Imprensa

Sem parentesco

DANIEL LIMA - 05/03/2009

A administração municipal de Santo André contratou o jornalista André Marcel de Lima para o Núcleo de Comunicação. Como todos sabem, a Prefeitura de Santo André é dirigida pelo médico Aidan Ravin. Nem todos sabem que André Marcel de Lima é filho de Daniel Lima. O que poucos sabem é que o jornalista André Marcel de Lima não tem pai. Ele é um profissional de jornalismo. André Marcel de Lima, pessoa física, é meu filho.

Uma nota publicada na edição eletrônica de ontem do site CliqueABC trata da contratação de André Marcel de Lima. O jornalista Léo Júnior preparou texto oportuníssimo porque revela até que ponto o convencionalismo conceitual de relações entre pai e filho é confundido com ação funcional.

Menos mal que o coordenador do Núcleo de Comunicação da Prefeitura de Santo André, Alekssandar Soares, não tenha sido inteiramente desastrado na avaliação da contratação do jornalista André Marcel de Lima. A parte boa das declarações que prestou ao CliqueABC é a seguinte:

  • Alekssandar confirma que a contratação de Marcel levou em conta o profissionalismo do jornalista…

Aí, entra a parte problemática:

  • …Mas também não perde de vista o seu parentesco com Daniel Lima, um dos maiores algozes de Aidan Ravin: “Eu entendo que ele (Daniel Lima) não vai ficar batendo tanto ou chamando de bandido a pessoa que está dando uma oportunidade de trabalho para o seu próprio filho”.

As imprecisões do coordenador de Comunicação da Prefeitura de Santo André são várias.

Primeiro, não há parentesco entre jornalistas, pelo menos no meu caso e de André Marcel de Lima. Ele, André, trabalhou durante uma década e meia na revista LivreMercado sob meu comando. Em vez de privilégio, preferi me exceder pela discriminação. Não houve ninguém na companhia que tenha sido tão exigido durante todo o tempo. Seguramente, foi o mais brilhante talento que passou por minhas mãos. Outros vários também brilharam, mas André Marcel foi além. Ele deixou LivreMercado, descobri mais tarde, por conta do inconformismo de ter descoberto falcatruas.

Segundo, a possibilidade de que, dada à contratação, eu venha a mudar o tom de eventuais deslizes do prefeito Aidan Ravin, é suposição retirada da absoluta maioria de casos assemelhados, muitos dos quais adredemente constituídos para chegar ao ponto de compensações. Possivelmente é uma avaliação de autor que olha para o próprio espelho.

Terceiro, diferentemente do que afirma o coordenador de Comunicação da Prefeitura, os salários de André Marcel de Lima não são pagos pelo prefeito Aidan Ravin. Como no caso de todos os funcionários públicos, são provenientes dos contribuintes.

Quarto, jamais escrevi ou sugeri que Aidan Ravin seja um bandido, como argumentou o coordenador de Comunicação. A sequência de artigos sobre o desempenho do então candidato à Prefeitura de Santo André nas eleições passadas refere-se a irregularidades na prestação de contas e também de atuação de colaboradores que o ajudaram a ganhar a disputa. Não se trata, como se vê, de algo diferente, na essência, de tantos outros vencedores de eleições. A complicação é que o prefeito de Santo André deixou-se colher em delitos que poderão lhe custar o mandato.

Quinto, e para concluir o arrazoado explicativo, só existe uma possibilidade de as patacoadas da coordenadoria da Prefeitura acrescentarem nova camada de equívocos: demitir o jornalista André Marcel de Lima por constatar, agora, que a iniciativa de contratá-lo não influenciará em nada a posição deste articulista.

E para completar, sem meias palavras: André Marcel de Lima escolhe os caminhos que percorre, pessoal e profissional. A maior influência que tive sobre ele provavelmente foi a escolha do time pelo qual torcemos — embora ele não tenha um milésimo do fanatismo do pai — e possivelmente a profissão. Por mim, estaria num veículo de comunicação à altura de seu talento e contribuindo para melhorar o nível de uma atividade que vive momentos lamentáveis.

Entretanto, como reconheço os limites que separam pais e filhos, jornalistas ou não, fico na minha e ele na dele.

Por isso, por favor senhores e senhoras, não confundam as bolas.


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