Economia

Modelo superado

DANIEL LIMA - 29/08/2004

O resultado eleitoral para o comando do sistema Fiesp/Ciesp acabou com um jogo de faz de conta de décadas. Foi preciso que o candidato oposicionista Paulo Skaf privilegiasse a contenda na Federação das Indústrias, da qual saiu-se vitorioso, para que o Centro das Indústrias deslizasse em direção ao situacionista Cláudio Vaz. Skaf na Fiesp e Vaz no Ciesp significam a hora da verdade de uma farsa que ajuda a explicar por que os pequenos industriais paulistas são tão importantes para os dirigentes da Fiesp como a criminalidade em Diadema para os cantores da noite de Nova Yorque.


Geralmente representantes de grandes empreendimentos, sempre foi muito conveniente aos mandatários da Fiesp utilizar as regionais do Ciesp como bandeira de representatividade do setor industrial. Por mais modesta, frustrante e inconsistente que fosse a atuação média dos Ciesps, e a realidade histórica no Grande ABC vai nesse sentido, a massa crítica da Fiesp toda-poderosa sempre pesava, e pesava muito, como condutora de um jogo de cena que nem dava bola à improdutividade institucional em defesa dos pequenos.


Sem a falsa proteção da Fiesp, espécie de preservativo com prazo de validade vencido e, portanto, altamente arriscado, a rede do Ciesp jamais conseguiu enxergar a essência da disparidade de forças na relação só aparentemente integrada com a Fiesp. O centralismo político-administrativo tornou as relações entre as duas entidades um disparate para quem avalia que está nas bases das pequenas e médias empresas a essência de uma representatividade saudável, mobilizadora e interventora principalmente contra os disparates governamentais.


Ao fazer desse segmento industrial apêndice arrecadatório, o sistema Fiesp/Ciesp exauriu-se por si próprio, principalmente a partir da abertura econômica. Desde então, como se sabe, diminuiu bastante a movimentação dos tanques das grandes empresas no campo de manobras do governo federal. A competitividade que se instaurou no País impactou além da conta a maioria dos setores industriais porque se travestiu de um samba do crioulo doido que combinou imediatismo e profundidade de desamarras alfandegárias.


Somam-se a essa operação de ruptura das relações até então preferencialmente de apadrinhamento estatal generalizado os efeitos da valorização artificial da moeda e a alta dos juros e se tem o quadro de abate generalizado da empresa nacional. Principalmente de pequeno e médio porte.


Prova de que os Ciesps são penduricalhos na estrutura institucional da indústria nacional e que a Fiesp não conseguiu reagir na intensidade e na dimensão necessárias diante do bólido de mudanças é o estágio de individualismo pela sobrevivência que as empresas, já historicamente isoladas, passaram a intensificar.


Paulo Skaf e Cláudio Vaz contribuirão para oxigenar a representação industrial paulista na medida em que oferecerem suporte adequado a um organismo debilitado ao longo dos tempos, mas que se mantinha supostamente saudável de maneira artificial, pela tutelagem do primo rico sobre o primo pobre.


Aliás, a metáfora precisa ser entendida no exato significado popular dos tempos em que Paulo Gracindo e Brandão Filho protagonizavam o quadro de rádio e em seguida de TV que consagrou os dois personagens. O primo rico sempre esnobava o primo pobre, fingia-se condoído com as agruras do consanguíneo infortunado, mas sistematicamente consumava o episódio com a arrogância típica dos bem-nascidos, oferecendo ao interlocutor migalhas em forma de generosidade.


É possível que, diante dos novos fatos e da divisão de votos no sistema Fiesp/Ciesp, Paulo Skaf e Cláudio Vaz tenham oportunidade histórica em mãos. Mais que apenas refletirem sobre o suposto abacaxi que terão de descascar em conjunto, devem mobilizar-se para interromper esse errante e entrecruzado vôo de instituições geneticamente conflitantes. Sim, geneticamente conflitantes, porque a Fiesp é um conglomerado de sindicatos cujas forças de pressão são essencialmente setoriais e extraterritoriais. Já os Ciesps deveriam portar-se como unidades de espalhamento contínuo dos pressupostos do capitalismo mais contemporâneo, inserindo-se extramuros nas regiões em que estão fincados.


De fato, Fiesp e Ciesp são complementos da mesma laranja do capitalismo. À primeira imprime-se maior ênfase de pragmatismo. Ao segundo deveriam implementar medidas que temperassem objetivos econômicos e compromissos com a comunidade. Aí, sim, teríamos a contraparte de interesses econômico e social.


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