Economia

Quem disse que
a VW não tem futuro?

DANIEL LIMA - 15/03/1999

A Volks/Anchieta de um futuro próximo, de no máximo cinco anos, será uma fábrica sobre a qual emergirão os melhores indicadores de competitividade do mundo. Um dos símbolos sagrados da economia do Grande ABC, a Volks/Anchieta vive os estertores do obsoletismo estrutural, logístico e estratégico de produção. O gigantismo da planta de 1,1 milhão de metros quadrados construídos será redimensionado e redividido. A fábrica será miniaturizada em relação aos excessos físicos que a conceberam e os espaços que sobrarem dessa transformação — e serão muitos milhares de metros quadrados — ganharão novos ocupantes. Serão os fornecedores mais importantes da unidade, cujas linhas de produção vão estar tão próximas das áreas de montagem da Volkswagen que tudo que se conhece até hoje sobre o sistema just-in-time será pouco diante da eficiência que se terá. Um modelo, resumidamente, que em pouco se assemelhará ao revolucionário consórcio modular que essa multinacional de capital alemão criou na fábrica de ônibus e caminhões em Resende, no Rio, e em muito se espelhará na moderníssima planta da Volks/Audi, inaugurada recentemente em São José dos Pinhais, na Grande Curitiba.

Quem dá a boa notícia de que a Volkswagen não só não baterá asas do Grande ABC como prepara vôo à modernidade que o mercado globalizado exige é o vice-presidente Fernando Tadeu Perez, seguramente o profissional de Recursos Humanos mais festejado do País, depois de efetivar históricos acordos trabalhistas com o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

A determinação da Volkswagen do Brasil em quebrar o clima de derrotismo que ameaça desintegrar a economia do Grande ABC e em apostar numa completa metamorfose do que Fernando Tadeu Perez chama de complexo industrial da Anchieta é algo que merece comemoração. Está certo que a região não perdeu a capacidade de oferecer as vantagens logístico-mercadológicas de estar em pleno coração do maior mercado consumidor brasileiro — a Grande São Paulo. Não é menos verdade que, apesar dos pesares, a mão-de-obra dá conta do recado, até porque está passando por intenso reparo educacional e de treinamento, enquanto a automação alastra-se pelo chão de fábrica. Mas, convenhamos: diante de tantas vantagens oferecidas pela concorrência, no caso o Interior paulista e alguns Estados loucos pelo brilho das logomarcas automotivas, deve-se agradecer aos céus pela iniciativa da Volks de investir na região.

Cultura teotônica — A essa decisão se pode dar o nome de responsabilidade social, algo caro a uma empresa de cultura teotônica e em cujo País de origem a social-democracia é regime político em que o Estado e o mercado procuram conciliar-se. Os investimentos na Volks/Anchieta, que deverão atingir US$ 3,5 bilhões em cinco anos, são uma aposta da empresa numa nova família de veículos, codificada pela sigla PQ-24, cujos limites de comercialização têm a elasticidade do mapa-mundi.

É graças a esse projeto que o Grande ABC não passará pela hecatombe do esvaziamento da Volkswagen/Anchieta. A repercussão em toda a cadeia automotiva e os estilhaços em outras áreas seriam insustentáveis. A possibilidade de redução do quadro de pessoal além do previsto no último acordo trabalhista é descartada por Fernando Tadeu Perez: “Nosso acordo com o sindicato prevê que em cinco anos teremos cinco mil trabalhadores a menos na unidade, isto é, chegaremos a 15 mil funcionários. Não acredito que baixaremos além disso, a menos é claro que o mercado continue em baixa” — garante.

A projeção também é um alívio para o Grande ABC. Afinal, a Volkswagen contraria, com isso, a tendência internacional de enxugamento das plantas automotivas a partir da concepção das novas unidades ou da reformulação de espaços antigos, que não reservam lugar para mais que cinco mil trabalhadores. Está na essência dessa medida o casamento de unidades fartamente tecnológicas e regiamente horizontalizadas, isto é, concentradas explicitamente em atividades-mestras do produto, repassando aos chamados sistemistas a parceria de produzir conjuntos completos.

É assim que já está funcionando a fábrica da Volks/Audi em São José dos Pinhais, no Paraná. Ali foram investidos R$ 750 milhões para produzir 550 carros por dia. A ida da VW/Audi para São José dos Pinhais provocou a implantação do Parque Industrial de Curitiba, para receber 13 novas empresas do setor automobilístico, que produzirão peças para o Audi A3 e o Novo Golf atuando no sistema just-in-time, cuja tradução mais simples significa eliminação de estoques. O Parque Industrial da Volks/Anchieta será a própria fábrica. Enfim, a empresa fez do limão do excesso de metros quadrados construídos a limonada da operação logística de trazer os principais fornecedores para bem perto de suas fronteiras.

Entre melhores — Por isso que a Volks/Anchieta estará muito mais próxima da Volks/Audi. Nada mal, porque a fábrica do Paraná é considerada uma das 10 mais produtivas da indústria automotiva mundial. Fernando Tadeu Perez descarta o consórcio modular de Resende sob a justificativa de que o negócio é outro e de que a fábrica do Grande ABC é maior. Tradução: para a produção em massa de veículos de passeio, como é o perfil do Projeto PQ-24, não seria recomendável à montadora utilizar-se de sistema em que os fornecedores praticamente são responsáveis pela linha de produção e montagem. O que vale para caminhões e ônibus necessariamente não serve para automóveis.

Do ponto de vista exclusivamente econômico-financeiro, se o futuro da Volks/Anchieta estivesse disponível num parque de diversões ganharia a forma de tiro ao alvo. O índice de produtividade é uma pedra no sapato de quem, paradoxalmente, esforça-se para defender a unidade enquanto arregala os olhos quando fala do futuro da planta. Na Anchieta são produzidos apenas 35 veículos/homem por ano, contra 45 de Taubaté. É preciso atingir 50 veículos/homem, garante Tadeu Perez. Menos que a média internacional, que chega a alcançar 70 veículos/homem/ano, e um abismo em relação aos 110 veículos per capita/ano dos japoneses. A equação para chegar ao indicador de fertilidade produtiva é simples. Basta dividir o total de veículos produzidos em cada unidade pelo número de funcionários, sem contar os terceirizados.

Fernando Tadeu Perez esforça-se para amenizar o impacto das estatísticas. Exímio negociador trabalhista, não lhe pareceria conveniente alçar a questão à ribalta do desgaste desnecessário. Argumenta até, como o sindicalista Luiz Marinho em artigo publicado recentemente, que o critério convencional de medição de produtividade é prejudicial à Volks/Anchieta, cujas características de complexo industrial, e não simplesmente de montadora, como as demais, traduz-se em desequilíbrios na contabilidade. A defesa tem fundamento apenas relativo, porque tudo que não seja veículo mas que é produzido na Volks/Anchieta é rigorosamente transformado em unidades do bem de consumo mais ambicionado pela humanidade. Todas as horas despendidas em atividades produtivas excluídas do sistema de montagem viram veículos/homem/ano.

Flexibilidade — O indicador de produtividade não é um monumento monolítico que resiste a tudo e a todos e que pode ser fortalecido sistematicamente. Pelo contrário: sua base de sustentação está estreitamente ligada à performance de vendas. Quando a demanda sofre baque, como nos últimos meses, todos os esforços se comprometem. Fernando Tadeu Perez, entretanto, não perde o foco do otimismo. Entende que o mercado vai reagir e que o crescimento da produtividade será automático e em proporções superiores ao que acontece no Primeiro Mundo. Lá as montadoras chegaram a um patamar mais complexo de grandes evoluções, sobretudo porque há fortes indícios de saturação do mercado.

A montanha-russa dos negócios com veículos no Brasil, expressa na possibilidade de a comercialização interna neste ano de recessão emparelhar-se com os esquálidos números do início da década, também recessivo, compromete a escala de produção, um dos mandamentos sagrados de competitividade. O princípio de que mais unidades produzidas por um mesmo número de trabalhadores provoca redução dos custos unitários é uma das âncoras de produtividade. Em suma: as fábricas de veículos instaladas no País têm de engolir a pílula amarga da vulnerabilidade de políticas econômicas descoladas dos princípios desenvolvimentistas. Uma situação que acaba por agravar ainda mais a inevitável queda do nível de trabalhadores empregados no setor. A Volkswagen do Brasil já contou com 44 mil colaboradores no início dos anos 80 e agora não são mais que 27 mil.

Fernando Tadeu Perez lembra que os custos da mão-de-obra do setor automotivo no Brasil não resistem aos valores do Primeiro Mundo se a equação mais recomendável para a comparação levar em conta a operação completa entre os montantes direta e indiretamente relacionados aos vencimentos dos trabalhadores e os veículos produzidos. “Temos custos superiores aos de Argentina e Portugal e semelhantes aos da Inglaterra” — compara. “Temos custos de padrão internacional, mas não produtividade” — completa. Trata-se de equação que os profissionais de Recursos Humanos terão de resolver, segundo avalia o vice-presidente da Volks.

É também por isso que a decisão de investir na Volks/Anchieta ganha foros de responsabilidade social. Fernando Tadeu Perez tem à mão dados que confrontam o custo da mão-de-obra de São Bernardo em relação a outras unidades da empresa. O trabalhador horista da Anchieta custa em média R$ 32,5 mil por ano. Em Taubaté, fábrica instalada há três décadas sob o mesmo conceito estratégico de RH, o custo é igual. Já em Resende não ultrapassa a R$ 22 mil por ano. A fábrica de motores de São Carlos exige por homem menos da metade da de São Bernardo — R$ 15,5 mil. E a nova benchmarking da Volks/Anchieta, a Volks/Audi do Paraná, chega a R$ 20 mil.

Diferentes — O que se percebe, nessa grade de valores, é que a Volkswagen abandonou o que se revelou deslize histórico de estabelecer salários iguais para situações diferentes. O custo do trabalhador em Taubaté poderia ser inferior ao de São Bernardo porque as características do Vale do Paraíba eram e continuam sendo diferentes. É uma área geoeconômica sem os custos logísticos, alimentares, escolares e de moradia de uma Região Metropolitana. “Resolvemos adaptar nossos custos com mão-de-obra à realidade do mercado local, não o inverso, como fizemos em Taubaté” — afirma Perez. Mas ele mesmo sai em defesa dos formuladores da política adotada em Taubaté: “Eram tempos diferentes dos de hoje, em que a mão-de-obra precisava ser levada do Grande ABC, com os custos do Grande ABC”. Preferiu não dizer que eram também tempos de reserva de mercado, estimuladores de natural baixa de guarda com a engenharia de custos.

Depois de dois acordos com a direção do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Fernando Tadeu Perez conseguiu reduzir a folha de pagamentos anual da Volks/Anchieta em perto de R$ 200 milhões. O montante caiu de R$ 1 bilhão para R$ 800 milhões. O problema é que o rebaixamento serviu também para realçar ainda mais o peso dos benefícios sociais que a empresa desembolsa para atender a antigas chamadas conquistas sindicais. São R$ 162 milhões anuais direcionados para funções tipicamente de responsabilidade do Estado, como transporte, educação, saúde, sistema previdenciário e alimentação, além de participação nos resultados. Para se ter idéia, trata-se do mesmo montante do orçamento de receitas da Prefeitura de São Caetano para este ano.

Por causa do crescimento dos custos dos serviços, mesmo com a redução do quadro de trabalhadores e também de subsídios de benefícios, a Volks/Anchieta continua a desembolsar com tarefas governamentais quantia semelhante à do primeiro acordo. Tudo isso se traduz no fato de que 17% dos custos com os trabalhadores estão relacionados com ações do Estado.

Embora não se dê por convencido de que se tenha encerrado a tentativa de reduzir o Custo ABC por meio de reuniões do Grupo Automotivo da Câmara do Grande ABC, Fernando Tadeu Perez acredita que é questão de tempo tornar a produção regional mais competitiva. O grupo da Câmara Regional praticamente se dissolveu quando, em setembro do ano passado, descobriu-se que o desarme do Custo ABC no setor automotivo passa indispensavelmente pelo abrandamento, senão extinção, de benefícios sociais custeados pelas empresas montadoras e de autopeças.

Tadeu Perez entende que o trabalhador acabará percebendo que os tempos de vacas gordas já se foram e que poderá chegar o momento em que será preferível abrir mão de benefícios a perder o emprego. Acredita que é mais provável, diante dos obstáculos que se interpõem entre os interlocutores da Câmara Regional, encontrar saídas individuais para fugir do enrosco de custos. A gradual revisão de benefícios oferecidos será mais lenta no processo empresa por empresa, mas inexorável, segundo a avaliação do executivo.

Paralelamente às evoluções sincronizadas com o Sindicato dos Metalúrgicos para quebrar a espiral de custos da folha de pagamentos, a Volks/Anchieta aparelha os trabalhadores para a competitividade entre as unidades da marca e o mercado em geral. A abertura econômica e a chegada de novas montadoras imprimiram novo ritmo. Vive-se uma timbalada econômica em que automação é apenas parte das mudanças no chão das fábricas. O núcleo de todas as transformações são os funcionários. Por isso, a escolaridade é decisiva aos projetos e processos. Quanto menos funcionários pouco letrados, melhor.

O índice de escolaridade da Volks/Anchieta já comporta foguetório. De 40% sem o Ensino Fundamental de alguns anos, sobraram apenas 20%. Na outra ponta, 13% dos horistas já ostentam curso universitário. Os números, também folheados por Fernando Tadeu Perez com a avidez de quem acompanha o surgimento de um novo mundo, são parecidos em Taubaté. Lá, 16% ainda não concluíram o Ensino Fundamental e 21% têm nível universitário. As unidades de Resende e do Paraná se espelham na fábrica de motores de São Carlos, onde 91% já terminaram o Segundo Grau e 7% concluíram o Ensino Superior. São Bernardo oxigena-se com a combinação de turnover em que se priorizam profissionais que somem mais de oito anos de escola e a manutenção de salas de aulas acadêmicas e profissionalizantes em suas próprias dependências.

A confiança da direção da Volks/Anchieta no sucesso da nova fábrica e do novo conceito de relacionamento com os fornecedores também se deve ao rompimento da fita de hostilidades entre capital e trabalho na unidade. Fernando Tadeu Perez prefere fugir do assunto, mas o pulso firme com que conduziu negociações com o sindicato de Luiz Marinho explica o relacionamento amistoso. “O Marinho é um sindicalista com as partes boas dos antecessores, um dirigente moderno e bem assessorado” — afirma Fernando.

Sem mágica — O executivo da Volks diz que não há mágica na paz entre a empresa e o sindicato. “Trata-se de profissionalismo. Entendemos que transparência, credibilidade e seriedade garantem o profissionalismo com que a empresa tem se conduzido nos encontros trabalhistas”.

Não é só com o sindicato de Luiz Marinho que a vice-presidência de Recursos Humanos comandada por Fernando Tadeu Perez tem-se dado bem. Se há entendimento com a CUT (Central Única dos Trabalhadores) que dirige os metalúrgicos de São Bernardo e de Taubaté, não é diferente o diálogo em Resende e no Paraná, onde a Força Sindical é quem dá as cartas, ou em São Carlos, sem vínculo direto com qualquer central trabalhista. “Sem dúvida houve grande avanço nas relações trabalhistas no País. Particularmente no caso da Volkswagen, temos mantido encontros de alto nível” — afirma Fernando Perez.

Boa-vontade não pode ser confundida com ingenuidade. Um negociador como o vice-presidente da Volkswagen do Brasil sabe disso e deixa evidenciado quando faz avaliação sobre a realidade de dois anos atrás e a de hoje. Há dois anos disse que o sindicalismo estava amadurecendo e que sentia na cúpula senão o pisar no breque, pelo menos o tirar o pé do acelerador de reivindicações. Disse também que confiava em que o amadurecimento dos dirigentes sindicais chegaria até as bases.

Dois acordos trabalhistas depois, em que se tornou inevitável a interseção de demissões, redução de salários e enxugamento de benefícios diversos, Fernando Tadeu Perez afirma que os freios já foram acionados. Mas está atento. Sabe que as relações entre capital e trabalho não são estáticas, definitivas. Estão atreladas à conjuntura econômica, agora desfavorável a reivindicações: “Tudo é possível, até que voltem a pisar no acelerador e requeiram a parte que entendam que lhes cabe” — comenta.

Detentor de seletiva agenda de palestras cada vez mais recheada, na qual o convite para uma reunião a cada cinco dias úteis da semana se multiplicou por três desde que os acordos com os metalúrgicos o consagraram como habilidoso negociador, Fernando Perez atribui à sua equipe qualidades de um time de futebol moderno. “Aqui todos executam mais de uma função e estão prontos para o próximo jogo como se fosse uma disputa de título” — diz.

Para dar exemplo de que o espírito coletivo do futebol que jogava até recentemente, até que o joelho avariado o colocasse no estaleiro, lhe serve de produtiva analogia, Fernando Tadeu Perez afirma que todas as quartas-feiras são reservadas para o que chama de trabalho do grupo de RH da companhia. “Deixamos os gabinetes e nos instalamos durante o dia todo na sala de reuniões, onde trabalhamos lado a lado, num sentido de interação que lubrifica as relações internas e possibilita a harmonia da linguagem nas relações externas”.

Esquerda ou direita? — A sala de reuniões a que se refere o executivo da Volks é emblematicamente histórica, porque sediou desgastantes negociações com metalúrgicos a partir do reinado de Lula, passando por toda a dinastia de líderes sindicais de São Bernardo, até chegar a Luiz Marinho. A sala ampla acomoda mesa de reuniões para mais de uma dezena de pessoas. Os representantes da Volks, ironicamente, se colocam à esquerda. Eles se posicionam frente a frente com os sindicalistas, como recomenda a boa educação.

Fernando Perez sorri sobre o posicionamento dos interlocutores. Como especialista em buscar alternativas para situações aparentemente incômodas, rechaça educadamente a observação: “Esquerda e direita dependem do ângulo de visão desta sala”.

Esquerda mesmo, sem discussão, é a perna que carrega um joelho impiedosamente atingido por adversários nos jogos de futebol. Camisa 10, simbologia do craque de qualquer equipe, Fernando Tadeu Perez foi nos campos de futebol amador referência de criatividade, segundo velhos amigos que dividiram os gramados com ele. No campo de RH não é diferente.

Basta observar a evolução com que a Volkswagen se dedicou à criação do Banco de Horas, proposta pela empresa numa reunião da Anfavea, associação que reúne os fabricantes de veículos. Fernando Perez lembra que foi a Volkswagen a primeira empresa a adotar a modalidade como forma de evitar oscilações de custos, ora por causa de demanda reprimida que exigia demissões, ora por causa da demanda exacerbada que obrigava horas extras.

Enquanto outras empresas também encontraram no Banco de Horas uma saída para harmonizar interesses de trabalhadores e empreendedores, Tadeu Perez lançou numa segunda etapa outra estratégia — o Banco de Dias –, em que os funcionários não trabalham dias inteiros e compensam a folga depois, com consequente quebra de custos operacionais. Com a persistência da recessão decorrente da crise financeira que atingiu em cadeia os mercados asiático, russo e brasileiro, nova medida foi tomada pela empresa: semana de quatro dias de trabalho. “São dispositivos que se complementam” — explica o executivo.

Como mágico que sempre carrega um ás na manga da camisa, Tadeu Perez já imagina uma quarta etapa de inovação, num contraste com a passividade da maioria das indústrias que se instalaram no aparente conforto do banco de horas e hoje se vêem cutucadas por custos elevados, já que os trabalhadores, em muitos casos, estão lhe devendo tantas horas que será impossível resgatá-las.

Ford na parede — Um assunto que não consegue arrancar declarações públicas de Fernando Tadeu Perez são as trapalhadas da Ford do Brasil nas negociações com o mesmo Sindicato dos Metalúrgicos que o consagrou como interlocutor confiável. Além de barreiras éticas, já naturalmente decisivas, pesa no comportamento do executivo uma extensa carreira de relacionamento com a montadora de capital norte-americano. Tadeu Perez mandou afixar em seu imenso gabinete um diploma de 25 anos de atividades na Ford, 12 dos quais dedicados à subsidiária Philco, chegou à Ford Caminhões e foi requisitado quando da fusão com a Volks para compor a gerência da Autolatina. Desfeito o casamento, Tadeu Perez passou para a Volks.

Amigos mais íntimos dizem que Tadeu Perez não é de chutar bola fora. Como nos campos de futebol, quando sua canhotinha fatal promovia estragos na reputação dos goleiros, a carreira de executivo só poderia mesmo chegar ao topo. Os resultados das negociações com os metalúrgicos contribuíram para lhe dar novo espaço no organograma da Volkswagen brasileira e argentina. O cargo de vice-presidente de Recursos Humanos não existia. Agora não só existe como Tadeu Perez também é membro do board estratégico da companhia. Isso significa inestimável valorização dos profissionais de RH, ainda observados em muitos ambientes corporativos como simples figurantes nos estudos e ações que decidem os rumos das companhias.

Não é à toa que Tadeu Perez se dá ao luxo e à conveniência pessoal de filtrar os convites para palestras. “Sou um homem afortunado, que teve oportunidade de fazer parte da Volkswagen do Brasil” — diz, com a simplicidade de quem sabe que provavelmente o próximo clássico de negociações com os metalúrgicos, que pode ser bem antes do previsto para janeiro, por causa da crise econômica, será mais uma dura prova. Nervos de aço, franqueza e amplo conhecimento sobre a realidade da empresa e do setor automotivo vão ser colocados novamente à prova. Ele sabe que, em se tratando dos limites entre o sucesso e fracasso, o ambiente corporativo e o mundo do futebol também reservam armadilhas semelhantes. Que o diga Ronaldinho, depois do fiasco da final da Copa do Mundo.



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