Vasculhei todos os arquivos do Ministério do Trabalho e Emprego depois de o Diário Regional ter dado em manchetíssima de primeira página que a Província do Grande ABC criou mais de 20 mil empregos formais no ano passado – 15 mil dos quais no setor industrial. Prepararia a matéria com vagar, porque há outros assuntos mais candentes. Entretanto, como o Diário do Grande ABC, na edição de hoje, seguiu o mesmo rumo, não vou adiar mais: escrevo amanhã sobre as bobagens estatísticas que lubrificaram artificialmente o universo de trabalhadores na região na temporada passada.
O reparo se faz mais que necessário. Há tanta discrepância entre os fatos e as versões, sendo que os fatos respaldados por estatísticas, que os dois jornais podem levar muita gente a acreditar que a Província do Grande ABC se salvou no ano passado da continuada quebra de produção industrial e do rebaixamento do universo de trabalhadores do setor de transformação do produto.
Tanto o Diário Regional quanto o Diário do Grande ABC criaram a espetacular marca de novos 15 mil postos de trabalho com carteira assinada no setor de transformação industrial da Província do Grande ABC. Verdade verdadeira que publicaram tamanha sandice. Sei que os editores de Economia dos dois jornais vão me execrar. Prefeririam que as aberrações fossem docilmente mantidas como verdades absolutas. O que posso fazer se decidi me dedicar à função de ombudsman não autorizado das publicações da região? Ombudsman é o representante dos leitores e, como tal, não posso transigir. Custe o que custar. Inclusive a antipatia de companheiros de profissão.
Falta remuneração
Se tivesse algum problema de autoestima ou de qualquer outro tipo de relacionamento pessoal e profissional não teria entrado nesse barco furado que é perscrutar o que a Imprensa publica. Jamais trafeguei pelo caminho da ingenuidade ao me travestir de ombudsman. Sabia que a ação seria antipática a alguns, mas providencialíssima aos consumidores de informações. Se os acionistas dos dois jornais fossem mais interessados em melhorar o produto que oferecem ao público, como tantos outros jornais que vivem as durezas de prélios, seria eu remunerado pelo trabalho.
Com o auxílio de minha assessoria fui a fundo em busca dos números inicialmente publicados no Diário Regional. A manchetíssima de quinta-feira passada, 21 de agosto, me deixou atordoado: “ABC criou 25,3 mil vagas em 2013 e estoque subiu 3,13”. Fossem dados apenas dos setores de comércio e de serviços até não espantariam tanto, embora também causassem desconfiança, mas quando se noticiou o saldo positivo de emprego industrial formalizado, cai do andaime. Aonde arrumaram esses dados?
Mais que todo Estado
Fui à luta, pesquisei em horas mortas, no final de semana. Quem me conhece sabe que sou obcecado por informação. Não descanso enquanto não obtenho respostas. O caso Celso Daniel é um dos exemplos de mergulho profundo nas águas de contradições e manipulações. Discorro sobre o assunto horas e horas. Com prazer, se querem saber.
Aos olhos e mentes de alguns, só existe uma explicação ao questionamento sobre as duas matérias: estou completamente louco, alucinado. Mas, como vou provar amanhã, não estou nada equivocado. Se o Diário do Grande ABC copiou o Diário Regional, e isso é possível, o erro é mais grave ainda, porque não teve capacidade de ao menos duvidar dos enunciados extraordinariamente favoráveis a uma economia que, ano passado, como no ano anterior e também neste ano, andava de lado. Vivemos o terceiro ano consecutivo de refluxo econômico.
Para quem ainda duvida da verdade verdadeira, antecipo dois dados: perdemos, segundo o Ministério do Trabalho e do Emprego, 2.237 postos de trabalho no setor de transformação industrial no ano passado, e alcançamos um saldo positivo de 5.371 colocações com carteira assinada quando se contabilizam todos os demais setores.
Os quase 15 mil empregos formais de saldo positivo na indústria de transformação da Província do Grande ABC é algo tão estúpido que o Estado de Santa Catarina, no mesmo período, ou seja, em 2013, liderou a geração de empregos no setor com 20,1 mil postos de trabalho, seguido por Paraná, com 15,1 mil, e Rio Grande do Sul, com 14, 3 mil. O Estado de São Paulo inteiro, inclusive Província do Grande ABC, ficou em quarto lugar com 13,34 mil novos trabalhadores industriais com carteira assinada.
Fico a imaginar a cara dos economistas que a reportagem do Diário do Grande ABC ouviu para explicar o crescimento do emprego industrial – um crescimento fabuloso que não passa de miragem. Eles caíram numa cilada.
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