Iniciamos com esta edição a prometida análise da Entrevista Especial com Orlando Morando, prefeito de São Bernardo e também titular do Clube dos Prefeitos do Grande ABC. E começamos por destrinchar a resposta sobre os desdobramentos da inserção do trecho sul do Rodoanel em parte do território da região. Acompanhem a pergunta de CapitalSocial, seguida da resposta de Orlando Morando e completada com o que chamo de “meus comentários”.
A pergunta de CapitalSocial
O trecho sul do Rodoanel teve no senhor, então deputado, o principal agente divulgador e propagador de efeitos extraordinários que se dariam no campo econômico em benefício da Província do Grande ABC. O que temos, passados muitos anos, é a comprovação material, estatística, formal, de que a obra, entre outros fatores, por conta de características funcionais, afugentou e transferiu investimentos. Já não passou da hora de discutir mudanças com instâncias do governo do Estado? A então chamada “melhor esquina do Brasil” se tornou uma fraude.
A resposta de Orlando Morando
O trecho Sul do Rodoanel teve muitos benefícios à região, comprovadamente se tornando um fluxo que viabilizou negócios e avanços aos municípios. Algo que pauta meu trabalho é a discussão constante por melhorias em diversos segmentos e seus programas vigentes. Na ocasião exercia mandato de deputado estadual e era integrante da Comissão de Transportes na Assembleia Legislativa. Contribui para que a obra se tornasse realidade. O Rodoanel potencializou o Grande ABC como uma das maiores esquinas do Brasil.
Meus comentários
Uma análise que publiquei no final do ano passado nesta revista digital sintetiza textos anteriores sobre estragos provocados na economia da região pelo traçado do Rodoanel Mário Covas: “Rodoanel é cada vez mais presente de grego regional” – enunciou o título. Daí, é inconcebível que o titular do Paço Municipal da Capital Econômica da Província do Grande ABC não tenha conhecimento do histórico problemático. É incrível que auxiliares na Secretaria de Desenvolvimento Econômico não tenham sido consultados sobre isso. E se o foram, é inimaginável que tenham sido coniventes com a fantasia do prefeito. E seria ainda mais incrível Orlando Morando, o maior propagador da inserção da obra na geografia regional, desconhecer os resultados da obra.
O Rodoanel é um dos temas prioritários de CapitalSocial. A importância logística, com repercussão econômica e social, jamais poderá ser desconsiderada em qualquer análise que trate a Província do Grande ABC com responsabilidade. Mais que isso: jamais poderá deixar de constar de estudos de competitividade da região.
Ao dedicar à resposta soma de palavras ou caracteres aquém da pergunta formulada por CapitalSocial, Orlando Morando deixou escapulir duas especulações pertinentes: ou está crente de que o que afirmou é tudo de conhecimento sobre o Rodoanel ou tergiversou sobre o desastre do Estado ao conceber um projeto sem levar em conta aspectos econômicos muito além da logística – como analisamos em tantas outras oportunidades.
Escrevi em dezembro do ano passado que os oito municípios à Oeste da Região Metropolitana de São Paulo continuavam a dar um show de bola na Província do Grande ABC. “O anúncio e a construção do trecho oeste do Rodoanel Mário Covas, inaugurado seis anos antes do trecho sul que tangencia a Província do Grande ABC, e também muito antes do trecho leste, ainda mais distante do centro econômico da região, tornaram-se um divisor de águas. A realidade que projetamos há muito tempo com base em dados técnicos (...) é que o Rodoanel virou um presente de grego para quem mora na região” – escrevi.
Mais adiante, prossigo na análise. “Desde 2002, quando foi inaugurado o trecho oeste do Rodoanel, a economia da Grande Osasco supera para valer e sem dó a economia da Província do Grande ABC. Aquele que foi o último ano do segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso apresentou a Província com superioridade de 23,81% sobre a Grande Osasco no medidor do PIB, que pode ser sintetizado como referência maior de produção de riquezas. (...) Doze anos e três trechos depois do Rodoanel Mário Covas, o G-8 liderado por Osasco e também por Barueri passou a contar com PIB nominal (relativo a 2014, o mais atualizado) de R$ 138.382.863 bilhões. Nada menos que 13,15% do PIB da Província do Grande ABC de R$ 120.188.959 bilhões” – escrevi em dezembro do ano passado.
Também lembrei naquele texto que a economia da Grande Osasco avançou sempre em termos nominais a velocidade 43,13% maior no período de 12 anos. “Ou seja: a cada nova temporada, a Grande Osasco avança 3,60% a mais na velocidade de produzir riqueza em relação ao conjunto dos sete municípios da Província” – escrevi.
Numa Entrevista Especial em setembro de 2009, na condição de deputado estadual, Orlando Morando concordou com a ponderação deste entrevistador sobre os limites do Rodoanel: “Só com a chegada do trecho sul não existe ferramentas para fazer a reversão da perda do Valor Adicionado na nossa região”, respondeu Orlando Morando. “O discurso de entusiasmo que o parlamentar costuma propagar ganha tons de comedimento quando se coloca o paradoxo de que o traçado sul tanto pode favorecer como prejudicar o fluxo de investimentos econômicos de produção no Grande ABC” – escrevi há quase oito anos.
Leiam com atenção a resposta do então deputado estadual à primeira pergunta daquela Entrevista Especial (como agora, portanto) sobre condicionantes ao sucesso do traçado do trecho sul do Rodoanel:
“Não pode se descaracterizar que a chegada do trecho sul do Rodoanel ao Grande ABC é de vital importância para o desenvolvimento econômico. Também não quero acobertar os riscos. Agora, a responsabilidade dos riscos não recai sobre o beneficio da obra e sim sobre a falta de agilidade ou a inoperância das administrações municipais que seguramente terão que ousar para que o Rodoanel não se torne uma via de duas mãos quanto a levar as riquezas do Grande ABC. Resumindo, o Rodoanel é sim o grande passaporte do desenvolvimento econômico das últimas décadas do Grande ABC, porém se não tivermos administrações ousadas, com coragem de discutir carga tributária, adequação logística interna dos municípios, plantas de produção à altura do ABC, seguramente poderemos perder para outras cidades, inclusive do Interior, que, também com o Rodoanel, passarão a estar perto do Grande ABC. Acima de tudo destaco o Rodoanel como obra fundamental e de vital importância para o crescimento econômico – afirmou Orlando Morando naquela Entrevista Especial já distante no tempo.
Seis meses após assumir a Prefeitura de São Bernardo, e mesmo alertado por CapitalSocial sobre as complicações econômicas geradas pelo trecho sul do Rodoanel -- sobretudo no campo de investimentos industriais -- não há notícia alguma de efetivo interesse de Orlando Morando atacar para valer os danos colaterais da obra, tanto à frente do Executivo do Município mais poderoso da região como no comando do Clube dos Prefeitos.
Por isso, a resposta à Entrevista Especial de CapitalSocial é espécie de desprezo ao interesse público subjacente no trabalho jornalístico.
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13/11/2024 Diário: Plano Real que durou nove meses (33)