Imprensa

Será que Morando consegue
passar por um teste de fogo?

DANIEL LIMA - 16/05/2017

Vou preparar no final de semana uma Entrevista Especial com o prefeito Orlando Morando, de São Bernardo. Tomei a decisão nesta manhã, ao ler a entrevista adocicada do Diário do Grande ABC com o tucano. Não será uma “Entrevista Indesejada”, cardápio rigoroso de nossa dieta crítica. “Entrevista Especial” é mais amena, menos invasiva, por assim dizer. Mas é um teste de fogo para checar até que ponto Orlando Morando tem mesmo o que dizer e o que fazer longe dos holofotes condicionados. 

Isso significa que não farei ao prefeito dos prefeitos da Província do Grande ABC questionamentos éticos. Como seria o caso, entre outros, de comparecer e, mais que isso, enaltecer investimento imobiliário de um empresário que, com outros parceiros, para não dizer outra coisa, infringiu a legislação sobre licitação pública e arrematou área municipal de forma irregular, a preço de banana. 

O que vou encaminhar ao prefeito Orlando Morando serão problemáticas de São Bernardo e da região como um todo. Os leitores vão ter acesso à Entrevista Especial na próxima segunda-feira, simultaneamente à remessa do material por e-mail ao tucano. 

Não tenho pretensão de ser fonte exclusiva de jornalismo crítico na Província do Grande ABC. Aliás, gostaria apenas de ser uma das fontes confiáveis nesse aspecto no jornalismo regional. Estou quase que isolado nessa tarefa. Sazonalmente vejo alguma coisa que se assemelha ao ritual de independência que deve prevalecer nos meios de comunicação. Ouvir o que tem a dizer o prefeito de São Bernardo sobre determinadas políticas públicas é o mínimo à prática jornalística. Acredito que o tucano está preparado às respostas. Resta saber se terá poder de convencimento. 

Momento inadequado 

A entrevista que o Diário do Grande ABC publicou hoje não poderia ter sido contextualmente mais inapropriada. Não bastasse o tom festivo que assinalou cada pergunta e as respectivas respostas, como se não houvesse nada de importante na região a ser encaminhado num questionamento prospectivo, o jornal contempla seus leitores, na mesma edição, com duas faces de uma realidade dura e cruel, porque fora do controle panglossiano. 

A primeira diz respeito a 500 demissões de trabalhadores de uma metalúrgica, a Tupy. A segunda de novo esboroamento da logística da Avenida dos Estados, na forma de desmoronamento parcial de um trecho da margem. 

As duas situações contrastantes em relação ao discurso de Orlando Morando são emblemáticas de uma Província do Grande ABC que não só perdeu o rumo econômico como também degringolou em sensibilidade pública. 

Não vou entrar em detalhes sobre a entrevista-bola-levantada do Diário do Grande ABC com Orlando Morando. Seria perda de tempo. Questões nacionais foram mal concatenadas nas respostas do prefeito. E os avanços nas investidas temáticas locais revelam provincianismo para quem entende que a regionalidade em múltiplas dimensões, mas sempre levando em conta que a economia é o centro catalizador e irradiador de transformações, simplesmente não consta do léxico de modernidade do prefeito de São Bernardo. 

Exemplar de novelho? 

Talvez Orlando Morando devesse prestar atenção a um artigo do jornalista e acadêmico Eugênio Bucci, impresso ainda outro dia no jornal Estadão. Ele criou quatro neologismos para estes tempos bravios da política, da economia e do Sistema Judiciário. Um dos quais é “novelho”, que significa a leva de novos políticos que saltam no cenário nacional contaminadíssimos por velhas práticas das raposas que parecem ter fim próximo. 

Quando o Diário do Grande ABC puxa para o título da entrevista com Orlando Morando uma frase do prefeito de São Bernardo (“PSDB apostar no velho no Estado será reprovado”), é inescapável remeter o pensamento ao próprio autor da frase, como bumerangue. 

Isso não quer dizer que tenha este jornalista posição definitiva sobre a possibilidade de Orlando Morando ser um dos exemplares de “novelho”. Mas há encaminhamento nesse sentido. Tanto Morando quanto Paulinho Serra, prefeito de Santo André, também incensado pelo jornalismo brando, têm muito a provar em sentido contrário, ou seja, de que não são velhos travestidos de novos. 

Os leitores estão convidados a arquivarem a entrevista publicada hoje no Diário do Grande ABC e a compararem com a que vou remeter ao prefeito. Esse é um jogo democrático, transparente, de contribuição com a sociedade que demanda qualidade do jornalismo. 

Convencer, eis o problema 

Como sou claro e transparente, duvido que Orlando Morando consiga convencer nas respostas que espero receber. Muitas das quais serão verdadeiros desafios que deverão ser bem encaminhados a soluções durante o mandato atual. 

Antes de pensar em virar governador do Estado (o que não seria nada extraordinário, considerando-se os destroços políticos atuais e a mediocridade do ocupante do cargo, incapaz, entre outros desafios, de botar ordem na Região Metropolitana de São Paulo) acredito que Orlando Morando deveria credenciar-se tecnicamente a tanto. 

Por enquanto, não vejo nada nesse sentido. Muito pelo contrário. Morando está a repetir enredos mais que surrados de antecessores, inclusive com perda de terreno para alguns deles.  



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