A indústria paulista continua comendo poeira no ranking nacional. Faltam números absolutos na divulgação do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mas mesmo a numeralha relativa não impede que se chegue à conclusão que o Estado de São Paulo é a unidade do País que mais perdeu força na indústria de transformação no período da pesquisa, entre 1995 e 2007.
Provavelmente os jornais de amanhã, assim como os sites de hoje, não mergulharão nos meandros das mudanças. Preferirão a generalidade do PIB (Produto Interno Bruto) que, além da indústria de transformação, envolve agropecuária e serviços. De fato, são três campeonatos em disputa na formação do PIB. O resultado final e geral esconde armadilhas individuais que precisam ser observadas atentamente.
A Capital dos paulistas diminuiu o impacto da quebra industrial por conta da alta concentração de atividades de serviços, principalmente financeiros. Por isso o PIB do Estado de São Paulo perdeu apenas 3,4 pontos percentuais, ou 7,25% na contagem geral.
A queda industrial dos paulistas alcança nove pontos percentuais (9pp). Caímos de participação de 44,4% para 35,4% no período. Nove pontos percentuais não têm o impacto de compreensão da perda relativa. O mais indicado, portanto, é traduzir o rebaixamento em termos percentuais. Foram 20,27% para a cucuia.
A submersão industrial paulista nos 12 anos pesquisados pelo IBGE provocou o emparelhamento na disputa interna pela liderança econômica. Se em 1995 a indústria de transformação paulista liderava internamente o PIB nacional com folga de 44,4%, contra 35,6% de serviços e 10,4% da agropecuária, no extremo oposto do trabalho do IBGE um empate técnico se cristalizou com os 35,4% da indústria de transformação e os 34,1% dos serviços. A agropecuária chegou a 11,8%.
Nenhuma unidade nacional perdeu tanta musculatura industrial quanto São Paulo. Aliás, poucas unidades perderam força industrial. Apenas Rio Grande do Sul e Pernambuco constam da lista — e mesmo assim residualmente. Alguns outros Estados, de participação geral ínfima, ao menos conseguiram empatar o jogo.
É uma pena que o IBGE ainda não reúna dados municipais, porque é muito maior o rombo do Grande ABC nesse espaço de tempo que abrange quase todo o período presidencial de Fernando Henrique Cardoso e o primeiro ano bastante discreto do governo Lula da Silva.
Já escrevi trocentas matérias sobre o comportamento da economia paulista. Já cansei de afirmar que o governo do Estado, coincidentemente sob a mesma agremiação partidária no período, não tem vocação desenvolvista como apregoa. Há quem confunda desenvolvimentismo com fiscalismo. A substituição tributária está aí vivíssima para comprovar. Não há nada equivalente no campo de apoio econômico. O empresariado de pequeno e médio porte, principalmente, pena um bocado.
À parte a qualificação de gestor público do governador José Serra, qualificação que supera com folga o antecessor Geraldo Bom de Voto Alckmin, acordar a cada manhã com um pé no acelerador de incentivos à produção e o outro em práticas de planejamento estratégico não é decisão automática. Vai muito de ideologia, de conhecimento, de sensibilidade, de vocação.
E os governadores que passaram menos remotamente pelo Palácio dos Bandeirantes, Mário Covas incluído, jamais tiveram visão prospectiva no campo econômico. Deitaram na cama da liderança econômica paulista. Enquanto isso, a guerra fiscal, o envelhecimento das matrizes industriais e as chamadas deseconomias de escala da Grande São Paulo impulsionaram deslocamentos e novos investimentos tanto em direção ao Interior do Estado como a outras unidades da Federação.
Aliás, não fosse o Interior paulista muito mais agressivo e decidido a atrair investimentos, num processo generalizado que envolve prefeituras e lideranças empresariais e sindicais, a fragilização contínua da indústria paulista seria muito mais preocupante.
Escrevo sem recorrer a qualquer uma das muitas pastas de arquivo. A derrocada paulista é um piano desafinado há muito tempo e não se limita ao PIB. No Índice de Potencial de Consumo que a Target divulga todos os anos, o embicamento econômico não chega a provocar traumas como os desastres aéreos, mas os estragos são muito mais extensos e profundos.
A queda relativa da liderança econômica de um Estado em relação aos demais ou de um País no confronto com economias competitivas não é o fim do mundo. Os números relativos podem esconder até mesmo crescimento absoluto. Basta analisar o caso do Brasil nos últimos anos. Avançamos mais que muitos países do Primeiro Mundo, mas perdemos a corrida para asiáticos.
Ganhar de quem já tem economia madura e consolidada tem o mesmo sentido que disputar apenas os últimos 100 metros de uma corrida de 10 quilômetros. O estardalhaço tem certa dose de triunfalismo. Perder a disputa para países ainda menos desenvolvidos é como correr os 10 quilômetros contra quem entrou na raia apenas nos 100 metros finais. Os reparos têm certa dose de hostilidade eleitoral.
Já a situação dos paulistas ao longo das duas últimas décadas, acentuada com a chegada do Plano Real e o fim da ciranda financeira, e também com o ponto final do enclausuramento dos portos, é diferente. O Estado de São Paulo está perdendo o jogo em números absolutos e em números relativos. Desindustrializa-se em relação aos demais Estados num País que também sofre processo de desindustrialização senão em números absolutos, garantidamente nos relativos. Tanto que commodities tornaram-se queridinhas da balança comercial.
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12/11/2024 SETE CIDADES E SETE SOLUÇÕES