O PIB (Produto Interno Bruto) continua caindo no Grande ABC. Os mais recentes números do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), que compara o desempenho entre 2003 e 2004, não são o termômetro adequado para entender o estado febril da economia do Grande ABC. Uma nova abordagem histórica de LivreMercado mostra que a situação média da região segue inalterada: entre 1970 e 2004, a participação relativa dos sete municípios no PIB brasileiro caiu praticamente à metade, ou 44,85%. Um tombo considerável que sintetiza a depauperação da classe média, o contingente restrito de ricos e a profusão de pobres e remediados. Em 1970, quando o Brasil conquistou o tricampeonato mundial, o Grande ABC participava com 4,57% do PIB. Em 2004, não passou de 2,52%.
O tamanho do buraco econômico e social da região no período pesquisado por LivreMercado com base em números oficiais do IBGE e também do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), braço de estudos do Ministério do Planejamento, pode ser traduzido da seguinte maneira: de cada US$ 100 que o Brasil produziu de riqueza em produtos e serviços em 1970, US$ 4,57 tinham origem no Grande ABC. Trinta e quatro anos depois, a participação caiu para US$ 2,52.
LivreMercado prefere a longevidade estatística para atestar a situação socioeconômica do Grande ABC. A medição do PIB e análises subsequentes com base na temporalidade escassa de uma temporada, como no caso dos recentes números do IBGE, têm o mesmo efeito terapêutico de um analgésico, que pode diminuir a febre mas não resolve o problema patológico. Buscar no tempo mais longo as armas numéricas que ajudam a compreender o quadro social da região é a prescrição da qual não se deve abrir mão. Por isso, a extensão dos descaminhos e dos sucessos que caracterizam observações atentas sobre o PIB geralmente é desperdiçada pela pressa.
Em resumo, o que se traduz da queda quase pela metade do PIB do Grande ABC quando em confronto com o País é que cada vez mais o chamado G-7 (os sete municípios locais) é menos importante no contexto nacional.
A base de comparação — o ano de 1970 e o pico de 2004 — é ponto não só extremo no tempo mas oposto da dinamicidade econômica do Grande ABC. Naquele início de década a região fervilhava na indústria automotiva. Concentrava grande parcela da produção e já incubava movimento sindical que afrontaria o regime militar e, mais tarde, levaria à Presidência da República um ex-metalúrgico revolucionário. Em meados da primeira década deste novo século o Grande ABC praticamente estabilizou perdas econômicas de desindustrialização contínua dos anos 1990, quando a abertura econômica combinada com a guerra fiscal fratricida, entre vários aspectos, determinou o enfraquecimento regional expresso na perda de mais de um terço da produção industrial e de 82 mil empregos industriais com carteira assinada nos oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso.
Embora tenha reagido desde que Lula da Silva chegou a Brasília, por conta principalmente da escalada de produção da indústria automotiva, os dois primeiros anos do governo petista não alteraram a rota de perdas históricas. Os 44,85% de queda de participação no PIB em 34 anos significa velocidade média de 1,32% ao ano. É verdade que houve melhora em 2004, comparativamente a 2003, mas nem assim se deve descuidar porque o crescimento do PIB em 4,9% naquele ano teve a indústria automotiva como um dos principais setores. Nos dois últimos anos, 2005 e 2006, o PIB nacional perdeu o ímpeto e a média do governo Lula não ultrapassa 2,7% ao ano, contra 2,3% de Fernando Henrique. No ano que vem, quando o PIB de 2005 ganhar as manchetes, o Grande ABC deverá seguir a rota de queda relativa. Uma rotina de 34 anos — mesmo quando eventualmente nesse período apresentou melhora de um ano para outro.
São Bernardo segue na liderança regional do PIB, com participação de 38% de tudo o que é produzido. Dos R$ 44.547.576 registrados pelo Grande ABC em 2004, R$ 16.906.079 foram gerados por São Bernardo. Em 1970, a então chamada capital do automóvel desfilava em quinto lugar no ranking nacional. Caiu para o 12º lugar em 1996 e, apesar de tudo, manteve a posição em 2004. Mas vive situação desconfortável porque sofre assédio direto de Porto Alegre, Camaçari, Fortaleza, Betim, Campinas e Recife. Santo André ocupa a 22ª colocação entre os 100 maiores PIBs do País, São Caetano o 39º, Diadema o 50º lugar e Mauá o 56º na ponta da pesquisa do IBGE.
A situação do Grande ABC no ranking nacional já foi muito melhor. Em 1970, a região era superada apenas por cinco Estados (São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Paraná). Agora em 2004 outros três Estados ultrapassaram a região: Pernambuco, Santa Catarina e Bahia. Os demais Estados e o Distrito Federal seguem atrás, mas, como no caso individual de São Bernardo, há sinais de alerta que indicam que novas ultrapassagens acontecerão: Brasília, Goiás, Ceará, Pará e Amazonas evoluem muito mais na geração de riqueza.
A possibilidade simplista de que o Grande ABC perdeu apenas na disputa relativa com o resto do Brasil entre 1970 e 2004 é argumento possivelmente esgrimido por renitentes contestadores da realidade escarrada em cada esquina de exclusão social. Perder apenas relativamente significaria que no período o Grande ABC teria mantido o tônus de riqueza intocado mas teria sofrido redução de importância nacional por conta de outros territórios mais dinâmicos. Não é esse o caso. Houve carga de perda relativa, mas também de perda absoluta, ou seja, o Grande ABC viu a usina de mobilidade social sustentada principalmente pela indústria evaporar-se em larga margem por conta de evasão e desativação de empresas.
Por habitante
Uma equação que dá com maior precisão o tamanho do rombo do Grande ABC no período de pouco mais de três décadas envolveria o PIB per capita, que consistiria em dividir o valor monetário pela população de 1970 e repetir a operação tendo como fundamento o valor e a população de 2004. Em 1970, o Grande ABC contava com 988 mil habitantes e um PIB de US$ 11,147 bilhões. Resultado: PIB per capita de US$ 11.282. Em 2004 o Grande ABC contava com 2,350 milhões de habitantes e PIB de US$ 15,214 bilhões, tendo como base dólar médio de US$ 2,928. Resultado: PIB per capita de US$ 6.474. Conclusão: a queda nominal de 44,85% não foge do raio de desgaste por habitante quando se coloca no liquidificador social a produção de riqueza dividida pela população — 42,61%. A melhor explicação é que até por volta de 1990, antes portanto da abertura econômica, o Grande ABC conseguiu manter curva ascendente de produção de riqueza em números absolutos, relativos e per capita. Entretanto, as gordurinhas começaram a se esvair nos anos 1990. Desgaste que se acentuou com o confronto amplamente desfavorável de crescimento populacional e refluxo econômico.
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21/11/2024 QUARTO PIB DA METRÓPOLE?