Imprensa

Recuperamos 14 entrevistas para quem sabe que passado explica presente

DANIEL LIMA - 05/05/2011

Só dispensa o passado de informações quem não tem preocupação em entender o presente e pouco está se lixando para o futuro. Muito da história econômica e social do Grande ABC passou pelas páginas da revista LivreMercado que comandei durante duas décadas. Esta revista CapitalSocial é uma continuidade daquele trabalho. Por isso reserva espaços nobres à categoria “Entrevistas Especiais”. Os leitores terão a oportunidade, a partir de hoje, de acompanhar 14 entrevistas publicadas em 1997, primeiro ano completo de circulação de LivreMercado em forma física de revista.

Até outubro de 1996 a publicação lançada em março de 1990 circulava em formato tabloide. Era um jornal em papel mais nobre que reunia conteúdo vocacionalmente de revista. O papel mais robusto foi adotado como ferramenta de sustentabilidade do produto editorial. Tanto que criamos o slogan “leitura o mês inteiro”. Se LivreMercado fosse industrializada em papel jornal não teria resistido ao tempo. Não se presenteia alguém com joia preciosa em invólucro ordinário.

Sugiro atenção aos textos, principalmente aos leitores mais comprometidos com a regionalidade, mantra que adotamos como sinônimo de jornalismo muito antes da formação do Clube dos Prefeitos, em dezembro de 1990. Os temários são diversos, mas todos com encaixe regional.

Asseguro aos leitores que essas entrevistas especiais são imperdíveis. Não seria capaz de apontar favoritismo à leitura. Como esse trabalho está sendo produzido com todo o cuidado e certo vagar, ainda não sei o que me reservam as edições seguintes, nos anos que se acumularam na história daquela que foi a melhor publicação regional do País.

Por mais que tenha a memória de LivreMercado viva em mim, é impossível resgatar aquelas páginas amarelas que reproduziam a cada edição um modelo de jornalismo que rompia completamente com o lugar-comum de fechamento formal de páginas. Cada edição significava uma peça do mosaico do período de maiores transformações econômicas e sociais que uma região já vivenciou no País.

O Grande ABC dos anos 1990 e da primeira década deste século foi completamente reconfigurado — para o bem e para o mal. Não se dão conta disso os imprudentes, os pobres de espírito, os acomodados e os malversadores.

Acompanhem na sequência as primeiras linhas (originais) das entrevistas especiais que recuperamos em nossos arquivos digitais. Em seguida, definam prioridades de leitura. Uma boa viagem ao passado. Um desembarque sem atropelos no presente.

  •  A nova relação capital-trabalho a partir da reestruturação econômica neste final de milênio não deve dispensar a visão humana sobre o emprego. A relação de emprego não é mero contrato, pois possui uma função social que vai além do fato de os empresários considerarem um empreendimento como sua propriedade. Quem chama o empresariado a dar abrangência social à vinculação empregado-empregador é o professor universitário e juiz do Trabalho em Santo André, Gésio Duarte Medrado. Ele acha que Sindicatos, governo e trabalhadores devem encontrar alternativas para a mão-de-obra que está sendo excluída do sistema produtivo e defende o contrato coletivo de trabalho. Também afirma que, apesar de ainda estar sendo moldado o novo perfil do emprego, uma economia estável contemplaria a regulamentação da garantia do trabalhador contra despedida arbitrária ou sem justa causa.
  •  Especialista em administração e controle de empresas, com grande atuação em formação e desenvolvimento de Recursos Humanos, o executivo Reifer Nascimento, ex-professor da Fundação Santo André e ex-presidente da Faisa, Fundação de Assistência à Infância de Santo André, não vê nada no futuro do sindicalismo brasileiro senão um horizonte absolutamente escuro. Num confronto direto com o tom conciliador da maioria dos profissionais da área que atuam há muitos anos no Grande ABC e que tiveram oportunidade de vivenciar o florescimento e o arrefecimento do então novo sindicalismo de Luiz Inácio Lula da Silva, no final dos anos 70, Reifer Nascimento é duro crítico das consequências daquele movimento. Atribui ao sindicalismo parte do peso do esvaziamento econômico do Grande ABC. Em alguns casos, diz que o peso foi preponderante.
  •  Os empresários podem dar importante contribuição à melhoria da qualidade de vida nas grandes cidades, participando da elaboração de unidades de vizinhança. É como o professor e arquiteto Cândido Malta Campos Filho chama o planejamento dos bairros, a solução mais fácil à mão para tentar reverter o caos dos centros urbanos e o crescimento desordenado da periferia, com a explosão das favelas. Cândido Malta acha possível ao Grande ABC estimular e atrair novas empresas – sobretudo as satélites de grandes corporações -, exemplificando com o espaço disponível no Pólo de Sertãozinho, em Mauá, Município para o qual desenvolveu o Plano Diretor que está em debate. O urbanista também atribui a periferização do Grande ABC ao problema macroeconômico do desemprego que atinge todas as regiões industrializadas do mundo, como efeito da globalização. A solução, neste caso, estaria em rever o modelo neoliberal.
  •  Luiz Marinho, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema e que luta na Justiça pela base de Santo André, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, entende que os trabalhadores da região são importantes protagonistas de qualquer gestão político-institucional voltada para corrigir a rota socioeconómica do Grande ABC. Por isso, desde já garantiu postos na Câmara Regional do Grande ABC, uma inédita composição de forças entre o governo do Estado, os Poderes Executivo e Legislativo e o Fórum da Cidadania, representante da sociedade civil organizada. Luiz Marinho não esconde preocupação com o futuro da região, mas não se entrega às dificuldades. Mais que isso: considera os problemas regionais contornáveis e superáveis.
  •  Só um pacto dos Sindicatos com as empresas no sentido de frear a intensidade das reivindicações salariais pode atenuar as dificuldades por que passa o setor de autopeças no Grande ABC, um dos que encabeçam a lista de migrações para outras regiões e Estados. O presidente do Sindipeças, Paulo Butori, aponta o estigma do forte sindicalismo como ponto cardeal de resistência a novos investimentos na região e como item básico nos custos das autopeças, que em Minas Gerais pagam até 60% menos e crescem quase o dobro do resto do País. A isso, soma a conjuntura desfavorável da baixa alíquota de importação que está nocauteando o setor diante da competição externa e das pressões das montadoras.
  •  O prefeito Luiz Tortorello quer fazer das empresas grandes parceiras da Prefeitura de São Caetano. Ele não esconde que novos empreendimentos no Município, sobretudo nos setores de informática e de tecnologia de ponta, beneficiados pela legislação local, representam tributos importantes para a sustentação da qualidade de vida desse território de apenas 15 quilômetros quadrados de Primeiro Mundo num vasto Grande ABC de sérios problemas socioeconómicos.
  •   A onda de descentralização das montadoras e enxugamento das estruturas, com plantas menores em tamanho e em empregos diretos, ainda não colocou a Volkswagen do Brasil no banco dos réus sem chances de absolvição. Mas, no ritmo de ganhos de produtividade ditado pela globalização. São Bernardo pode ser alvo fácil na agenda de redefinições de estratégias da montadora, não só pelo gigantismo do quadro local de 22 mil trabalhadores, como pelo alto custo que representam. O operador de produção de nível mais baixo recebe cerca de R$ 1.300,00 na Volks, contra R$ 700,00 de salário médio do operário da Fiat mineira. O diretor de Recursos Humanos da unidade Anchieta, Fernando Tadeu Perez, lança mensagem provocante ao sublinhar que, pelo menos nos próximos 20 anos, está fora de cogitação qualquer plano para desativar a fábrica. Mas não faz rodeios ao afirmar que seu futuro dependerá do nível de reivindicações dos quadros e da ação do Sindicato dos Metalúrgicos.
  •  Depois de ganhar prioridade do governo de São Paulo dentro do Programa de Desenvolvimento e Competitividade, sediando a primeira Câmara Regional do Estado, o Grande ABC começa este mês a passar por verdadeira devassa estatística. Uma radiografia sobre o que a globalização causou ao parque industrial, o florescimento das atividades de comércio e serviços, qual o novo perfil de emprego e como se acomodaram os novos padrões tecnológicos e de gerenciamento comporão mosaico sem precedentes na América Latina em termos de censo econômico. A apuração, batizada de Pesquisa sobre Atividade Econômica Paulista (PAEP), será feita em 36 mil empresas do Estado de São Paulo, com destaque para coleta especial no Grande ABC, que pela primeira vez será avaliado no seu todo e jogará luz sobre seu PIB e sua evolução. A iniciativa é liderada pela Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados) e pretende servir de referência não só para traçar novas estratégias públicas, como se transformar em sólida base de dados para investimentos privados. “O último censo econômico, do IBGE, é de 1985. Está, portanto, totalmente fora da realidade” — justifica o diretor da Fundação Seade e um dos entusiastas do levantamento, Pedro Paulo Martoni Branco.
  •  O Grande ABC não ganhou só mais uma universidade no mês passado. Mais do que uma referência em instituição de ensino que desde 1942 mantém campus em São Bernardo, a nova Universidade Metodista de São Paulo representa para a região um fervilhante centro de idéias e de participação na vida da comunidade e das empresas. Se tudo correr como planeja o diretor-geral Jacob Daghlian, um grande incentivador da inserção social das escolas, essa veia de atividades será engrossada a partir da autotomia conquistada pela Umesp.
  •  Fundador da Cofap e seu comandante durante 46 anos, Abraham Kasinski é mesmo uma unanimidade como empresário e confirmou essa fama mês passado, quando esteve cercado de homenagens pela comemoração do 80º aniversário. A data coincidiu com dois acontecimentos pessoais extremos: um momento doce da vida, o segundo casamento com a impecável sexagenária Yvonne Schartzmann, e a aposentadoria da empresa, a contragosto, ele confessa, porque desejaria continuar colaborando com os rumos dessa multinacional que se projetou a partir de Santo André. “Não quero cargos nem salários. Quero disponibilizar meus conhecimentos. Quero que me usem” – propõe aos ex-sócios.
  •  O governo do Estado quer arrecadar mais. Depois de ter apresentado crescimento na receita do ICMS, Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, de 40% em relação a 1994, quando da introdução do Plano Real, o fisco estadual quer novos avanços, segundo Clóvis Panzarini, coordenador da Administração Tributária. A principal novidade metodológica é a fiscalização setorial adotada em substituição ao modelo circunscricional, considerada uma revolução dentro do programa de modernização. O modelo setorial permite ao Fisco visão sistêmica da economia, das relações intersetoriais, dos efeitos que cada setor provoca.
  •  A fábrica Anchieta da Volkswagen do Brasil triplicou o treinamento este ano em relação a 1994. Está prevista colossal carga de 1,2 milhão de horas/treino, cerca de 50 horas per capita. Mas essa fome de aprendizado é recente. Acossada pela concorrência interna e pela abertura aos veículos importados, a marca líder no mercado de automóveis não teve alternativa: era capacitar os quadros ou perder competitividade. Chegou a enfrentar resistência de representantes sindicais quando, há quatro anos, traçou plano de desenvolvimento de pessoal a partir de uma chaga inadmissível para os tempos de globalização: metade dos horistas sequer possuía Primeiro Grau completo. Na luta pela redução desse gap vale tudo, desde aulas de alfabetização até complementação da grade de ensino do Senai. Agora todos se empolgam com a possibilidade de crescer profissionalmente, diz o gerente de Treinamento Clébio Ribeiro.
  •  A Rhodia Química de Santo André está desenvolvendo de forma pioneira um sistema de empregabilidade para os quase 500 funcionários. A executiva Iaci Mortensen Rios é gerente de Educação e Desenvolvimento, uma das vertentes dos Recursos Humanos do Grupo Rhodia no Brasil, e responsável pelo projeto que gradualmente vai-se espalhar pelas demais unidades da empresa, que conta com 6,5 mil colaboradores. Ela faz alerta importante sobre essa nova palavra aparentemente enigmática do mundo empresarial: não basta adquirir mais conhecimentos; o trabalhador precisa manter-se permanentemente atualizado.
  •  O professor José Pastore, 62 anos, titular da Faculdade de Economia e Administração da USP, Universidade de São Paulo, não é exatamente um convidado especial dos sindicalistas. Autor do livro Encargos Sociais no Brasil e no Exterior e também de Flexibilização dos Mercados de Trabalho e Contratação Coletiva, José Pastore trafega em mão de direção oposta à da quase totalidade de representantes dos trabalhadores e de intelectuais de esquerda. E não poderia ser diferente, porque ele provavelmente é o especialista em legislação trabalhista que mais se opõe à herança deixada pelo governo Getúlio Vargas, período em que o Estado-todo-poderoso dava as cartas e jogava de mão.

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