Economia

Metamorfose econômica (30)

DANIEL LIMA - 12/08/2009

A proletarização do mercado de trabalho no Grande ABC durante os oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso se manifestou também nas ramificações escandalosamente comprometedoras de empregos com carteira assinada nas áreas de comércio e de serviços, atividades tradicionalmente menos nobres tanto em rendimentos quanto em conquistas trabalhistas. Sobretudo num Grande ABC que ficou a assistir a banda da tecnologia de ponta passar em direção à região de Campinas.

Entre janeiro de 1995 e dezembro de 2002, o Grande ABC acrescentou 65,7% de empregos no terciário, quando passou de 208.334 para 345.295, com saldo positivo, portanto, de 136.961. Convém relembrar que no setor industrial com carteira assinada, no mesmo período, perderam-se mais de 80 mil postos de trabalho. Bastariam esses números para enxotar falsificadores econômicos que de vez em quando aparecem na região com proselitismos politicamente corretos mas indecentemente mentirosos de que é salutar para o Grande ABC a substituição de matrizes industriais por matrizes do terciário. O desabamento do valor real do mercado imobiliário ao longo destes anos, apesar da marquetologia verbal de representantes do setor, especialistas em vender espumas triunfalistas, é um dos medidores implacáveis dos impactos provocados pela desindustrialização.

O crescimento relativo de postos de trabalho no terciário do Grande ABC foi muito acima da média de todos os demais territórios pesquisados por este jornalista naquela análise publicada em junho de 2006 na revista LivreMercado.

Terciário explosivo

O conjunto formado por São Paulo, Osasco e Guarulhos avançou apenas 14,2% no mercado de trabalho do setor terciário formal no período (2.553.684 contra 2.916.488), enquanto o G-3 (Campinas, Sorocaba e São José dos Campos) chegou a 45% (230.543 contra 334.429). O avanço do emprego do terciário no Grande ABC, portanto, foi três vezes superior à média do G-13 (os 13 municípios mencionados), que chegou a 20,2%.

A explosão do emprego no terciário do Grande ABC, com consequente subida dos empregos formais de até cinco salários mínimos, também pode ser constatada no confronto com a média do Estado de São Paulo, de 32,7% (de 4.542.020 postos de trabalho em 1994 para 6.026.506 em 2002). A Região Metropolitana de São Paulo é adversária ainda menos influente porque cresceu apenas 24,7% no mesmo período. Já a média nacional de criação de empregos formais no terciário chegou a 41,2% — passou de 14.722.843 trabalhadores em 1994 e chegou a 20.796.287 em 2002.

No interior do inchaço do emprego formal de serviços e comércio no Grande ABC, situação que ajuda a compreender a mudança de perfil de uma região fortemente industrial para uma região moderadamente industrial nos oito anos fernandohenriquistas, São Caetano despontou na liderança nos números relativos: o emprego formal do terciário avançou 173% no período, gestado pela guerra fiscal e sede de empresas quase fantasmas. A média de São Caetano era três vezes superior à do Grande ABC, 12 vezes a média de São Paulo, Guarulhos e Osasco juntas, 8,5 vezes a média do G-13, cinco vezes a média dos paulistas e quatro vezes a média brasileira.

O terciário do G-13 representava em 1994 nada menos que 65,8% dos empregos paulistas (2.992.561 contra 4.542.020). Já em 2002 a participação caiu para 59,6% (3.596.212 contra 6.026.506).

Queda industrial

Com o remelexo no mercado de trabalho no Grande ABC, a participação do emprego industrial com carteira assinada sofreu cataclisma insuperável no País. Em dezembro de 1994 o Grande ABC contava com 53,7% de empregos formais na indústria, contra 46,3% das demais atividades, no caso construção civil, comércio, serviços e agropecuária. Oito anos depois do governo FHC, o Grande ABC caiu para 35,3% de empregos industriais. Mais de 20 pontos percentuais, ou 34,2. A tradução disso é de que de cada 100 empregos com carteira assinada na região em 1994, 53,7 estavam nas indústrias. Já em 2002, apenas 35,3% estavam nas fábricas. Não existe melhor explicação para a desmobilidade social do Grande ABC no período, já que, tradicionalmente, o emprego industrial é maior e oferece mais contrapartidas econômicas e financeiras. No Primeiro Mundo, Estados Unidos à frente, o setor de serviços altamente especializado conseguiu, em décadas, amortecer o rebaixamento da massa salarial.

Em 1994, a indústria do Grande ABC gerava 276.650 postos de trabalho de um total de 514.551. Já em 2002 os empregos industriais caíram para 195.323 postos do total geral de 553.360. O saldo de empregos formais na região, considerando-se todas as atividades pesquisadas no período de oito anos, foi de apenas 38.809. Um pouco mais que os 30 mil empregos que o Grande ABC precisaria gerar por ano para atender à População Economicamente Ativa. Não é por outra razão que o mercado informal reúne dois empreendimentos para cada negócio formalizado.

No próximo capítulo mostraremos a perda individual de empregos indústrias nos municípios do Grande ABC e também comparativos da região com outras áreas do Estado e com o País. Engolimos poeira, muita poeira. E pensar que as chamadas lideranças econômicas, sociais e acadêmicas do Grande ABC assistiram a tudo sem praticamente mexer uma palha de indignação.



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