Em agosto de 2013 criei uma revolução no modo de enxergar os administradores públicos municipais. O Observatório de Promessas e Lorotas se tornou algoz dos prefeitos da região. Propostas sem pé nem cabeça que inundavam a praça midiática regional foram contidas em níveis menos estúpidos e festivos. Sugeri a outros veículos de comunicação da região algo semelhante. Quem deu a resposta, agora em primeiro de janeiro, foi a Folha de S. Paulo. Numa ação editorial parecida, vai monitorar os passos do prefeito João Doria.
Fosse esnobe poderia recomendar às demais mídias da região que chupem o que bem entenderem, já que não tiveram a humildade de reconhecer que o Observatório de Promessas e Lorotas é um achado jornalístico. Tão achado que ao se completarem os mandatos dos prefeitos da região em dezembro último, Carlos Grana, petista de Santo André, ganhou disparadamente o título de campeão de promessas, enquanto Luiz Marinho, também petista, se consagrou campeão de lorotas.
Sem o Observatório de Promessas e Lorotas ninguém teria condições de imputar a Carlos Grana e a Luiz Marinho os respectivos títulos. A relação completa de propostas formuladas está disponível nesta revista digital. Para infortúnio deles. A avaliação de dirigentes públicos, entre tantos outros, só alcança respeitabilidade quando acompanhada de estudos. Luiz Marinho e Carlos Grana não podem se dizer perseguidos. Os registros são irretocáveis.
Sem subjetividades
No Observatório de Promessas e Lorotas que criamos há mais consistência do que o anunciado pela Folha de S. Paulo. Fixei os marcos de ação nas propostas que ocuparam o noticiário de publicações impressas e digitais da região. Retirei da métrica de desempenho enunciados sem possibilidade de mensuração. A subjetividade não pode ser utilizada como insumo desclassificatório ou embromador. Também só passaram a valer os anúncios da gestão pública municipal – quer pelo prefeito, quer por secretários – divulgados após as respectivas posses.
A Folha de S. Paulo colocou tudo no mesmo pacote. Listou mais de uma centena de propostas de João Doria durante a campanha eleitoral e após a vitória em outubro. Relacionou questões que jamais constarão da lista de CapitalSocial, casos, por exemplo, de “implantar sanitários públicos”, “resolver os problemas de buracos nas ruas”, “mudar o nome das subprefeituras para prefeituras regionais”, “entregar apartamentos populares com fogão”, “fazer o controle de indústrias poluentes”, entre tantas outras. A Folha banalizou o acompanhamento ao prefeito, mas isso não tem muita importância agora, ante a notícia alvissareira de que vai atuar como perdigueiro para manter os leitores atentos à atuação do tucano.
Numa das primeiras matérias que publiquei em julho de 2013, antes do lançamento oficial do Observatório de Promessas e Lorotas, escrevi exatamente alguns dos seguintes trechos:
Existisse na Província do Grande ABC o que os especialistas chamam de capital social, a revista digital CapitalSocial não precisaria assumir a responsabilidade de medir o grau de eficiência dos gestores públicos. O Observatório de Promessas e Lorotas, fosse a Província outra coisa senão Província, seria espécie de pacto da comunidade para acompanhar passo a passo o andar das instituições que usam e abusam do direito de ludibriar o distinto público. Como esta não é a primeira vez e muito menos a primeira iniciativa deste jornalista em procurar medir até que ponto estamos atrasados em relação ao mínimo que se espera de uma comunidade comprometida com o futuro, resta esperar que ao se plantar mais uma semente de inconformismo e de inquietação com os rumos da região encontrem-se, quem sabe num futuro não muito distante, adeptos às transformações subjacentes.
Nada mudou na região
Uma pena que durante mais de três anos do Observatório de Promessas e Lorotas o comportamento dos jornais impressos e digitais da região não se alterou. Todos sofrem do mesmo mal, de um mal incurável, porque vem de um passado igualmente negligente: acreditam que a virada de página do calendário gregoriano, como acabamos de vivenciar com a chegada de 2017, apaga o passado.
Esse modelito macunaímico de dirigir e fazer imprensa só é estrangulado quando há interesse específico por determinada matéria. A conveniência sobrepõe-se ao esquecimento e ao despreparo e ganha forma de “responsabilidade social”.
A sistematização da memória no jornalismo regional, exceto nesta revista e, num sentido diferente, só se encontra como sinônimo de restauração sociológica na coluna de Ademir Medici, no Diário do Grande ABC. De vez em quando o que temos no cardápio sazonal é a desfiguração do próprio histórico de cobertura dos jornais.
Recentemente, o Diário do Grande ABC promoveu louvação à Administração Luiz Tortorello em flagrante conflito com a média geral da cobertura da publicação nos anos de mandatos daquele prefeito de São Caetano. O passado foi atirado às traças.
Para comemorar
A chegada da Folha de S. Paulo ao Clube da Memória dos Gestores Públicos, como poderiam ser enquadradas iniciativas derivadas do Observatório de Promessas e Lorotas, é notícia que deve ser comemorada para valer. Provavelmente acelerará o processo de comprometimento dos veículos de comunicação com a sociedade na forma de rastrear sem dó nem piedade tudo o que os poderosos de plantão propagam durante os respectivos mandatos.
Houvesse legislação a impor aos Executivos de plantão maior compromisso com a sociedade, evitando-se propostas deliberadamente publicitárias, tudo seria diferente e, no embalo, a credibilidade dos próprios veículos de comunicação robusto reforço.
Aliás, não à toa incluímos no Observatório do Clube dos Prefeitos, que lançamos em dezembro, proposta relacionada à imperiosidade de se evitarem tratamentos sofismadores a questões relevantes na relação intermediada pelos meios de comunicação.
É por essas e outras que o Observatório de Promessas e Lorotas segue adiante nesta revista digital. Tenho duas certezas sobre o que desfilaremos nos próximos quatro anos: os novos prefeitos vão continuar a oferecer lantejoulas de propostas pendulares entre promessas e lorotas mas, em compensação, a massa de enganação será muito menor que a média dos antecessores, por si só reduzida a partir do lançamento dessa iniciativa.
Tomara que se configure uma terceira vertente, ausente desde o lançamento do projeto: que as propostas ganhem forma de realidade, porque os antecessores não deixaram um único exemplar catalogado na coluna de ativos.
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)