Imprensa

Como ludibriar o público com
informações manipuladas (2)

DANIEL LIMA - 08/08/2018

O rompante da Administração Luiz Marinho, em São Bernardo, era desmedido naquele junho de 2014 de eleições presidenciais e tantas outras. O petista ainda não se dera conta de que o Brasil passaria pela pior recessão da história, construída sobretudo pelo governo federal de Dilma Rousseff, e cujo preço está sendo pago até agora, na gestão de Michel Temer.  

O jornal ABCD Maior, braço esquerdo petista na região, mantido sobretudo pelo Sindicato dos Metalúrgicos, estampou uma manchete que lubrificava o entusiasmo de uma região que não comportava tanta euforia. “Obras da Prefeitura de SBC vão gerar 89 mil empregos até 2016” entra para os anais do jornalismo e da administração pública da região como a associação do fanatismo partidário e da inventividade informativa. O resultado final, como explicaremos mais abaixo, foi um choque anafilático no triunfalismo sem limites.  

Leiam alguns dos trechos principais da matéria publicada em 6 de junho daquele ano. E se preparem para o que vem em seguida: 

 Uma pesquisa elaborada pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo (SDET) da Prefeitura de São Bernardo do Campo aponta que até o ano de 2016 serão gerados cerca de 89 mil postos de trabalho em obras municipais, mais de 11 mil novos postos a cada ano de mandato do prefeito atual (2009-2012 e 2013-2016). O estudo foi realizado como base em dados fornecidos pela Secretaria de Orçamento e Planejamento Participativo. Até o fim da atual gestão municipal, 89.157 postos diretos, indiretos e de efeito-renda foram ou serão ge3rados por meio de investimentos em obras municipais, sendo 82.672 vagas durante a execução das intervenções e 6.485 postos permanentes, resultado da ampliação e melhoria dos serviços públicos. Outros 4.178 empregos estão na área de metalurgia, que fornece equipamentos para os estabelecimentos públicos construídos.  

 O grande destaque é o setor da construção civil, com a marca de 78.794 postos gerados em oito anos da atual gestão. A projeção é de criação de 26.230 empregos diretos, 19.853 indiretos e 32.410 por efeito-renda (cálculo elaborado com base em metodologia do BNDES, a partir da Matriz de Insumo-Produto do IBGE), que são as vagas criadas a partir do aumento de demanda apor conta dos empregos diretos e indiretos gerados pelos investimentos públicos.  Além da construção civil e da metalurgia, foram consideradas as áreas de eletrônica e mobiliário. Entre os postos permanentes, a maior parte dos funcionários ficará na Saúde (3.417), seguido pela Educação (2.152), Segurança Urbana (548), Cultura (130), Esporte e Lazer (120), Usina de Resíduos Sólidos (95) e Central de Trabalho e Renda (23).  

Mais ilusionismo  

O noticiário que dava conta dessa alquimia numérica se estendia ao detalhamento de obras que a Administração Luiz Marinho executaria no período de oito anos de dois mandatos. Acompanhem o complemento da reportagem: 

 No primeiro período analisado (2009-2012), foram executados projetos como a construção de duas mil unidades habitacionais e obras viárias de importante impacto municipal e regional, como o rebaixamento da Avenida Lions, a reforma da Avenida João Firmino e o término, após três décadas de interrupção, do viaduto Moisés Cheid, na Via Anchieta, bem como a construção de CEUs, a reforma e a reabertura da Cidade da Criança e o início das reformas no Parque Estoril. Já no período de 2013 a 2016 foram e estão sendo contabilizados projetos como o Hospital de Clínicas, referência em qualidade de atendimento médico-hospitalar; a revitalização da Prainha do Riacho Grande; a construção do Museu do Trabalho e do Trabalhador; a concessão do Complexo Artística e Produção Audiovisual Vera Cruz, previsto ainda para 2014; e o início efetivo de obras estruturantes do sistema viário, como corredores de ônibus, na drenagem urbana, o Drenar, na disposição e tratamento de resíduos sólidos, além de CEUs e conjuntos habitacionais. Não estão inclusos no cálculo os empregos gerados pela construção da Linha 18 (Bronze) do Metrô, com início previsto ainda para 2014 e término em 2016, e os cerca de mil empregos diretos de alta qualificação anunciados pela empresa sueca Scania para a unidade a ser instalada em São Bernardo do Campo, com investimento informado de US$ 150 milhões. Estima-se em cinco mil empregos indiretos relacionados a esses investimentos.  

Muito abaixo  

A Administração Luiz Marinho, encerrada em 2016, revelou-se no mercado de trabalho muito aquém dos números grandiloquentes anunciados dois anos antes. A máquina de produzir números aparentemente sustentáveis pelo detalhismo dos próprios números, deu com os burros nágua.  

O anúncio de geração de 89 mil empregos nos oito anos de Luiz Marinho em São Bernardo guardava salvaguarda metodológica que possivelmente seria utilizada para, mais tarde, confirmar a projeção. Seriam os 89 mil empregos consolidados no estoque de trabalhadores de São Bernardo ou o somatório de contratações ao longo do tempo sem as demissões?  

Melhor explicando: os quase 90 mil empregos seriam um acréscimo no estoque que se registraria ao final do mandato do petista, em 2016, ou haveria a escapatória de a quantidade exposta representar a precariedade das contratações sem considerar subsequentes demissões? Para ser mais objetivo ainda: os 90 mil novos trabalhadores seriam em larga escala inseridos no mercado por algum tempo apenas? 

A estratégia indefinida na exposição à imprensa sucumbiu mesmo se levada em conta pelo ângulo mais travesso, o de empregos de curto ou médio prazo contabilizados apenas como ativo, esquecendo-se, portanto, a porta da saída, de demissões.  

Estoque inicial  

Quando Luiz Martinho assumiu a Prefeitura de São Bernardo, em janeiro de 2009, o balanço geral do Ministério do Trabalho apontava estoque de 234.525 trabalhadores com carteira assinada.  Portanto, deveria deixar um estoque geral ao final do mandato de 323.683 empregos formais, considerando o noticiário de então.  

Quando terminou o ano de 2016 e ao deixar a Prefeitura, Luiz Marinho contabilizava estoque geral de 263.350 trabalhadores em todos os setores. O saldo positivo de 28.825 em relação a 2008 distanciava-se demais do prometido.  

Pior que isso: o emprego industrial, carro-chefe da economia de São Bernardo, perdeu no período de oito anos de dois mandatos o total de 11.193 trabalhadores. Eram 96.156 em dezembro de 2008 e passou a 84.963 em dezembro de 2016. Na construção civil, que seria a grande alavanca do mercado de trabalho no período de Luiz Marinho, o total de trabalhadores passou de 4.293 para 9.832. Um saldo de 5.539 postos. Bem distante, portanto, da projeção de quase 90 mil novos postos de trabalho.  

Emprego premonitório  

O mais alarmante no caso de antecipação deliberada e manipuladora do balanço geral do mercado de trabalho de São Bernardo ao final do mandato do prefeito petista, quando ainda faltavam mais de dois anos para o complemento da tarefa delegada pelos eleitores, é exatamente essa inovação em matéria de resultado final. Ou seja: o emprego premonitório, desprezando-se a macroeconomia e também a microeconomia específica de uma São Bernardo sempre vulnerável no setor industrial.  

Normalmente, os manipuladores de informações ao mexerem com dados estatísticos esperam a consolidação dos fatos e agem deliberadamente ao darem leitura e interpretação que corrompem a realidade. Eles sempre acreditam na permissividade e no comodismo da mídia nada questionadora e sobretudo avalizadora de barbaridades com a reprodução literal das informações repassadas.   

Os petistas de São Bernardo que elaboraram a projeção de novos empregos pareciam flertar com a divindade, com poderes mediúnicos sobre a macroeconomia e a macropolítica. Desprezaram os estragos de Dilma Rousseff à frente do governo federal. Confiaram demais na liquidez de recursos federais durante o governo Lula da Silva, quando as commodities valiam ouro no mercado internacional, sobretudo na China, e a política de subsídios para uma gastança generalizada não enfrentaria barreiras.  

Como se sabe, a história não é bem assim. O ciclo econômico de fartura e de gastança, que marcou os anos dourados de Lula da Silva e tantos outros presidentes da América do Sul no mesmo período, bateu na parede da recessão mais prolongada e insidiosa de que se tem notícia no País. Os empregos alardeados por Luiz Marinho viraram pó antes mesmo de virarem realidade. 



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