Imprensa

O que une morte de Celso
Daniel e de Marielle Franco?

DANIEL LIMA - 16/03/2018

Se houver alguma coisa, desconheço. Talvez em comum mesmo, analisados detidamente os dois casos (o primeiro já consolidado e o segundo em busca de um enredo disputadíssimo), apenas a exploração política em ano eleitoral parece associá-los. Mas mesmo assim a eventual similaridade não resistiria. Tanto agora quanto antes a esquerda reagiu como de costume. Mas os desdobramentos não seguirão a mesma cartilha mais que manjada e por isso mesmo cansativa. Tudo porque o contexto é outro. Sequestro é uma coisa; outra coisa -- ainda não desvendada -- é outra coisa. Com perdão da redundância. 

Ou alguém se esqueceu que naquele janeiro de 2002 o PT foi para cima do governo Fernando Henrique Cardoso e de Geraldo Alckmin para cobrar ações contra a violência urbana às alturas, sobretudo na metrópole paulistana coalhadíssima de sequestradores? 

Em seguida, como se sabe, os tucanos paulistas deram o troco ao criarem uma força-tarefa do Ministério Público Estadual para fabricar uma versão inteiramente diferente, jogando a bomba no colo petista de falcatruas administrativas em Santo André e, bisonhamente, retirou Celso Daniel das traquinagens, algo que o tempo provou patético. Não havia santo na gestão petista. 

Mão na cumbuca 

Leitores me cobram posicionamento sobre o caso Marielle Franco. Querem que faça desse assassinato o que fiz do caso Celso Daniel. Ou seja: que ofereça um manual do perfeito investigador. Prefiro que os perfeitos idiotas se manifestem apressadamente. Não meto a mão nessa cumbuca. 

O caso Celso Daniel é minha especialidade por obra do destino geográfico, por assim dizer. Não sei nada sobre a morte do Toninho do PT, então prefeito de Campinas. Não seria a vereadora Marielle Franco que me meteria numa arapuca. Não vou vulgarizar o jornalismo com palpites a dar com pau, como muita gente faz nessas ocasiões. 

Quantos dos fundamentalistas que viram crime político no caso Celso Daniel – e seguem vendo até hoje, apesar de todas as provas em contrário – pegam microfones e teclados para ditar normas de ética e moralidade? 

Perdendo prestígio 

Há especialmente um – vou dar o nome na sequência porque não tenho medo de cara feia – a propagandear respeito aos preceitos legais, à Constituição e escambau (sempre em defesa de seus bandidos políticos prediletos) e lá atrás, no caso Celso Daniel, simplesmente aliou-se aos extremistas de direita que viram o assassinato como acerto de contas dos petistas. 

Sim, estou falando de Reinaldo Azevedo, um dos exemplos mais contundentes do quanto um patrimônio profissional é jogado na lata do lixo por conta de enviesamento político-partidário. Até hoje Reinaldo Azevedo se refere ao caso Celso Daniel com a sabedoria estúpida de quem não tem a menor ideia do que ocorreu, do que foi investigado e, sobretudo, exercitando contradição autofágica de dar foro de legitimidade e legalidade às investigações paralelas do Ministério Público Estadual, totalmente em confronto com as investigações de forças-tarefas da Polícia Civil de São Paulo e de agentes da Polícia Federal. Tudo sob governos tucanos. 

Ao contrário do caso Celso Daniel, não vou selecionar e arquivar matérias de jornais e revistas e agora também de sites sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco. Vou guardar o básico. Sobre a morte de Celso Daniel tenho páginas e páginas principalmente de jornais que servem como munição pesadíssima ao desmonte da farsa de crime de encomenda. 

Experiência conta 

Uma das grandes vantagens que o tempo nos oferece como profissional de comunicação é o preparo a resistir a pressões de forças que se pretendem monopolistas de verdades construídas ao sabor de interesses diversos, sobretudo partidários. 

Mais que a experiência profissional, um dos pontos dessa tessitura produtiva sem contaminações, está a isenção ideológica. Sou um privilegiado em meio a uma categoria que raciocina largamente com base num emaranhado logístico-cultural de teorias econômicas e sociais que a escraviza, porque amarrada a dogmas.

Não sofro nenhum tipo de constrangimento ao escrever sobre o caso Celso Daniel, retirando-o do arcabouço político e tratando-o no campo do qual jamais deveria ser retirado, a criminalidade em geral, e tampouco com a constatação de que o sindicalismo cutista é uma das principais explicações ao descalabro econômico da região ao longo dos anos. Juntamente com os oito anos destrutivos de Fernando Henrique Cardoso. 

Quem mistura o caso Celso Daniel com o caso Marielle Franco está pretendendo testar meus rigores profissionais (até amigos o fazem para terem a certeza das certezas de que não estou a fraquejar) ou observa mesmo o novo abalo sísmico na área de segurança pública nacional como desdobramento político-partidário-ideológico. 

Tenho cá comigo uma opinião que se fortalece sobre a morte da vereadora, mas não vou expor uma linha sequer porque é algo pessoal que, publicado, poderia ganhar conotação de especulação. Não quero me juntar às turmas de jornalistas que não fazem distinção entre uma coisa e outra. E por isso mesmo quebram a cara. E até escrevem livros de ficção eivado de parcialidades, caso de recentemente analisado nestas páginas. Naquelas páginas temos uma associação perfeita entre equívocos e espetacularização. O autor, Silvio Navarro, foi seletivo ao pinçar bobagens impressas, requentando-as para vender aos otários de sempre – os otários induzidos, os otários convertidos e os otários fundamentalistas. 



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