O Diário do Grande ABC voltou a errar na mão ao escolher a manchetíssima de primeira página desta sexta-feira. Desta vez, deixou escapar dois elefantes opcionais. Optou por um lambari. De zero a 10 a nota ao trabalho jornalístico é zero. Não fosse transformada em manchetíssima, a nota seria menos cáustica. Esta é minha sexta intervenção como ombudsman não autorizado dos veículos de comunicação da Província do Grande ABC.
É o fim da picada elevar à manchetíssima (manchete das manchetes de primeira página) a decisão de expansão territorial de uma universidade municipal, no caso a USCS de São Caetano. Pior ainda quando a escolha deprecia o valor de ao menos dois fatos muito mais relevantes, um dos quais publicado sem destaque algum de primeira página.
Até parece que os editores do Diário do Grande ABC têm recomendações para errar sempre quando se trata de escolher a manchetíssima. A quem caberia a palavra final sobre o que deve ocupar o posto tecnicamente mais privilegiado da capa do jornal?
É uma escolha com mais peso individual ou coletivo? Haveria algum processo, sob controle rígido, durante o qual se aperfeiçoariam as linhas de produção de potenciais manchetíssimas? Duvido, duvido e duvido.
As manchetíssimas antecedentes já analisadas dão conta de que tudo é levado a cabo sem cuidados essenciais. Provavelmente por conta de escassez de recursos humanos.
Convém ressaltar que, mesmo errando, o Diário do Grande ABC poderia ter acertado na definição da manchetíssima desta sexta-feira. Antes de explicar o que parece contradição, reporto-me à manchetíssima publicada (“USCS planeja campus na Capital”) e a alguns trechos da matéria da página interna:
A USCS (Universidade Municipal de São Caetano) tem planos de expandir suas atividades para a Capital a partir de 2015. O terceiro campus da instituição de ensino, o primeiro fora da cidade, será na Avenida Paulista, na região do bairro Bela Vista, e abrigará inicialmente cinco cursos de graduação. Em entrevista ao Diário, o reitor Marcos Sidnei Bassi destaca que a novidade ainda precisa ser aprovada pelos dois órgãos da instituição de ensino (...). “A partir disso daremos início aos trâmites burocráticos para efetivar o aluguel do prédio”, diz. A intenção do reitor é que as 640 vagas, destinadas aos cursos de Tecnologia, Tecnologia em Recursos Humanos, Gestão Empresarial, Administração e Direito, sejam disponibilizadas para o vestibular de 2015.
Como se prepara?
Mais sobre a notícia do Diário do Grande ABC não é preciso reproduzir. A reportagem mantém-se na superfície. Não faz qualquer incursão sobre as condições econômico-financeiras da universidade, a relação de dependência orçamentária dos cofres públicos, os custos que a iniciativa representa ao conjunto da obra de custeio com pessoal, os níveis de subvenção e tudo o mais. Até parece que a USCS é uma escola privada.
Até imagino que a manchetíssima tenha sido escolhida porque demarcaria ação que combateria o que chamo de Complexo de Gata Borralheira da Província do Grande ABC em relação à Cinderela Capital. Escrevi em 2002 um livro sobre o tema. A medida editorial teria sido interessante se a reportagem fosse completa e demonstrasse com sobras que a decisão da USCS é um golpe de mestre em gestão educacional. Inclusive com reflexos financeiros positivos. Nada disso a reportagem comporta.
Primeiro elefante
Muito mais manchetíssima teria sido a visita da presidente da General Motors ao Palácio do Planalto para anunciar que a corporação norte-americana prepara-se para novo ciclo de investimentos no País, agora de R$ 6,5 bilhões. A sede brasileira e uma das unidades fabris da multinacional de veículos estão em São Caetano.
Embora a dirigente da multinacional não tenha detalhado os valores a investir nas respectivas unidades, o material publicado por toda a mídia é intenso em informações que poderiam ser regionalizadas porque certamente virá dinheiro para São Caetano e inclusive às autopeças locais que abastecem a General Motors. Um programa federal de nacionalização de peças está remexendo com a engenharia de suprimento das empresas.
Não vou me estender sobre a pauta perdida com os desdobramentos locais das declarações da presidente da General Motors. O que posso assegurar é que haveria um conjunto tão vasto de informações a repassar aos leitores que a manchetíssima da universidade pública de São Caetano viraria pó, mesmo se produzida com mais qualidade. Não há termos de comparação entre o impacto regional de uma escola que invade a Capital e uma multinacional do setor que é tudo para a Província aprofundar negócios em São Caetano.
Segundo elefante
Para completar a sexta-feira que poderia ser 13 de agosto para o Diário do Grande ABC, jogou-se na lata do lixo em forma de discreta manchete, que também poderia ser manchetíssima, o grau de risco em que se transformou o mercado de trabalho no setor de transformação industrial na Província do Grande ABC.
O Diário do Grande ABC informa com base em dados do Ciesp que foram destruídos em média por dia nada menos que 53 empregos do setor nos últimos 12 meses na região. Como virou rotina o chamamento do Ciesp para balanços mensais do mercado de trabalho, a manchetíssima seria mais que potencialmente bem trabalhada em forma de enriquecimento do urânio de dados.
Infelizmente, o que prevalece na maioria dos casos das manchetíssimas do Diário do Grande ABC é um desprezo olímpico às informações com valor agregado. Se é assim com a matéria principal de cada edição, imaginem com as demais!
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)