Imprensa

Sem rodeios

DANIEL LIMA - 09/06/2008

Não foram muitas as mensagens que recebi, principalmente de conselheiros editoriais de LivreMercado, sobre as funções que exercerei no Diário do Grande ABC. Como se sabe, acabei de aceitar o que chamaria de convocação da família que comanda aquela empresa de comunicação, Ronan Maria Pinto à frente, e também da diretora de Redação Lola Nicolás. Desde o dia primeiro último sou Consultor de Conteúdo daquele produto jornalístico.


Tenho a vantagem da qual não pretendo abrir mão e que consiste em analisar o Diário do Grande ABC longe da Redação do Diário do Grande ABC. Vantagem porque o jornalismo diário, de qualquer diário, emburrece. Não é ofensa, é constatação. Minhas orelhas cresceram num ambiente de jornalismo impresso diário. Em compensação, receberam lufadas de reflexão nas duas décadas de LivreMercado.


É claro que de vez em quando vou aparecer por lá, como nesta terça-feira, quando promoverei o primeiro workshop, reunindo todos os editores. Depois, numa outra data, dialogarei com os repórteres. E assim vamos construir nova relação.


O dia-a-dia do jornalismo impresso diário é algo fascinante para os jovens com aptidão e vocação para a comunicação, entusiasma também alguns mais experientes, mas, para mim, chegou ao ponto de exaustão. Reconheço meus limites. Até porque, também, tenho de continuar cuidando da revista LivreMercado, publicação na qual estou atolado de atribuições.


Vivo dia e noite para o trabalho, com intermitentes fôlegos para uma partida de futebol na TV, uma novela das nove na TV, uma corridinha noturna salvadora da pátria pelas ruas do Jardim do Mar, uma saidinha de vez em quando para almoçar ou jantar — essas extravagâncias humanas às quais mesmo os workaholics acabam se entregando.


O trabalho que realizo no Diário do Grande ABC e que espero tenha certa longevidade para que os resultados de fato apareçam é experiência fascinante. Poderei provar cientificamente que uma Redação de jornal é perfeitamente mensurável sob três vetores que se entrecruzam — em termos qualitativos, quantitativos e monetários.


Traduzindo a equação que para muitos é exótica: as planilhas que desenvolvo vão traçar o mapa da mina das editorias do Diário do Grande ABC, condição preliminar para todas as variáveis que se seguirem.


Possivelmente em três meses terei tomografia completa, individual e setorial, de toda a Redação em termos de produção física dos textos, de qualidade dos textos, de produtividade dos textos e de custos relativos dos textos. Quadrupliquei propositadamente o verbete “textos” para que os leitores compreendam que se trata de assunto pertinente à comunicação, não à industrialização de arruelas, de calotas, de motores, de pára-choques.


No fundo, no fundo, acreditem os incrédulos, dá quase a mesma coisa, com a diferença de que textos são mais complicados porque devem fugir da padronização imposta por acadêmicos que invadiram as redações no passado e que ainda tentam impor aos jovens nem sempre preparados para o ofício de aprender.


O Diário do Grande ABC será o primeiro jornal do mundo — anotem o que estou antecipando — a conhecer de forma transversal os valores qualitativos, quantitativos e monetários de sua principal matéria-prima, da essência de sua existência de meio século — o jornalismo propriamente dito.


A revista LivreMercado, acreditem, já chegou a esse patamar, depois de quatro anos de aplicação da metodologia que criei e desenvolvi.


Chegarei a tal ponto na definição de quesitos que determinarão o arrazoado que não sobrará pedra sobre pedra de interpretações que se descolem do encaçapamento estrutural do conceito de custo-benefício.


Para quem não entendeu a frase provocativamente rebuscada, traduziria da seguinte forma: vou matar a cobra de custos, de produção, de produtividade e de qualidade, e mostrar o pau de comparativos individuais e setoriais.


Espero que desta vez, ao contrário dos nove meses em que ali estive entre 2004 e 2005, a atividade não seja interrompida. Tenho certeza, aliás, quanto a isso. Senti da família de Ronan Maria Pinto interesse especial pela porção jornalística do Diário do Grande ABC, em vez de se priorizar outros departamentos, os quais, evidentemente, não podem se desgarrar dos mesmos conceitos.


E para aqueles que ainda insistem em colocar em dúvida o relacionamento que mantenho com Ronan Maria Pinto, por conta de tudo o que ocorreu em 2004-2005, o mínimo que posso dizer é que aprendemos a nos respeitar nas diferenças que mantemos sobre determinadas questões — sem se estabelecer juízo de valor a favor deste ou daquele — e encaminhamos passos conjuntos em pelo menos um ponto-matriz imprescindível à evolução do Grande ABC como sociedade em busca de regionalidade madura e resolutiva: a importância do jornalismo como fonte indutora de mudanças sociais, culturais e econômicas.


Retornando aos primeiros parágrafos deste texto, repito: os conselheiros editoriais não entupiram minha caixa de mensagens eletrônicas sobre as novas funções que me estão reservadas no jornalismo regional, embora não faltassem e-mails de apoio. Entretanto, foram eles que me ajudaram a aceitar a proposta. Afinal, quando praticamente me conduziram à festa de 50 anos do Diário do Grande ABC, numa consulta reservada que lhes fiz sobre se deveria ou não aceitar o convite, confirmei a suspeita de que há um sentimento de apropriação da sociedade regional pelo destino do jornal da Rua Catequese — da mesma forma que senti em outras situações inesgotável vocação em apropriar-se da revista LivreMercado.


Não poderia, por isso mesmo, decepcioná-los.


Como não os decepcionarei na ação propriamente dita que já passei a exercer.


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