Economia

Sindicalismo vs. FHC

DANIEL LIMA - 31/03/2005

Por mais dados que possam ser lançados, aparentemente é difícil responder à seguinte equação: quem foi o agente mais nocivo à desindustrialização do Grande ABC, o sindicalismo liderado inicialmente por Lula da Silva, agora presidente da República, ou a abertura econômica, sublimada pelo inigualável Fernando Henrique Cardoso?


Ingresso nesse tema com a certeza absoluta de que, sejam quais forem as observações, vai me sobrar chumbo grosso porque esse prato é extremamente indigesto. Porém, não tenho dúvidas de que Fernando Henrique Cardoso é o grande vilão.


Dividindo a trajetória da economia do Grande ABC em duas etapas, entre 1976 e 1989, período que abarca o movimento sindicalista mais bravio, e entre 1990 e 2004, de abertura econômica, nota-se certa semelhança do comportamento do repasse do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), importante medidor da temperatura econômica do Estado. O repasse do ICMS está estruturalmente relacionado ao Valor Adicionado, espécie de PIB (Produto Interno Bruto).


Entre um pouco antes do movimento sindical (1976) até os estertores das estripulias nas fábricas (1989), contando com o aval do mercado fechado, o Grande ABC perdeu 27,21% de participação no ICMS. Tínhamos 14,81% e caímos para 10,78%. No período seguinte, de 1990 (início do processo de rebaixamento de alíquotas alfandegárias) até 2004, caímos de 10,73% para 7,71%, ou seja, 28,14%.


Se contabilizarmos que o primeiro período envolve 13 anos, constataremos que a perda média anual de participação no ICMS do Grande ABC atingiu 2,09%, contra perda anual média de 2,01% do período 1990-2004. Como se observa, quocientes praticamente iguais.


Não faltarão apressados para caracterizar o período sindicalista rivalizador do período de abertura econômica, do qual, insistimos, Fernando Henrique Cardoso foi desastrado gestor. E também não faltarão os que avocarão o sindicalismo como grande mal regional, independentemente de considerarem FHC igualmente destrutivo.
Fiz de propósito a abordagem exclusivamente regional e reservei para a sequência alguns dados que, se não anulam, porque seria demais desconsiderar o movimento sindical como agente indutor de evasão industrial, pelo menos amenizam o quadro discriminatório. Nos mesmos períodos, o desempenho da cidade de São Paulo, sempre sob o comando de um sindicalismo supostamente mais suave, com Joaquinzão, Medeiros e agora Paulo Pereira, praticamente empata com o dos bravíssimos cutistas do Grande ABC.


Vamos aos números paulistanos, então: entre 1976 e 1989, a capital paulista perdeu 31,72% de participação no ICMS, resultado da queda de 44,98% para 30,71%. Portanto, mais que os 27,21% do Grande ABC no mesmo período. Já entre 1990 e 2004, São Paulo perdeu 22,39%, resultado do rebaixamento de 30,68% para 23,81%, ou bem menos que o Grande ABC no mesmo período.


Repararam que entre 1976 e 1989 a Capital paulista acusou mais baixas do que o Grande ABC? Viram também que no período pós-abertura, foi a vez de o Grande ABC superar São Paulo na queda média anual de participação relativa do ICMS? Sim, São Paulo apresentou entre 1990 e 2004 queda média anual de 1,60%, contra 2,01% do Grande ABC, invertendo-se, portanto, o jogo do período 1976-1989, quando São Paulo registrou 2,44% e o Grande ABC 2,09%.


Ou seja: fôssemos avaliar a derrocada industrial do Grande ABC e da Capital exclusivamente sob o ângulo sindicalista, praticamente não haveria diferença alguma entre as supostas moderadas lideranças sindicais da Capital e os beligerantes cutistas do Grande ABC. Na média desse período de 28 anos que começa em 1976 e termina em 2004, São Paulo perdeu 1,68% de ICMS por ano, contra 1,71% do Grande ABC.


A maior diferença entre os dois períodos e no confronto sindicalismo versus fernandohenriquismo, tanto no Grande ABC como na cidade de São Paulo, é que o movimento trabalhista cometeu o pecado de hostilizar o capital de forma estúpida, mas, mesmo assim, contribuiu para o resgate do corporativismo dos trabalhadores, para o bem e para o mal.


Já no caso da abertura econômica insensível, notadamente porque se associou com a valorização artificial da moeda, o que tivemos sem a menor contestação foi um disparatado ataque aos ganhos acumulados durante quatro décadas pela então ascendente classe média, inquietantemente proletarizada entre outras razões porque a carga tributária saltou 11 pontos percentuais, ou quase 50% no período do presidente sociólogo. Sob os aplausos de cânones do capitalismo tupiniquim, abusados sanguessugas do Estado-Todo-Poderoso. Amém.


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