O Diário do Grande ABC age corretamente ao explorar ao máximo a entrevista concedida nos estúdios da versão de TV virtual por Luiz Marinho então em campanha eleitoral à reeleição de 2012. A iniciativa, com direito a chamada numa das páginas de ontem da Editoria de Política do jornal, bem como destacada na primeira página da publicação em plataforma digital, mostra o quanto oportunista foi a intervenção do prefeito ao se referir à pesquisa do braço estatístico do jornal. Marinho citou, em 2012, elogiosamente o trabalho daquele instituto. Pena que o outro lado da entrevista não tenha sido destacado – e jamais o seria.
O editor-chefe Sérgio Vieira proporciona à audiência a expressão mais bem acabada de levantamento de bola para o entrevistado marcar quantos gols quiser. Naquele período consta que o Diário do Grande ABC voltava a manter relações amistosas com o prefeito que um dia foi ministro de duas pastas do governo Lula da Silva.
Marinho jamais perderia a oportunidade de aproveitar uma situação tão a caráter para exercer o lado reconhecidamente unilateral de relações com a mídia; ou seja, jamais ser inquerido de forma que o colocasse de saia justa. O tom excessivamente diplomático do entrevistador e a sequência de amenidades em forma de indagações centralizadas no ponto forte da gestão petista foram carvão na fornalha para que a locomotiva verbal de Marinho ganhasse ritmo de trem-bala.
Infraestrutura sob controle
O ponto forte de Marinho é o perfil de operário que exala em cada resposta. Ele conhece bem a infraestrutura de São Bernardo, sobre a qual fez explanações reconhecidamente fundamentadas. As perguntas foram o melhor palanque de que o então candidato à reeleição poderia esperar. Provavelmente o ambiente da entrevista pré-acertada não comportaria indelicadezas que o Diário do Grande ABC publicou em forma de denúncias em períodos anteriores. A CPI da Petrobrás, combinadíssima conforme a revista Veja, é uma extensão de um modus-operandi que também envolve a mídia.
Quem está acostumado a entrevistas de verdade, dessas que são elevadas ao panteão do jornalismo independente, não consideraria aquele bate papo entre Sérgio Vieira e Luiz Marinho qualquer coisa que possa ser rotulada de questionamento. O jornalista toma todos os cuidados possíveis para deixar o prefeito Luiz Marinho em permanente posição de conforto. Nada que de fato incomodasse o mandatário petista foi sequer repassado com o ar grave que um trabalho jornalístico deve impor.
Marinho se sentiu em casa. Até porque, se não se sentisse, não teria comparecido ao estúdio da TV DGABC. O hábito de sentar-se à mesa de negociações trabalhistas contando com as costas largas de trabalhadores prontos a entrar em greve faz o monge da impaciência ao lidar com a imprensa independente.
Nariz compensador?
Avesso ao contraditório, a ponto de carregar um exército de seguranças em encontros que possam lhe dar dores de cabeça, sobretudo quando a situação tende a descambar à exacerbação, Luiz Marinho é um gestor público democrata por excelência, desde que não seja contrariado. A arrogância que inclusive os petistas confirmam, porque lidam com o prefeito no dia a dia, é marca registrada. Dizem que procura compensar com o nariz arrebitado os centímetros que lhe faltam na estatura física.
A entrevista à TV DGABC que incrimina o prefeito de São Bernardo na questão relativa à pesquisa eleitoral daquela campanha à Prefeitura de São Bernardo é espertamente utilizada agora pelo Diário do Grande ABC para desclassificar a nova postura do prefeito que, insatisfeito com os números de recentes sondagens sobre o nível de aprovação de sua administração, desclassificou o instituto que leva o nome da publicação.
A reação do jornal, convenhamos, é bastante oportuna e inteligente. Tão inteligente que desdenha da contrapartida reflexiva que apresentei segunda-feira: o fato de Marinho ter avalizado as pesquisas de 2012 não garante a eficiência estatística do trabalho ante a nova situação que se apresentou. No fundo, o que separa o Luiz Marinho daquela pesquisa de 2012 do Luiz Marinho da pesquisa deste ano é que houve distanciamento nas relações com o Diário do Grande ABC.
O diálogo entre Diário do Grande ABC e Luiz Marinho foi interrompido há muito tempo. Aliás, ao longo de quase seis anos de mandatos do petista, os entreveros permaneceram. Os armistícios não passaram de artimanhas.
Falta transparência
Agora que o Diário conseguiu o que queria – ou seja, tornar público que Luiz Marinho navega conforme as ondas que lhe favorecem – bem que poderia mergulhar numa autocrítica interna e jogar limpo com os leitores ao oferecer o máximo de informações sobre o DGABC Pesquisas, esse fantasminha nada camarada que não dá as caras de metodologias e tantos outros apetrechos a ponto de tornar nebulosas as ações junto aos leitores mais exigentes.
A pauta central para o Diário do Grande ABC atender aos reclamos dos leitores mais críticos está configurada na ação que Paulo Skaf encaminhou à Justiça Eleitoral na tentativa de barrar a divulgação dos números da disputa pelo Palácio dos Bandeirantes. Ali estão alinhavados pontos importantes, sobretudo a possibilidade de descaracterização do entendimento que enquadrava a cronologia das questões num campo aberto de desconfiança viciadora do resultado final.
Sem contar que aquele instituto de pesquisas poderia explicar como é possível ter-se o mesmo peso de margem de erro, de cinco pontos percentuais, levando-se em conta que foram efetivadas 400 entrevistas em cada um dos sete municípios da região. Essa homogeneidade não encontra respaldo científico dado. Há perfeita confluência entre a representatividade do eleitorado pesquisado e a margem de erro para enquadrar o conceito de confiabilidade nos resultados.
Total de 1884 matérias | Página 1
13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)