A Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC vai colocar em pauta para debate antes do final de ano um assunto sobre o qual nos referimos tangencialmente na semana passada: o que pretendemos fazer do traçado do Rodoanel Sul como ferramenta de incremento econômico com amplas repercussões sociais?
Trata-se, simplificadamente, do seguinte: agentes econômicos e sociais que estejam realmente preocupados com a prospecção de novas matrizes de desenvolvimento econômico sustentável da região têm de assumir a dianteira nos debates sobre o trecho sul que passará ao redor de alguns dos municípios da região (Ribeirão Pires, Mauá, São Bernardo e Diadema), retirando dos ambientalistas o controle exclusivamente preservacionista da obra.
Calma lá, senhores ambientalistas! Não estou aqui a desfraldar a bandeira da irresponsabilidade. Tanto não estou que destaco a importância do desenvolvimento econômico sustentável em todas as intervenções em busca de novos caminhos para o Grande ABC. Entretanto, defendo também que o debate não se limite a megatratado ambientalista exacerbado, como já se observa aqui e ali.
Menos mal que o problema maior das obras do traçado sul dessa que é a mais importante cirurgia viária da Região Metropolitana de São Paulo está localizado na Serra da Cantareira; portanto longe do Grande ABC. Na geografia da região aparentemente não há empecilhos incontornáveis. Entretanto, exatamente porque as facções desenvolvimentistas não se mobilizam, os ambientalistas conseguiram sustar as audiências públicas programadas, inclusive em municípios do Grande ABC, e, com isso, agigantam-se as probabilidades de o cronograma de obras fugir do acasalamento estratégico com que todo homem público sonha — ou seja, inaugurar esse novo trecho na boca das urnas eleitorais de 2006, quando uma nova chefia de governo estadual se disputará em São Paulo.
Quem garante que, diante da impossibilidade ainda não consumada de conciliar tempo e espaço de acordo com as estratégias eleitorais, o governo do Estado não decida afrouxar o ritmo e desviar parte dos recursos para outros projetos?
É uma boa notícia a afirmativa de José Carlos Paim, secretário-executivo da Agência de Desenvolvimento Econômico. Ele dá conta de que será programado um evento multilateral para aquecer a fogueira da instalação desse temário acima de geleiras de defesas eventualmente conservadoras do conceito de desenvolvimento econômico. Muito se fala e se escreve sobre o trecho do Rodoanel que poderá recolocar o Grande ABC na rota dos investimentos produtivos na Grande São Paulo, mas jamais se expôs a seguinte questão: precisamos saber o que queremos obter de possíveis vantagens estratégicas oferecidas pelo traçado que circundará o Grande ABC.
Há tantas questões a serem avaliadas e ponderadas que este espaço seria pouco. Mas alguns pressupostos precisam ser cautelarmente registrados e atacados, contando para tanto com uma força-tarefa necessariamente a ser liderada pelo governo do Estado, pelos chefes de Executivos e empreendedores da região.
Talvez ainda não seja tarde, mas é indispensável que se elabore minucioso estudo sobre o perfil territorial, topográfico e de propriedade das vastas áreas que estarão próximas do trecho sul do Rodoanel. A especulação imobiliária poderá neutralizar a possibilidade de o Grande ABC expandir-se na direção de bordas opostas às da Capital tão vizinha e asfixiante, provavelmente com a inserção de novas configurações econômicas porque assim os mananciais tão próximos exigem.
A prioridade de prestigiar pequenas e médias empresas não pode ser enterrada pela ausência de medidas preventivas, como bem lembrou o secretário de Desenvolvimento Econômico de São Caetano, Jerson Ourives. O dirigente sempre participativo em encontros regionais juntou-se ao rápido bate-papo informal que mantivemos com José Carlos Paim e o secretário de Relações Internacionais da Prefeitura de Santo André, Jeroen Klink, pouco antes do evento que marcou a assinatura do convênio da Agência com a Fundação Vanzolini.
Aliás, a própria Fundação Vanzolini poderia ser chamada a contribuir com planejamento, estudos, propostas e projetos especificamente voltados ao trecho sul do Rodoanel. Afinal, como instituição integrada à ramificação da Universidade de São Paulo, a Fundação Vanzolini poderia ter convocatória recomendada pelo governo do Estado. Basta vontade política para que técnicos especializados se juntem aos agentes sociais, econômicos e políticos do Grande ABC para que se evite na alça sul do Rodoanel o mesmo desvario do trecho oeste já terminado: a completa ausência do Estado como agente organizador do espaço adjacente à serpentina asfáltica.
Essa é a função e, mais que isso, a vocação de um Estado minimamente competente. Deixar ao deus-dará a guerra santa pela disputa econômica de espaços especialmente estratégicos para a qualidade de vida e o equilíbrio econômico da Grande São Paulo é muito mais que imprevidência — é o suprassumo da irresponsabilidade.
Esperamos que as instituições regionais — sobretudo a Agência, a Câmara Regional e o Consórcio de Prefeitos — se mobilizem imediatamente para levar até o governo do Estado uma síntese com as principais âncoras de um planejamento de ocupação econômica e socialmente inteligente ao longo do Rodoanel.
São essas e outras questões que, expostas, minimizam o escopo exclusivamente ambientalista com que tem sido tratado o Rodoanel sem, entretanto, reduzir a importância de impedir que predadores de plantão se locupletem.
Mais caro que o preço da imprevidência ecológica é acrescentar a isso uma morfologia ocupacional em contraste com a potencialidade econômica que o traçado sul sugere.
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12/11/2024 SETE CIDADES E SETE SOLUÇÕES