dos municípios brasileiros. Excluem-se dessa situação as capitais que contam com atividades de valor agregado além da indústria, como São Paulo em várias modalidades de serviços financeiros, de hotelaria, de marketing, de publicidade e propaganda, entre outros.


De maneira geral, os balanços de empregos são contabilizados sem distinção. Como os setores de serviços e de comércio representam mais de 70% da demanda por emprego formal, e essas atividades pagam salários muito aquém da atividade industrial, sem a contrapartida do conjunto de benefícios sociais, naturalmente retroalimenta-se quadro de baixíssima mobilidade social.


Nada mais complicado. Nos anos 1990 o Grande ABC sofreu duros castigos macroeconômicos e foi condenado a frequentar o inferno da interrupção — quando não da recaída — do fenômeno econômico de miserável virar pobre, de pobre virar classe média baixa, de classe média baixa virar classe média média e de classe média média sonhar em ficar relativamente rica.


Antes dos anos 1990 de abertura insana do setor industrial o Grande ABC era o paraíso da ascensão social. Desenvolveu, por isso mesmo, principalmente, uma classe média baixa que não se encontra de forma tão densa na maioria dos municípios do cinturão da Região Metropolitana de São Paulo, áreas de baixa empregabilidade.


Movido à indústria automotiva, o Grande ABC nadou de braçadas com as bênçãos do Estado dirigista que cercava o touro da competitividade com alíquotas alfandegárias protetoras de ineficiências. Até que o mundo se globalizou e Fernando Collor de Mello e, em seguida, principalmente, Fernando Henrique Cardoso, botaram fogo no paiol da acomodação mais que vantajosa.


Entregou-se de bandeja, entre outros setores, a indústria de autopeças, tomada de assalto pelo capital internacional. Como se já não bastasse a guerra fiscal para asfixiar pequenos e médios industriais da região, assediados ao longo de duas décadas pelo movimento sindical.


Depois da tempestade trabalhista interna veio, portanto, o vendaval econômico externo. Mais que isso: o segundo desastre não deixou de herança as vantagens do primeiro em forma de maior respeitabilidade e valorização da classe trabalhadora.


No máximo, principalmente no governo Fernando Henrique Cardoso, implementou-se saudável concorrência internacional por preço e qualidade. Esqueceu-se FHC que a terapia foi radical, porque extremamente abrupta ao enfileirar cadáveres empresariais em proporções gigantescas.


O Grande ABC foi retirado do freezer do protecionismo nacionalista e atirado ao forno da competitividade internacional sem passar, como indicam os maiores especialistas, por gradualismo alimentado por financiamento à atualização tecnológica e de gestão. Não se permitiu o direito de os empresários se adaptarem ao ambiente selvagem da globalização.


Vamos agora aos números do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) do Ministério do Trabalho, espécie de Bíblia da atividade trabalhista no País. Desde janeiro de 2008, temporada em que o PIB brasileiro cresceu 5,1%, até junho deste ano, de forte recuperação econômica após um 2009 em que o PIB regrediu 0,2%, o saldo de empregos industriais no Grande ABC é de apenas 4.968 postos. A Região Metropolitana de São Paulo, incluindo os sete municípios do Grande ABC, gerou 46.605 empregos formais. O Estado de São Paulo registrou 189.859 e o Brasil chegou a 583.688.


A participação relativa do emprego industrial do Grande ABC na Grande São Paulo é de 10,66%, contra 2,61% no Estado de São Paulo e 0,85% no Brasil. Só para efeito de comparação, a participação do PIB do Grande ABC na Grande São Paulo é de perto de 20%, contra 8% no Estado de São Paulo e 1,4% no Brasil. Observa-se, portanto, que o nível de emprego industrial formal da região perde em todas as disputas. Embora interessante, esse tipo de comparação não é relevante, porque na grande maioria dos municípios o PIB avança relativamente mais que o índice de emprego. Isso se chama produtividade.


O que deve provocar urticária é quando se comparam os empregos industriais gerados no Grande ABC com aquelas três áreas geográficas tendo como referência o total de empregos formais em todas as atividades econômicas. Nesse caso, o Grande ABC só supera a Grande São Paulo. O emprego industrial representa 6,74% do estoque em todas as atividades na Grande São Paulo no período de 30 meses, contra 9,78% no Grande ABC, 14,07% no Estado de São Paulo e 14,89% do Brasil.


Vejam que a participação relativa do emprego industrial no Brasil como um todo e nas áreas geográficas apontadas é bastante discreta. Ganhamos do Primeiro Mundo, com certeza, mas estamos em defasagem diante de outros emergentes. Os números do Grande ABC, que nos anos 1960 e 1970 contava com indústria poderosa, são inquietantes. De cada 10 empregos formais que se criam aqui, não chega a um na atividade industrial. Os demais são de comércio, serviços, administração pública, construção civil e outros.


Como ainda dependemos demais do setor industrial para gerar riqueza, essa numeralha não combina com recentes acessos de grandiosidade da economia do Grande ABC. Os triunfalistas não perdem oportunidade para urrar. Eles sempre acham que só têm a ganhar ao propagar ilusões.


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