Imprensa

Justiça do Trabalho: crítico da
Exame estaria frito com Jarbas

DANIEL LIMA - 22/01/2018

Faço questão de colocar o leitor diante de uma encruzilhada interpretativa  -- e decisória -- para ver até que ponto estamos lidando com gente apetrechada intelectualmente ou com eventuais negligenciadores do direito sagrado da Liberdade de Imprensa e da liberdade de opinião. Vamos ao teste?

Se um Milton Bigucci qualquer houvesse denunciado este jornalista em fevereiro de 2010 (portanto há oito anos) em contestação ao que publiquei num artigo sobre a Justiça do Trabalho e, coisas do destino, fosse sorteado o meritíssimo da 3ª Vara Criminal de Santo André, doutor Jarbas Luiz dos Santos, teria eu sido condenado à prisão? Claro que sim. 

Essa dedução é lógica. A avaliação considera a sentença que o meritíssimo assinou sem conhecimento algum sobre a prática de jornalismo e, principalmente, em frontal desrespeito ao devido processo legal, como aponta o advogado Alexandre Marques Frias. Por isso, me sentenciou a oito meses em regime semiaberto. Tudo porque escrevi óbvias verdades sobre a atuação do Clube dos Construtores do Grande ABC. 

Escrevi em meio a mais de 90 mil caracteres selecionados pela força-tarefa de advogados de Milton Bigucci que aquela entidade era mequetrefe e chinfrim. Apontei série de informações e fatos que consubstanciavam a constatação em geral de domínio público. Tanto que tempos depois Milton Bigucci, após reinado de mais de duas décadas, foi apeado da presidência. 

Se ao mesmo meritíssimo de Santo André ou a eventuais réplicas houver a incumbência de julgar o também jornalista José Roberto Guzzo pelo que escreveu na edição desta quinzena sobre a Justiça do Trabalho na revista Exame, certamente o destino seria muito mais rigoroso. Sorte não haver prisão perpétua no País.

Sem mais esticamentos, reproduzo intercaladamente o texto que escrevi em fevereiro de 2010 sob o título “Quando a Justiça do Trabalhador será do empreendedor? ” e o artigo de Guzzo na Exame, sob o título “Uma ausência que não é sentida”. Antes, uma sugestão: quem foi mais ácido: Guzzo, decano da melhor revista de economia produzida no Brasil, ou este jornalista, comandante editorial de “LivreMercado”, consagradamente a melhor revista regional do País durante duas décadas?

Primeiros trechos do artigo deste jornalista 

 Numa baita coincidência, preparava-me para escrever sobre a Justiça do Trabalho geralmente mais sensível às demandas dos empregados, quando leio no jornal Valor Econômico desta sexta-feira uma reportagem cujo título é autoexplicativo: “Empregados pagam dano moral a empresas”. Leio com avidez a matéria e chego à seguinte conclusão: há juízes cada vez mais preocupados sim com uma equivalência de forças entre reclamações de empregados e argumentos de empresas, mas o universo de resultados que acolhem representantes do capital é muito ínfimo. Por experiência própria, e pela oportunidade que a vida me oferece de escrever em nome de pequenos negócios, afirmo com todas as letras: a Justiça do Trabalho transforma-se em Justiça do Trabalhador porque é presa de quadrilhas organizadas deliberadamente voltadas para extorquir empreendedores. Tudo sob a tutela da legislação getuliana anacrônica, detalhista e irreal, como prova a geração de mais de dois milhões de ações trabalhistas por ano, um recorde nacional. Desse total, 99,99% representam interesses supostamente contrariados de empregados. Segundo trecho do artigo deste jornalista. É tão cínico o conjunto de reclamações que ex-empregados utilizam para dar vazão a incursões sustentadamente desonestas que sobra a certeza de que há no mercado fórmulas prontas para ganhar ares de veracidade. Esse tal de “assédio moral”, então, virou farra de boi sonso. Como são coitadinhos os ex-funcionários! Eles transmitem a sensação de que viviam em campos de concentração, mesmo que fotos e filmagens provem o contrário em eventos de aniversário e de confraternização. Consultem a Justiça do Trabalho e vejam com os próprios olhos como os empreendedores são desumanos. Há uma epidemia de assediadores morais, enquanto em horário nobre de televisão (e aqui não vai juízo de valor algum) os Big Brothers falam palavrões com a naturalidade de quem respira.  

Primeiros trechos do artigo de Guzzo 

 O Ministério do Trabalho, como é do conhecimento de quem acompanha o noticiário, andou vago por esses dias, como resultado de uma miserável sucessão de atos de inépcia por parte do gabinete da Presidência da República e de surtos repetidos de demência por parte de integrantes do Poder Judiciário. O que mais chamou a atenção na história foi o seguinte: nenhum trabalhador brasileiro honesto sentiu a menor falta do ministro do Trabalho durante esse tempo todo. Tanto faz que haja um ministro do Trabalho ou que não haja nenhum — não muda nada, e a suspeita, mais do que razoável, é que não mudaria nada jamais, até o fim dos tempos, se o Ministério do Trabalho nunca mais voltasse a ter um ministro. Ou, melhor ainda, que não houvesse mais o próprio ministério em si. Para que mais esse mamute na Esplanada dos Ministérios? Ele, como tantos outros primos, só serve mesmo para seus donos roubarem o Erário público, cevarem manadas inteiras de fiscais que vivem de extorquir empresas e criar novas regras para dificultar cada vez mais a criação e a manutenção de empregos neste país.

Mais trechos do artigo deste jornalista 

 O puritanismo seletivo de ex-empregados é tão sinceramente emocionante quanto a indignação de emissoras de rádio em demagógica defesa de comportamento conservador de caça às bruxas aos desiguais. O marketing travestido de intolerância pavimenta com requinte um modelo de jornalismo pernicioso. É impressionante como tudo se repete nas peças trabalhistas. São enredos de mesmices enganadoras sem que haja na legislação nada que leve os fraudadores dos fatos à responsabilidade civil. Lembra-me um advogado amigo que há sim a contrapartida às mentiras industrializadas por ex-empregados, mas as dificuldades operacionais, os custos para o enquadramento criminal dos meliantes reclamatórios e o tempo sempre prolongado para decisões são tão complicados, dispendiosos e cansativos que nem vale a pena a iniciativa. 

Mais trechos do artigo de Guzzo 

 A inexistência dessa geringonça que os devotos do “Estado forte” gostam de chamar de “histórica”, porque foi fundada por São Getúlio Vargas 88 anos atrás, pouparia o Brasil das cenas, impróprias para todas as idades, que acabam de ser exibidas durante esta última vacância. O presidente da República é proibido por um aliado de nomear o ministro do Trabalho que tinha escolhido. Tenta então nomear uma deputada, e descobre que ela tinha sido condenada em duas ações trabalhistas — o que não é pecado para ninguém, salvo para quem vai assumir, justamente, o raio do Ministério do Trabalho. Um juiz de Niterói proíbe sua posse, uma aberração jurídica extravagante até mesmo no Brasil sem lei de hoje. 

Mais trechos do artigo deste jornalista 

 O puritanismo seletivo de ex-empregados é tão sinceramente emocionante quanto a indignação de emissoras de rádio em demagógica defesa de comportamento conservador de caça às bruxas aos desiguais. O marketing travestido de intolerância pavimenta com requinte um modelo de jornalismo pernicioso. É impressionante como tudo se repete nas peças trabalhistas. São enredos de mesmices enganadoras sem que haja na legislação nada que leve os fraudadores dos fatos à responsabilidade civil. Lembra-me um advogado amigo que há sim a contrapartida às mentiras industrializadas por ex-empregados, mas as dificuldades operacionais, os custos para o enquadramento criminal dos meliantes reclamatórios e o tempo sempre prolongado para decisões são tão complicados, dispendiosos e cansativos que nem vale a pena a iniciativa. 

Mais trechos do jornalista Guzzo 

 O governo, em pânico, larga as decisões finais para os mais altos tribunais da nação — e, para completar, constata-se que a ministra nomeada tem como seu suplente na Câmara dos Deputados um colega que foi condenado a 12 anos de prisão por estupro. É, ainda por cima, irmão do ex-governador Anthony Garotinho, ele próprio um ex-presidiário beneficiado pelo programa “Meu Alvará de Soltura, Minha Vida”, do ministro Gilmar Mendes. Para que todo esse vexame? Só para ter mais um (ou mais uma) parasita com carro oficial em Brasília, onde sua ausência não é sentida por nenhuma pessoa séria? O único efeito prático de não haver um ministro do Trabalho é que deixam de ser assinadas portarias, e despachos, e ofícios, e o resto de toda essa infame papelada que não serve para coisa nenhuma — ou melhor, serve, e serve muito, mas apenas aos interessados em arrancar do Tesouro Nacional algum proveito para si mesmos.

Novos trechos do artigo deste jornalista 

 Já que a Justiça do Trabalho é por natureza protetora do trabalhador, daí derivando aberrações de ex-empregados facilmente capturáveis por advogados em busca de novos vilões, por que então não temos a Justiça do Empreendedor? Ou estaria equivocado ao sustentar que a Justiça do Trabalho de fato é a Justiça do Trabalhador e que, portanto, caberia perfeitamente no ordenamento jurídico uma instância que se contrapusesse à vertente do trabalho? Um exagero provocativo deste jornalista? Claro que sim, mas com a finalidade reta e direta de sustentar inconformismo. Sei que vão argumentar que o arcabouço jurídico do País já contempla tudo isso, mas no âmbito laboral, repito, a contaminação paternalista do princípio de que o trabalhador tem sempre razão acaba por se manifestar na maioria dos casos, por mais senso de Justiça e atenção que os juízes dediquem a cada ação reclamatória. Chegamos a tal ponto de refinamento que a maliciosidade dos defensores de ex-empregados consagra a máxima de que o melhor mesmo é inflar a reclamação trabalhista como fórmula inescapável para a obtenção confortadora de parte das demandas. É o mesmo princípio dos vendedores de quinquilharias em faróis. Eles pedem valores astronômicos e os reduzem à medida que o motorista mantém desinteresse na compra. A diferença é que a decisão final compete exclusivamente ao motorista e os vendedores não têm às costas gente especializadíssima numa nova modalidade de extorsão com proteção constitucional. A Justiça do Empreendedor poderia ser célere e igualmente penalizadora. Não faltariam questões que colocariam ex-empregados em dificuldades. Não faltam modalidades de delitos corporativos, muitos dos quais só emergem aos olhos, ao coração e principalmente aos bolsos dos empreendedores muito tempo após as ocorrências. As quadrilhas organizadas corporativas protegem cuidadosamente seus membros. Distribuem benesses aos mais próximos e ameaça os mais resistentes de demissão. Qualquer semelhança com o modus operandi de quadrilhas organizadas nas periferias metropolitanas não é mera coincidência.

Novos trechos do artigo de Guzzo 

 Mas tudo que está dito aí acima poderia ter sido escrito em grego, caso alguém imagine que um único político brasileiro possa encontrar alguma coisa de estranho nessa alucinação toda. Para eles, é justamente essa farinata disforme que serve como pão nosso de cada dia. De seu ponto de vista, a única função que o Brasil tem hoje é prover, com o dinheiro dos impostos, sua sobrevivência e prosperidade — sua, das famílias, dos amigos e dos amigos dos amigos.  

Últimos trechos do artigo deste jornalista 

 Vou citar alguns exemplos que mostram o quanto empregados não são sempre anjos nas relações trabalhistas e que nem por isso pagam por seus crimes, porque, repito, as dificuldades de denúncia e de atendimento dessas mesmas denúncias demandariam recursos financeiros e tempo geralmente incompatíveis para quem precisa manter vivo um pequeno empreendimento sem sair do foco do produto ou serviço prestado. Chefias acumpliciadas com funcionários na industrialização de horas extras, por exemplo? Chefias associadas com funcionários para infiltrar cheques em branco em meio a cheques previamente conferidos para que assinaturas inadvertidas ganhem a forma de desvio financeiro tanto da empresa em questão como da conta pessoal do diretor. Desvios de materiais de escritório em proporções escandalosas. Uso indevido de computadores e telefones para interesses pessoais que passam ao largo do dia-a-dia corporativo. Divisionismos internos por razões pessoais que implicam em quebra de produtividade no trabalho. Associação com bandidos externos para programar assalto de vale-refeição e vale-transporte, de modo a configurar tecnicamente apenas mais um caso de segurança pública. Desrespeito a clientes e fornecedores com promessas, mentiras, manipulações e uso de nomes de terceiros para ameaças de retaliação. São tantas as artimanhas de empregados que contribuem para a derrocada de empreendimentos -- e que não se desdobram juridicamente porque, além de protegidas por chefias manipuladoras é preciso correr atrás de recursos para manter o negócio funcionando -- que só mesmo as dificuldades de se integrarem num plano de valorização corporativa na Justiça do Trabalho explicam o desfecho condenatório na maioria das ações trabalhistas. Fossem as instituições empresariais menos inoperantes e caso se dedicassem a modernizar as questões trabalhistas como ponto de honra para uma reação conjunta de denúncia dos modelos descaradamente fraudadores de reclamações xerocopiadas, quem sabe a Justiça do Trabalho seria uma cidadela de amadurecimento das relações entre empregadores e empregados, não, invariavelmente, apesar de todo o esforço e competência dos juízes, a fortaleza de abusos que se perpetuam impunemente.

Últimos trechos do artigo de Guzzo 

 Com exceção da equipe econômica, das Forças Armadas, do Itamaraty e de um ou outro órgão que exerce funções de Estado verdadeiras, o governo brasileiro, como sempre, continua servindo só para duas coisas: roubar e mentir. Sua diferença com o passado recente é que os governos imediatamente anteriores, de Lula e de Dilma Rousseff, roubavam e mentiam mais; fora isso, a essência é exatamente a mesma em todos eles, e não apenas na área do Poder Executivo. O Legislativo é um bazar como a Rua 25 de Março em São Paulo ou o Saara no Rio de Janeiro — com a diferença de que nesses dois lugares os padrões de honestidade comercial são incomparavelmente mais elevados. O Judiciário é uma zona de catástrofe da qual qualquer brasileiro decente reza para ficar o mais distante possível. Trancaram o Brasil pelos três lados.



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