Quero saber, tenho o direito de saber, exijo saber, não transijo em saber – onde estão e o que estão fazendo os secretários de Desenvolvimento Econômico escolhidos pelos novos prefeitos da Província do Grande ABC?
Com a região pegando fogo faz muito tempo, o mínimo a esperar dos novos titulares das secretarias que deveriam ser carros-chefes das municipalidades é um plano de ação municipal e um plano coletivo, regional, para se aproximarem da sociedade. Até agora nada, exceto uma entrevista de Silvio Minciotti, de São Caetano, ao Diário do Grande ABC na semana passada. E mesmo assim bastante superficial.
Quando afirmo e reafirmo que a Província do Grande ABC desta temporada está pior que a de 20 temporadas atrás, -- como já começou a ser provado na retrospectiva que tem como base de informação e análise as edições da revista LivreMercado de 1997 -- os leitores hão de compreender que não se trata de apego saudosista.
Em janeiro de 1997, como mostramos numa das principais análises da LivreMercado de então, Santo André do recém- eleito prefeito Celso Daniel fervia na expectativa de dias melhores com a escolha de um então queridinho de instituições locais, Nelson Tadeu Pereira, egresso da venerada Rhodia, para comandar a secretaria recém-criada a pedido deste jornalista.
Tempos contrastantes
Sim, Celso Daniel criou a Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Santo André em atendimento à persistente sugestão deste jornalista, então no comando de LivreMercado. Vivíamos, portanto, a expectativa de dias institucionalmente mais produtivos.
Desta feita, no começo de fevereiro de 2017, o que temos até agora é um imenso silêncio dos escolhidos para comandar a pasta em cada Município. Quem são eles, quem são seus assessores? Qual o histórico de cada um na área? Essas são algumas das perguntas para medir o tamanho do compromisso dos prefeitos com a pasta. Entenda-se como compromisso algo elástico, como uma efetiva proposta de revitalização da economia municipal e regional.
O que chega até mim --embora não queira, acabo por dar ouvidos porque não há contrapontos -- é que os atuais secretários desempenham funções que nada têm a ver com o futuro da região, considerando-se que o futuro da região passa prioritariamente por estudos e ações desta pasta.
Trata-se, a maioria dos secretários escolhidos, de agentes político-partidários decididos a lotear as vagas entre cabos eleitorais. Não duvido.
Tempos dissuasivos
Contasse com disposição do passado, quando ainda acreditava no Papai Noel do engajamento de gente comprometida para valer com o futuro da região, não teria dúvidas em realizar encontro entre os secretários. Iria sabatiná-los sobre questões essenciais ao desenvolvimento da região. Faria um teste ao vivo e em cores, com as facilidades que a tecnologia oferece. Iria prensá-los contra a parede de preparo técnico para responder questões que precisam ser respondidas.
Ocupar Secretaria de Desenvolvimento Econômico apenas e exclusivamente para exibir status e mostrar aos mais próximos que está entre os principais homens de cada prefeito não passa de estupidez. Aqueles que já experimentaram esse veneno sabem que deixar as prefeituras com o rabinho de planos descartados entre as pernas é experiência comum. Muitos não se recuperaram jamais.
Fora Silvio Minciotti, que respeito porque é competente e tem talento intelectual para se adaptar às mais variadas funções públicas, não distingo qualquer outro secretário de um cenário que não seja de dissuasão à perspectiva de melhora municipal e regional. Não vou nominá-los porque, confesso, não tenho e nem estou preocupado, por enquanto, em tê-los todos na memória.
Sei que sei que há algumas interrogações, como a escolha de Orlando Morando em São Bernardo. O ex-vereador Hiroyuki Minami é dessas pessoas cuja empatia pode até inibir criticas, mas daí a conferir-lhe aval à função de secretário de Desenvolvimento Econômico vai enorme diferença.
Tempos esgotados
Em Santo André, o também ex-vereador Ailton Lima tem pretensões políticas em excesso para lidar com a pasta, considerando-se perspectiva de trabalho de pelo menos quatro anos. Sem contar que também não é do ramo. A condição de empresário do setor gráfico não lhe confere prerrogativa de controle dos cordéis de planejamento da área. Tanto quanto o fato de este jornalista morrer de amores por cachorros não me dá a menor possibilidade de arvorar-me veterinário.
Já me perguntaram muitas vezes sobre a possibilidade de virar secretário da pasta na região. Mais que isso: já me perguntaram se não me convidaram para essa festa. Sempre respondo que sondagens foram feitas, mas apenas um então candidato em Santo André expressou vontade de contar comigo na secretaria. Minha resposta sempre e sempre será não. Mil vezes não. A razão é simples tanto quanto a explicação por ter renunciado ao compromisso com o empresário Ronan Maria Pinto, há quase dois anos, quando estive no Diário do Grande ABC como consultor editorial e ombudsman: não acredito na possibilidade de executar o trabalho ao qual estaria preparadíssimo.
Traduzindo: como o tempo mostrou e provou ao chamuscar o prestígio de tanta gente aparentemente capacitada a dirigir Secretaria de Desenvolvimento Econômico, as prefeituras da Província do Grande ABC não têm vocação para pensar no futuro.
Tempos conflitantes
A pasta é um tratado com o horizonte de médio prazo, enquanto os prefeitos só pensam no passo seguinte. Não abro mão do futuro como elemento catalizador do empenho imediato. Passei 35 anos (do total de 52 que se completam nesta temporada) como jornalista no Diário do Grande ABC e na revista LivreMercado com os pés no presente e a cabeça no futuro.
Estendi uma linha conceitual que exigia o dia seguinte como prova de que não estava a caminhar em falso. Tanto no Diário do Grande ABC de dois anos atrás, quando ali estive por sete meses, como numa eventual secretaria de Desenvolvimento Econômico, caminharia rumo ao desfiladeiro de desilusão.
Conto aos mais chegados que durante 35 anos não vi a cor de shopping center, não senti o ambiente de clínica médica, não ouvi os latidos de cachorros, não me diverti com os meus filhos -- entre tantas coisas das quais tive de abdicar em nome do jornalismo.
Quem é da profissão e leva a sério o que faz sabe que não sou espécime raro. Mas tudo valeu a pena entre outras razões porque há um legado a ser cobrado e conferido. Ser secretário de Desenvolvimento Econômico como tantos já foram na Província do Grande ABC é um atestado de burrice, uma prova de que se faz tudo para buscar sucesso na política ou simplesmente uma paixão raríssima de ser reconhecida ante a profusão de exemplos de que se trata de um cargo típico de moeda de troca. Quem conseguir transformar-se em exceção (e não temos nenhum caso concreto após 20 anos dessa experiência no organograma das prefeituras) deverá se sentir privilegiado.
Tempos sombrios
Estava pronto para editar este texto quando, nesta manhã de terça-feira, chama-me a atenção a entrevista publicada na versão digital do jornal Repórter Diário com o secretário de Desenvolvimento Econômico de Santo André, o ex-vereador Ailton Lima. O que li confirma a suspeita de que o prefeito Paulinho Serra escolheu o homem errado para tentar reconduzir Santo André a uma reviravolta.
Ailton Lima falou mais de politica do que de economia na entrevista (pelo menos na versão impressa que consta do site) e repetiu duas ladainhas que já cansaram a beleza, porque inviáveis.
A primeira repetição de velhos erros de antecessores é prometer atrair empreendimentos a Santo André utilizando o ferramental da redução do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). A segunda é inibir os embaraços burocráticos à instalação de empreendimentos.
Por que Ailton Lima começa mal? Incentivos fiscais são algo tão complexos que não permitem inventividades. Rebaixar IPTU a novos empreendimentos significa promover guerra fiscal interna absolutamente ilegal, quando não suicida. Afinal, além de tudo, pode comprometer o desempenho de Santo André na Lei de Responsabilidade Fiscal. Sem contar, também, que o valor relativo do imposto nos custos fixos é ínfimo e perde de goleada para outros poderosos mecanismos de atratividade.
Quanto à desburocratização, é uma ladainha cujos efeitos estão subordinados a um feixe de vantagens comparativas que Santo André não tem. Já estou vendo um festival de estatísticas manipuladas para propagar a ideia de que Santo André vive uma febre de novas empresas. Já conheço essa história. E não estou disposto a aceitá-la sem reagir bravamente. A sociedade não pode ser mais uma vez enganada.
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)