Imprensa

Um Observatório para
o mercado imobiliário

DANIEL LIMA - 21/12/2016

Se os prefeitos, individualmente, estão sendo monitorados por CapitalSocial desde julho de 2013 no Observatório de Promessas e Lorotas. Se os prefeitos, coletivamente, passarão a partir de janeiro pelo filtro do Observatório do Clube dos Prefeitos, inicialmente com 20 demandas preparadas por este jornalista, por que o mercado imobiliário ficaria livre de iniciativa análoga, ou seja, que tenha a mesma proposta de medição do tamanho de suas ações? 

Foi por isso que dois dias após criar o Observatório do Clube dos Prefeitos decidimos organizar também o Observatório do Mercado Imobiliário. Os insumos, agenda ao acompanhamento do setor, estão prontos desde dezembro de 2011. Houve apenas algumas modificações e supressões. Permaneceram 16 enunciados. 

Como se observa, passou da hora de dar um novo destino àquelas propostas completamente ignoradas pelo então presidente do Clube dos Construtores, o empresário Milton Bigucci. Ele preferiu tirar de foco a inoperância de mandatos consecutivos que o mantiveram na presidência da entidade por mais de duas décadas e centralizou fogo em ações judiciais contra este jornalista. Como se a proposição de um mercado imobiliário ético e responsável fosse atentado à honra do dirigente. Talvez seja um atentado aos interesses do empresário – como, aliás, o tempo tratou de provar. 

Os mesmos passos 

Portanto, o Observatório do Mercado Imobiliário vai seguir os mesmos passos do Observatório do Clube dos Prefeitos. Vamos apresentar em seguida uma série de questões cujas resoluções vão depender da iniciativa da direção do Clube dos Construtores (Acigabc). Não se trata, como se verá, de pauta simples. É intensa. Nada mais providencial. A atividade imobiliária envolve milhares de famílias proprietárias, locatárias e também com intenções de adquirir uma moradia. 

E, como temos denunciado ao longo dos anos, é uma atividade muito distante dos anseios da sociedade. Houve melhora na substituição do empresário Milton Bigucci pelo engenheiro e também empresário Marcus Santaguita. Mas é preciso imprimir mais velocidade. E muito mais que isso: é urgente que se definam referenciais que inibam retrocessos. 

O retorno de Milton Bigucci ao Clube dos Construtores, embora ele não se tenha afastado totalmente já que é presidente do Conselho Deliberativo, teria um custo enorme ao avanço de que a Província do Grande ABC tanto prescinde nas instituições econômicas. 

A criação de observatórios (no começo do ano que vem anunciaremos outros dois) é uma estratégia editorial que ampliaremos. A razão é simples: com os observatórios, teremos permanente compromisso de apresentar à sociedade consumidora de informações eventuais avanços ou mesmo retrocessos das instituições sob análise. Sim, cada observatório será uma fonte permanente de questionamento. 

Agenda-desafio 

A agenda que se segue, integrada por 16 propostas, é um desafio à direção do Clube dos Construtores da mesma forma que os 20 enunciados colocam o Clube dos Prefeitos num enquadramento crítico que não pode ser descartado também como forma de colaboração desta revista digital. 

O conceito do observatório voltado ao Clube dos Prefeitos e também ao Clube dos Construtores (assim como dos demais segmentos que serão anunciados) é de objetividade cristalina: trata-se de elenco de questões que há muito a Província do Grande ABC clama aplicação. 

E como o Observatório do Clube dos Prefeitos, o monitor voltado ao mercado imobiliário não se esgotará na agenda que justifica a própria realização desse projeto editorial. Poderemos e deveremos incorporar novas propostas na medida em que as demandas se provarem indispensáveis.

Quando apresentamos as propostas que agora servem como agenda do Observatório do Mercado Imobiliário, afirmamos que a humanização da sociedade, principalmente em regiões metropolitanas já tão degradadas pela ganância do setor e pela leniência dos gestores públicos, era questão de tempo. Esse tempo ainda não chegou. Entretanto, iniciativas como essa colaborarão e muito nesse sentido.  É o que pretendemos como tiro de partida de uma maratona que haverá de ser superada. 

O Clube dos Construtores sob nova direção mas ainda aquém do ritmo de mudanças que a sociedade exige não encarará desta vez, com novos dirigentes, a transposição daquelas propostas de 2011 em um monitoramento sistemático como sinônimo de injúria e difamação. A cortina de fumaça da judicialização da liberdade de opinião é especialidade que Marcus Santaguita e a maioria dos diretores do Clube dos Construtores não praticam. Vejam agora a agenda do Observatório do Clube dos Construtores: 

 Mapeamento do IPTU residencial, comercial, serviços e industrial.

Explicação – Não basta contar com números orçamentários genéricos de arrecadação do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). Esse é um modelo defasado, antiquado e insolvente adotado pelos administradores públicos. O IPTU deve ser escarafunchado de tal modo que se tenha completa radiografia dos valores médios por áreas geográficas de cada Município. Só assim será possível captar prováveis distorções que beneficiariam grandes proprietários em detrimento de outros, ou mesmo de disparidade em situações semelhantes. Parte dos recursos amealhados pelas prefeituras poderia ser destinada à vinculação do desenvolvimento econômico e social dos respectivos bairros, num processo de personalização do tributo, tornando-o mais visível aos contribuintes no sentido de retorno da intervenção pública. 

 Composição de Conselho de Ética contando com representantes da sociedade civil. 

Explicação – O organograma do Clube dos Construtores não pode prescindir de instância que exerça severa vigilância ética sobre a gestão de uma atividade com forte imbricamento social. Um Conselho de Ética formado por instâncias da sociedade, entre as quais o Procon, dinamitaria práticas corporativistas que sequestram valores de cidadania. 

 Mapeamento completo de áreas industriais disponíveis.

Explicação – Faltam estatísticas que identifiquem a realidade do estoque de áreas industriais que possam ser catalogadas à atração de novos investimentos. Um banco de dados com informações e características desses espaços é o primeiro passo a empreitadas de várias tonalidades econômicas, entre as quais o encaixe de valores por metro quadrado. O reino da especulação viceja aonde há escuridão de informações. 

 Gradualismo na utilização da mecânica de aplicação de outorgas onerosas.

Explicação – A introdução do anteparo de outorgas onerosas para atenuar impactos ambientais e viários de edificações excessivamente verticalizadas ainda está longe do ponto ideal. O adicional financeiro exigido para elevar o índice de construção com consequente investimento dos valores em serviços públicos não é de todo resolução amenizadora dos impactos dos grandes empreendimentos imobiliários. Está certo que a redução dos limites de construção em relação à área física de determinado terreno significa avanço nas relações do Poder Público e o mercado imobiliário, mas é possível melhorar. O gradualismo sugerido é simples: o peso financeiro das outorgas onerosas seria menor na medida em que os endereços pretendidos pelos investidores imobiliários se afastassem de uma lista previamente definida de corredores viários mais intensamente disputados. Ou seja: contrapartidas financeiras seriam abrandadas quanto mais os empreendimentos imobiliários se afastarem das áreas comercialmente mais nobres. 

 Completa transparência administrativa, incluindo-se atividades empresariais dos dirigentes da entidade.

Explicação – Os dirigentes do Clube dos Construtores são agentes sociais, por conta do envolvimento público do setor. Por isso, suas atividades empresariais não podem dissociar-se de base ética que os iniba, quando não os impeça, do acesso a privilégios que a interlocução com o setor público possibilita em tratativas institucionais de uso implicitamente particular. 

 Comitê misto de avaliação das relações entre agentes econômicos e mutuários de imóveis.

Explicação – Há elevado número de problemas que envolve o mercado imobiliário, denunciado aos agentes de proteção dos consumidores de produtos e serviços. O mercado imobiliário é um dos maiores destinatários de queixas de mutuários. Por isso, tratativas de resoluções que envolvam os dois lados dessa mesa de permanentes embates precisam ganhar foro específico de representantes dos dois segmentos. Tudo, entre outras razões, para racionalizar medidas profiláticas, eliminando efeitos de dispersão e baixa resolutividade que decisões entre as partes beligerantes procuram solucionar nem sempre com a força do argumento e dos direitos previstos. 

 Organização estatística do valor do metro quadrado na venda de imóveis novos e usados. 

Explicação – Os anúncios de compra e venda de imóveis novos e usados colocam no mesmo saco produtos completamente diferentes. Características físicas e localização são praticamente ignoradas na formulação de preços. Tratam o mercado imobiliário de cada Município como tecido homogêneo. Na realidade são pontos muitas vezes complemente distintos. Um banco municipal do valor do metro quadrado para venda de imóveis usados e novos que leve em conta entre outros pontos a localização geográfica poderia permitir entre outros benefícios maior velocidade de venda e drástica queda do grau de especulação que a barafunda patrocinada pelos agentes imobiliários fomenta. 

 Organização estatística do valor do metro quadrado na locação de imóveis novos e usados.

Explicação – Os mesmos princípios que regeriam o mercado de venda de imóveis novos e usados poderiam ser introduzidos no banco de dados de imóveis à locação. É preciso especificar as diferenças para estabelecer valores distintos. E isso só é possível com o suporte de agentes imobiliários de campo, os corretores. Ninguém melhor do que eles para acompanhar em tempo real o andar da carruagem do mercado imobiliário. 

 Pesquisa anual para aferir o manancial de questões que movimentam o mercado imobiliário.

Explicação – A produção de questionário detalhado que seria aplicado principalmente pelas imobiliárias poderia detectar, anualmente, tendências microeconômicas do mercado imobiliário de cada um dos municípios da Província do Grande ABC. É possível antecipar alguns movimentos de construtoras e incorporadoras a partir dos radares informativos dos corretores que atuam no front, longe portanto dos gabinetes refrigerados. Muitas demandas saltariam às pranchetas dos pesquisadores.

 Projetos para a ocupação harmoniosa dos principais corredores viários e seus entornos.

Explicação – A febre do mercado imobiliário longe está de apresentar sintomas de loucura. Muito pelo contrário: os investimentos são planejadamente executados para obterem o maior índice possível de retorno financeiro. Os principais corredores viários são o centro dos ataques, intensificando-se medidas de elevação do preço do metro quadrado como mecanismo retroalimentador de novos empreendimentos. A participação do Conselho de Ética no aprofundamento de análises de especialistas que seriam recrutados para mergulhar nas entranhas dos investimentos correria na mesma raia de responsabilidade na aprovação de cada projeto nas instâncias públicas. Os impactos sociais e ambientais de cada lançamento imobiliário nos eixos viários mais suscetíveis à demanda veicular seriam detalhadamente medidos de modo a não se incorrer no agravamento do quadro de desastre associado à massificação de veículos. 

 Plano Estratégico para dar completa transparência à aprovação de empreendimentos.

Explicação – Não se pode desprezar o potencial predatório na Província do Grande ABC na qual muitas áreas durante largos períodos de efervescência industrial foram utilizadas sem preocupação ambiental. As forças econômicas, mais organizadas e preparadas para contornar flácidas restrições de organismos públicos voltados à avaliação do solo, não podem jogar sozinhas o jogo do mercado imobiliário, sob pena de se repetirem novos casos do Condomínio Barão de Mauá, o mais emblemático reduto de prevaricação, e também do Residencial Ventura, em Santo André e do Marco Zero da Vergonha, do empresário Milton Bigucci. Uma lista completa de áreas suscetíveis a investigações permanentes e igualmente sujeitas a inspeção cuidadosa para aprovação de projetos de ocupação é o ponto de partida para obstar a supremacia de interesses mercantis em detrimento da cidadania. 

 Plano Estratégico à organização dos mananciais.

Explicação – Deixar que áreas dos mananciais continuem entregues ao aparato decisório público, que se mostrou deficiente e comprometedor ao longo de décadas, é convite à aniquilação desse importante pedaço da geografia regional. Na verdade, muito mais que pedaço, porque envolve mais da metade do território da Província do Grande ABC. Entre as possibilidades que se descortinam surgem medidas vinculadas à aplicação de parte da contrapartida financeira da aprovação de outorgas onerosas. Um fundo de recursos oriundos desse dispositivo, gerenciado multilateralmente pelo Poder Público, Clube dos Construtores e a sociedade civil participante ativa do mercado imobiliário, poderia ser importante ponte à multiplicação de medidas que, finalmente, colocariam um pouco de ordem na bagunça generalizada de ocupação daquele território. 

 Mapeamento completo e divulgação permanente de áreas públicas que constam da lista de licitações.

Explicação – O universo de áreas públicas levadas a leilões é uma seara desconhecida pela quase totalidade dos contribuintes. Raramente se dá a devida publicidade à disponibilização de terrenos públicos a empresas privadas e pessoas físicas em forma de licitação. Quem conhece o mercado imobiliário jura por todos os juros que são cartas marcadas. Há deliberada performance de discrição dos estamentos burocráticos públicos que garantem a legalidade de operações. Quem mais se aproxima do Poder Público acaba se dando bem porque compra geralmente a preço de banana, sempre protegidos pelo valor venal, terrenos de destinação bastante vantajosa. Somente com transparência será possível democratizar tanto a lista de terrenos quanto as disputas dos interessados. 

 Conselho Permanente de acompanhamento e reforço de organismos responsáveis pela condução de políticas públicas de operação do sistema viário. 

Explicação – Juntamente com o setor automotivo o mercado imobiliário é o principal agente da barafunda no sistema viário das grandes metrópoles. Como integrante da Grande São Paulo de 20 milhões de habitantes, a Província do Grande ABC vive a cada dia mais e mais complicações de trânsito. Os congestionamentos avolumam-se inclusive além dos horários habituais de começo de manhã e fim de tarde. Essa conta de qualidade de vida jamais vai fechar ou regredir sem sacrificar ainda mais os recursos públicos. Exceto se a sociedade como um todo, incluindo-se representantes do setor imobiliário, se juntar para, em conjunto, tomar iniciativas fundamentadas no dia a dia. Lavar as mãos é uma prática comodista que só encontra eco entre os simplistas que acreditam que torres de apartamentos signifiquem desenvolvimento econômico. 

 Prestação de contas anual em assembléia geral. 

Explicação – O Clube dos Construtores não pode ser uma torre de marfim protegida contra tudo e contra todos. O que se passa com o solo urbano é responsabilidade geral. Mais que isso: hierarquizar o grau de comprometimento da sociedade no uso e ocupação do solo implica destinar ao mercado imobiliário uma porção muito acima da média geral, juntamente com o Poder Público. Exatamente por isso a entidade deve manter as portas abertas à participação social. Compartilhar decisões que afetem a sociedade é imprescindível. 

 Conselho para analisar criticamente todos os entraves burocráticos ao desenvolvimento do setor, estabelecendo-se medidas em comum para toda a região. 

Explicação – O emaranhado da legislação torna o empreendedorismo imobiliário campo minado, principalmente para quem não tem proximidade com o Poder Público. Nesse ponto, a disputa é desigual ao opor quem tem privilégios e quem é simplesmente um número na massa de negócios do setor. Um Conselho de Desburocratização, com a participação de representantes de todos os segmentos do mercado imobiliário e também da sociedade civil, possibilitaria muito mais que o cruzamento de informações e dados que poderiam ser sistematizados para dar celeridade às decisões. O organismo também poderia colaborar para enquadramentos legislativos que iriam muito além da quebra de barreiras, mas, também, forneceria munição à implementação de medidas que o dia a dia da atividade recomenda.



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