Imprensa

Diário acerta contas com Marinho
e alivia longa perseguição editorial

DANIEL LIMA - 22/06/2010

A mais escarniçada guerrilha editorial movida no Grande ABC nos últimos tempos cedeu lugar a algo que não pode ser chamado de omissão completa nem de aprovação total, mas está muito longe do jornalismo a serviço da comunidade, com tem de ser o bom jornalismo. O Diário do Grande ABC do empresário Ronan Maria Pinto bateu tanto em pedra dura até que furou a cidadela da administração petista de Luiz Marinho, em São Bernardo. A carga de perseguição editorial que durou mais de um ano e meio está aliviada. Tudo em nome da miraculosidade da conta publicitária da Prefeitura de São Bernardo, a mais rica e mais problemática da região.


Já faz alguns pares de dias que se poderão estender por tantos outros que o Diário do Grande ABC não ataca a gestão de Luiz Marinho. Longas batalhas de bastidores foram orquestradas para que se chegasse a termos razoavelmente civilizados, embora desprezíveis sob o ponto de vista de jornalismo sério. A administração Luiz Marinho ganhou com a operação um pouco de tranquilidade interna, principalmente interna. O bombardeio do Diário do Grande ABC, mesmo de efeitos limitadíssimos no conjunto da sociedade, estilhaçavam a autoestima da gestão petista.


A Prefeitura de São Bernardo cedeu uma parte substancial do filão de publicidade. Em contrapartida, o Diário do Grande ABC deixa de publicar matérias de cunho estritamente revanchista por conta de restrições da política publicitária das atividades daquela administração pública.


Trocando em miúdos: substituíram dificuldades por facilidades, como se faz com mais discrição em muitas instâncias públicas e privadas deste País varonil. Nada cujo enredo cause estupefação. Ética é porção gelatinosa cujas formas se alteram de acordo com interesses em jogo. Ou não seria assim a ética até mesmo dos mais éticos do jornalismo esportivo, por exemplo, quando se consagra o gol de Luiz Fabiano o mais bonito da Copa do Mundo, mesmo depois de o atacante brasileiro abalroar um adversário com uma cama de gato e de meter o braço na bola duas vezes antes de estufar as redes?


São muitas as versões do acordo entre Ronan Maria Pinto e Luiz Marinho. Os valores monetários são altíssimos, segundo fontes próximas do Paço Municipal de São Bernardo e também do edifício da Rua Catequese. Intervenções de mandachuvas estaduais e federais teriam sido mais uma vez deflagradas para contemporizar o que parecia inconciliável.


Hão de perguntar os leitores menos atentos e incrédulos: afinal, como se explica tamanho acirramento de ânimos ao longo de quase dois anos se Ronan Maria Pinto ficou marcado como empresário ligadíssimo ao Partido dos Trabalhadores nos desdobramentos do caso Celso Daniel?


A resposta mais simples e explicativamente indestrutível é a seguinte: Ronan Maria Pinto, ao contrário do que alguns afoitos tentaram identificá-lo, não tem cores partidárias nem ideológicas. Ronan Maria Pinto é o mais autêntico exemplar de empresário que de fato só vê a cor do dinheiro. O resto é detalhe, é perda de tempo, é qualquer coisa sem importância. Para Ronan Maria Pinto não interessa a cor do gato da oportunidade, desde que o gato da oportunidade saiba caçar o rato do bom negócio. Os homens de negócios são assim. É o DNA do capitalismo à moda brasileira.


Por isso mesmo e por muito mais jamais a história de que Ronan Maria Pinto estaria direta ou indiretamente envolvido no assassinato do prefeito Celso Daniel coube na cabeça de quem conhece os propósitos dele nas entranhas sempre rentáveis de máquinas públicas.


Jamais o diretor-presidente do Diário do Grande ABC, então apenas um empresário do setor de transporte coletivo, se meteria numa fria que o prejudicasse, que chamasse a atenção pública, porque, é evidente, qualquer coisa que ocorresse com Celso Daniel detonaria blitz em direção a todos que estivessem nas proximidades do Paço Municipal. A morte de Celso Daniel prejudicou terrivelmente Ronan Maria Pinto. Ele perdeu aliado fortíssimo que lhe abriria as portas federais como ninguém.


Ronan Maria Pinto deixaria de ser um empresário regional na área de transporte coletivo para dar saltos estratosféricos. Ou não foi assim que um amigo muito chegado dele, Sérgio De Nadai, chegou aonde chegou, porque deixou a Província do Grande ABC e não teve a má sorte de ter o primeiro-amigo Mário Covas vítima de algo semelhante ao que ocorreu com Celso Daniel?


Quantos milhões estariam envolvidos na transação que culminou com o acordo publicitário que beneficia o Diário do Grande ABC? Garante-se na praça que será muito, mas muito mais que os milhões que o beneficiam em outros municípios do Grande ABC, principalmente numa Santo André de Aidan Ravin em fina sintonia com o empresário.


O valor monetário pouco importa em primeiro plano, porque além do cheiro de concorrência desleal, gestada a partir de escabrosa, indecorosa e implacável perseguição editorial contra o prefeito petista, forja-se ou fortalece-se modelo que não é novo, mas é cada vez mais insidioso, de cumplicidade entre Imprensa e Poder Público.


A aproximação entre os beligerantes dificilmente prosperará além do previamente acordado. Tudo porque o Diário do Grande ABC não poderá abrir mão de acordos de intimidade editorial com o governo estadual dos tucanos, a quem Ronan Maria Pinto recorreu para contrapor na arena política o desfalque orçamentário da resistência de Luiz Marinho.


O resultado do encontro das águas entre Diário do Grande ABC e Prefeitura de São Bernardo é observado com ambiguidade. Da mesma forma que não faltam propagadores da tese de que Ronan Maria Pinto deu mais um show de pragmatismo editorial, há avaliadores que colocam cenário radicalmente oposto, como a derrocada pública do jornal.


Lembram os cultivadores da estratégia dos petistas de São Bernardo que, independentemente de o Diário do Grande ABC começar a contemplar a administração de Luiz Marinho sob ângulos menos discricionários, só o fato de as manchetes negativas desaparecerem será suficiente para os leitores formadores de opinião entenderem que não são exclusivamente critérios jornalísticos que balizam a pauta daquela publicação.


Não faltam também petistas que condenam a aproximação entre a administração Luiz Marinho e o Diário do Grande ABC. Eles defendem a teoria de que a aderência social do Diário do Grande ABC é muito inferior ao que se propaga, com base em pesquisas sistemáticas, principalmente quando se cruzam audiência e credibilidade.


O grupo petista que defende o apaziguamento de ânimos mesmo sem contrapartidas de um jornalismo equalizado por critérios meritocráticos insiste na teoria de que desferiram mais um golpe que pode não ser fatal, mas é forte, na mandíbula do maior patrimônio que um veículo de comunicação precisa preservar, ou seja, a certeza de que a manchete de amanhã é puramente jornalística, não econômica.


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