A história da melhor publicação regional do País merece ser contada e analisada no desenho lógico de edição por edição. Por isso que, à frente de CapitalSocial, nos próximos 12 anos, vamos trazer de volta a cada mês, durante 145 meses, tudo que de mais importante para a Província do Grande ABC a revista LivreMercado imprimiu aos leitores. Decidi resgatar detalhadamente o sucesso editorial de LivreMercado, antecessora conceitual de CapitalSocial. A publicação foi comandada por mim desde a primeira edição -- de março de 1990 a janeiro de 2009.
Contei durante todo esse período com número restrito mas de alta qualidade de profissionais de jornalismo, Todos com vínculos sociais na região pela simples razão de que a execução de uma política editorial saudável tornava indispensável respirar permanentemente na área territorial objeto de narrativas e interpretações.
Está na hora de analisar o material que consta do acervo, sempre tendo os últimos 20 anos como conexão. Começaremos neste mês (mais precisamente em no máximo duas semanas) com a edição de janeiro de 1997. No mês que vem teremos fevereiro de 1997. E assim por diante. Quem se preocupa com o futuro da região não pode perder essa oportunidade de conhecer mais profundamente o passado. Até para que não seja mais surpreendido.
De março a janeiro
A competência de LivreMercado como a melhor publicação regional do País (melhor publicação inclui revistas, jornais e tudo o mais que possa ser chamado de veículo de comunicação impresso e digital) se encerrou na edição de janeiro de 2009, oficialmente a última sob minha responsabilidade. A edição final fora produzida em dezembro de 2008, quando me sobrou a missão de repassá-la ao recuperador de tributos Walter dos Santos, um fracasso como empresário editorial, e pouco tempo depois, transferida a outro empresário que não entende bulhufas de jornalismo.
O resultado só poderia dar mesmo no que deu, ou seja, no melhor destino que a publicação poderia almejar – virar uma história de sucesso que se encerrou com a saída da direção que a imaginou e a criou. O que veio depois foi um breve pesadelo editorial. LivreMercado foi descaracterizada, aviltada e solapada por amadores. Transformaram uma casa de espetáculos em espelunca populista. Não teria mesmo outro destino senão a descontinuidade.
Se os novos donos de LivreMercado fizessem tudo que recomendei antes de abrir mão do controle sem ter cedido o acervo de quase duas décadas do melhor jornalismo regional do País, provavelmente a publicação teria resistido um pouco mais e encerrado a trajetória com dignidade.
Marcada para morrer
O futuro de LivreMercado estava marcado para morrer. Foi um milagre ter resistido tanto. A Província do Grande ABC não contava e não conta com suporte econômico e contemporaneidade cultural para sustentar uma publicação daquele nível. Foi preciso deixar parte de minha vida útil num dia a dia sem fim.
Resgatar a trajetória de LivreMercado é missão a que me propus num dos dias de ócio produtivo do final do ano, começo de novo ano. Lembrei-me que LivreMercado ganhou formato físico de revista, embora já o tivesse como projeto editorial, em novembro de 1996. Celso Daniel acabara de ser eleito pela segunda vez em Santo André. Virou Reportagem de Capa, numa entrevista que eu mesmo preparei.
Fui à coleção de LivreMercado, no sótão de minha residência, e surgiu a ideia de contar o sucesso editorial da publicação a partir de janeiro de 1997. Exatamente 20 anos depois. E será assim, de agora em diante. Acho que o Ademir Medici, imbatível memorialista da região, aprovará essa ideia. Talvez uma ideia que possa ser melhorada.
Quem sabe quando chegar 2020 decidiremos resgatar a publicação a partir de outra perspectiva – os 30 anos que separariam seu lançamento, em 1990, até a edição de dezembro de 1996. Uma projeção é certa – aquelas edições não serão esquecidas. Era um jornal tabloide, em papel especialmente escolhido para durar física tanto quanto editorialmente. O mote “leitura o mês inteiro” estruturou a linha editorial desde o princípio de LivreMercado. Essa nuance não tem valor algum para os analfabetos em empreendedorismo editorial, mas é prova de planejamento a quem é do ramo da informação.
É impossível entender o presente da Província do Grande ABC sem fazer imersão no passado recente que, por sua vez, resgata de alguma forma o passado remoto. Já contamos no acervo desta revista digital com uma parte expressiva de LivreMercado. Mas, o que diferenciará aquelas matérias da análise que faremos a partir deste mês será um encaixe contextual ditado no ritmo de edição por edição. Esse alinhamento procurará vincular as raízes de reportagens e análises interdependentes de fato.
Próximos 12 anos
Não sei se o Poderoso vai permitir que possa relatar, mês sim, mês também, pelos próximos 12 anos, essa que é muito mais que uma retrospectiva da extraordinária atuação de LivreMercado. Se for colhido pelo destino no meio do caminho, seja qual for esse meio do caminho no sentido figurado ou não, não faltará alguém que atuou naquele período (só de familiares jornalistas tenho dois envolvidos naquele sucesso editorial, os quais provavelmente não se furtarão a dar continuidade ao projeto) que tratará de dar conta do recado.
Diria sem parecer esnobe (porque sou suficiente metido a besta no sentido de que não faço diplomacia em que prevaleça a hipocrisia) que os demais veículos de comunicação da região têm sorte de não contar com semelhante acervo do que fizeram ao longo dos mesmos 20 anos. Mas ficarão incomodados porque foram praticamente expectadores das grandes ousadias editoriais de LivreMercado.
Se os leitores quiserem saber qual é a verdade dos fatos, quando se parametrizam os fatos impressos e digitalizados, não tenho dúvida em dizer: demos um show de bola de compromisso com a sociedade regional. Em qualidade de abordagem e também em comprometimento com o futuro. Cometemos erros que agora justificam e explicam nosso suposto ceticismo, que não passa de realismo: erramos principalmente quando acreditamos nas instituições e nos agentes públicos, muitos dos quais incompetentes no encaminhamento ao futuro.
Surpresas aparecem
Por mais que tenha vivido intensamente o período de LivreMercado, certamente vou acabar por me surpreender com o que encontrarei na reconstrução da trajetória da publicação. Vinte anos não são 20 dias. Uma passada de olhos rápida no primeiro tomo do acervo, relativo a todo o período de 1997, deu uma dimensão interessante do que me espera como rastreador do passado. Entre entrevistados dos mais diferentes setores, registram-se muitas mortes e debandadas. Ainda não é uma sentença definitiva, mas sobreviveu a impressão de que somos uma outra sociedade, com alguns agentes que ainda constam de nichos específicos de influência. Também não é uma conclusão definitiva, mas ao folhear aquelas páginas de 1997 para preparar o voo de abordagem mensal, dei-me conta de que pioramos demais no quesito institucionalidade, carro-chefe de potenciais transformações.
Confesso que ainda não sei qual será o sentimento que me dominará na medida em que for ao passado de 20 anos a cada mês que viveremos no futuro e o confrontar com o presente mais recente, de realidades já configuradas. A anteposição de um passado registrado jornalisticamente ao presente igualmente transformado em informações e análises possivelmente provocará sentimentos múltiplos. Talvez o principal seja o teste a nossa capacidade de entender o que foi escrito e o que se deu no confronto com a realidade futura que virou presente.
Sei que tudo isso parece abstração, subjetividade, mas talvez o tempo se encarregue de provar ou de pelo menos colocar em debate até que ponto nossos fracassos regionais não se deram porque negligenciamos o potencial de obstáculos a nos desafiar permanentemente.
Explicando tudo
Traduzindo: protagonistas da vida regional nos últimos 20 anos não teriam tido suficiente maturidade para entender que o simples enunciado de iniciativas e medidas a serem implantadas não passaram de gelatinosas incursões declaratórias sem as premissas básicas de se consolidarem.
O que teremos nos próximos 145 meses de análises de LivreMercado sob minha direção editorial serão espetáculos editoriais dos quais muito me orgulho, porque decifradores da história regional e provas contundentes do quanto os mandachuvas da região, que veem de longe, não dão conta do recado. Infelizmente, vamos erguer bases sociológicas, políticas e econômicas de uma região que se fartou de cometer barbeiragens para chegar ao ponto de desequilíbrio e insensatez destes dias. O resto é pura enganação.
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)