Deixei para amanhã (terça-feira) uma nova análise que produzi ontem (domingo) como ombudsman não autorizado dos jornais da região. Quero mesmo é fazer suspense. O que os leitores vão encontrar será uma hecatombe jornalística. Fico a me perguntar como o Diário do Grande ABC e o Diário Regional (que circulam diariamente) e também os sites noticiosos de veículos de comunicam que circulam como impressos com menos intensidade periódica na região chegam ao ponto de não enxergarem o elefante de manchetíssima que deixaram escapar do zoológico da gravidade econômica.
Manchetíssima é a manchete das manchetes da primeira página. Primeira página é o showroom editorial de um jornal. Quando se eleva determinado assunto à manchetíssima, das duas uma: ou há um conjunto de informações que vão atingir em cheio a sensibilidade e os interesses dos leitores ou o jornal que veiculou a manchetíssima não se preparou para a manchetíssima com um mínimo de organização editorial e transforma aquele espaço em terra arrasada. Quando se deixa de lado uma manchetíssima mais que esperada, praticamente obrigatória, a vaca do planejamento editorial foi para o brejo porque nenhuma daquelas situações foi sequer aventada. É o elefante que escapa à vigilância.
Quem quer conhecer para valer a qualidade de um jornal deve ficar atento às manchetíssimas. As manchetíssimas estão para os jornais assim como o sucesso de um templo à pregação do religioso de plantão. Quando a mensagem não agrada, a debandada é automática.
Apagão completo
Pois a edição do Diário do Grande ABC e a edição da mesma data do Diário Regional às quais me refiro pautaram-se pela ineficiência, pelo descaso e pela barbeiragem. Nada do que foi noticiado nos dois jornais naquele dia tem a menor importância perto da manchetíssima que deixaram escapulir pelos vãos dos dedos da oportunidade especial. Um dos dois jornais, pior ainda, simplesmente não publicou em página interna uma linha sobre o assunto que dominou a mídia nacional mas que tem forte vinculação regional. O outro jornal foi menos sofrível, mas não menos empobrecido ao dar apenas um registro em pé de página.
Fosse exceção a uma regra geral de bom comportamento editorial, o buraco negro da manchetíssima esquecida seria perdoável. Pena que o problema é estrutural. Os mesmos jornais locais que enaltecem o fato de a Província ser a quinta colocada no ranking nacional de potencial de consumo (alguns jornais ainda publicam que somos a terceira, desconhecendo nosso calvário industrial) simplesmente reservam à Editoria de Economia um quartinho de despejos de prioridades informativas.
Problema antigo
Aliás, não é de hoje que, principalmente o Diário do Grande ABC, despreza a produção intensa e qualitativa de notícias econômicas locais. Raros foram os ciclos em que a publicação voltou os olhos para valer à atividade. Na primeira experiência que tive em cargo de comando no Diário do Grande ABC, fora a Editoria de Esportes que dirigi por muitos anos na década de 1970, encontrei a Editoria de Economia com apenas uma jornalista. Era o começo dos anos 1980. O PIB da região era uma sucessão de recordes. Fiquei dois anos no cargo e deixei a equipe com sete profissionais especializados.
Até o jornalista Marcos Piquini, setorista de sindical, agregado ao que hoje se chama SeteCidades, foi incorporado ao grupo. Nada mais elementar, convenhamos. Sindicalismo nesta Província e em qualquer lugar do mundo que se preze é atividade econômica. Se bem que também poderia ser política. E de vez em quando criminal.
A tradição do Diário do Grande ABC como jornal voltado preferencialmente ao campo político reproduz o perfil da maioria dos jornais de pequeno e médio porte. Os grandalhões também priorizam os administradores públicos e os legisladores, mas o fazem com mais engenhosidade. Não ficam reféns das fontes de informações geralmente relacionadas a interesses econômicos das publicações.
Muito do sucesso editorial da revista LivreMercado que criei em 1990 e dirigi até dezembro de 2008 (as áreas administrativa, financeira e comercial eram de responsabilidades dos sócios que me reservaram o destino e a necessidade) se deveu principalmente a duas realidades conjugadas: paixão pelo desenvolvimento econômico da Província do Grande ABC, que se acoplou ao entusiasmo com que sempre me lancei à área esportiva, e o vácuo na cobertura econômica principalmente do Diário do Grande ABC, então o jornal soberano da região. O jornal praticamente se omitia sobre o contexto regional vivido por empresas, comércio e serviços, quando não se mantinha preso aos interesses cruzados dos mandachuvas e mandachuvinhas de então.
Densidade triunfalista
O período mais estável e denso do Diário do Grande ABC na Editoria de Economia se deu durante a gestão dupla de Fausto Polesi e Alexandre Polesi, antes que rusgas internas os levassem a deixar a publicação. O erro editorial do Diário naquele período (meados dos anos 1990) foi cair na besteira de dourar a pílula. A campanha “Meu Grande ABC”, que pretendia elevar a autoestima da população da região, descambou a um triunfalismo econômico que explica o sucesso de LivreMercado: remamos em direção contrária ao oba-oba sempre doutrinário a oportunistas sociais de todos os matizes em busca de camaradagem do jornal. O tempo, senhor da razão, foi implacável com os pecadores.
A manchetíssima sonegada aos leitores do Diário do Grande ABC e do Diário Regional na data que vou revelar neste espaço terça-feira é um lugar-comum de improdutividade do jornalismo regional quando o assunto é Economia. Faltam especialistas, falta cultura informativa, falta tudo. E depois ainda sou obrigado a ler em entusiásticos editoriais do Diário do Grande ABC, como tenho lido ultimamente, que aquela publicação tem compromisso com o destino econômico da região.
Justamente o Diário do Grande ABC que ao longo dos anos sonegou dados, informações, pesquisas e tudo o mais sobre a desindustrialização regional, e não exerce uma política editorial crítica aos inúteis ocupantes de espaços no Poder Público, em entidades de classe de trabalhadores e de empresários. Aliás, uma das razões que levaram LivreMercado e Diário do Grande ABC, associados em 1997, a romperem relacionamento editorial.
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