Os estragos no setor industrial do Grande ABC no período de recessão que impacta o Brasil como um todo é alarmante, mas ganham conotação especial em São Caetano. Em maior proporção do que no Grande ABC durante o período de 36 meses, entre janeiro de 2015 e dezembro de 2017, os dados de São Caetano são mais estarrecedores do que já se apresentaram em outras análises.
O setor industrial do Município passou por catástrofe no período. E nada indica que, quando forem anunciados os dados dos anos subsequentes, de 2017 e 2018, tenha havido arrefecimento.
São Caetano faz parte de um Grande ABC duramente punido pela recessão econômica porque depende exageradamente da matriz automotiva, nossa Doença Holandesa. Sem os veículos somos uma nau à deriva. Com os veículos navegamos em mares tão plácidos quanto enganosos.
Um cálculo seguro que se desdobra em cálculo projetado sugere que em 2017 a massa salarial dos sete municípios da região tenha sofrido queda monetária de mais de R$ 3,5 bilhões em relação a 2014. Esse valor corresponde, hoje, a 10 mil apartamentos de 70 metros quadrados em bairros de classe média baixa em Santo André.
Fazendo as contas
Para chegar ao cálculo projetado, ou seja, aos R$ 3,5 bilhões de 2017, parto de equação técnica insofismável. Em dezembro de 2017 a indústria de transformação do Grande ABC pagou aos trabalhadores com carteira assinada o valor de R$ 826.352,62 milhões. Eram 182.168 carteiras assinadas, com média salarial de R$ 4.536,21. Esses números são todos inferiores aos registros no Ministério do Trabalho em dezembro de 2014, base da pesquisa que realizei.
Não houvesse sofrido qualquer prejuízo na atividade, o total de trabalhadores industriais da região em dezembro de 2017 deveria comportar estoque de 238.722. Ou seja, em dezembro de 2017 havia 56.554 carteiras assinadas a menos. A diferença significou a perda de 23,69% de postos de trabalho.
O salário médio por trabalhador industrial na região era de R$ 3.933,95 em dezembro de 2014. Os R$ 4.536,21 de dezembro de 2017 eram nominalmente 15,31% maiores em relação a 2014; entretanto, abaixo da inflação de 21,05% apontada pelo IPCA do IBGE (Índice de Preços ao Consumidor Amplo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Queda de 27,31% em 2017
Com essas transformações, a massa salarial de R$ 826.352,62 milhões em dezembro de 2017 deveria alcançar R$ 1.136.805,69 bilhão para que não houvesse perda. Uma diferença de R$ 310.453,07 milhões, ou 27,31% do valor registrado.
Para chegar aos projetados R$ 3,5 bilhões de perdas salariais em 2017, somente em 2017, fiz uma conta simples: multipliquei a perda de dezembro de 2017 (sempre em relação ao valor de dezembro de 2014, corrigido pela inflação) e multipliquei por 12 meses. O valor é um pouco abaixo da operação matemática porque preferi levar em conta que o acumulado de demissões industriais se avolumou ao longo dos meses de 2017. Desprezei o 13º salário.
É claro que se trata de valores estimados. O Ministério do Trabalho e Emprego, fonte de pesquisas, não detalha mês a mês perdas e ganhos no balanço final.
Estrondo maior
O estrondo das demissões industriais sempre tendo dezembro de 2014 e dezembro de 2017 como bases de análise, foi muito maior em São Caetano. Nada é sequer parecido ao que ocorreu no Município de melhor qualidade de vida da Região Metropolitana de São Paulo e responsável por 6% dos trabalhadores da região na ponta da tabela. O universo de trabalhadores industriais de São Caetano foi decepado em 10.566 (18,69% do total regional) carteiras assinadas em 36 meses. O equivalente a 40,00% do estoque municipal.
São Caetano contava com 26.410 trabalhadores no setor industrial em dezembro de 2014. Em dezembro de 2017 sobraram 10,566. O salário médio também desabou. Era R$ 3.922,66 em 2014 e passou para R$ 2.869,89. A perda efetiva é inquietante: se corrigido pela inflação, o salário médio do trabalhador em São Caetano passaria de R$ 3.922,66 em dezembro de 2014 para R$ 4.748,38. Mas não ultrapassou R$ 2.869,89. Uma queda real de 47,89%. Não existe nada semelhante a São Caetano nos municípios brasileiros entre os três dezembros.
Massa salarial pior
Pior ainda é o desenho final do período quanto à massa de salários, que caiu 63,74% entre um dezembro e outro. Houve perda atualizada em valores monetários de dezembro de 2017 de R$ 125.404,71 milhões quando se confrontam os valores com dezembro de 2014.
Em números absolutos quem mais sofreu sangria na indústria regional foi São Bernardo. A queda é de 18.952 carteiras assinadas, equivalentes a 20,55% do total do estoque de dezembro de 2014. Eram 92.211 carteiras assinadas; passaram para 73.259.
Já em termos de média salarial dos profissionais industriais que constavam da folha de pagamento das empresas em dezembro de 2017, praticamente não houve alteração em São Bernardo em relação a dezembro de 2014. O que era R$ 4.799,10 passou a R$ 5.839,72. Uma variação nominal de 21,68%, em empate técnico com a inflação de 21,05%. A média salarial dos trabalhadores industriais de São Bernardo foi mantida, mas como houve perda líquida de mais de 18 mil trabalhadores, a massa salarial caiu 20,14%, equivalente a R$ 107.870,28 milhões em dezembro de 2017.
Santo André no meio
Santo André perdeu menos massa salarial que São Caetano porque sofreu baixa de trabalhadores em proporção bem menor. Foram 16,99% de perda salarial em dezembro de 2017 quando comparado com dezembro de 2014. Eram 33.439 trabalhadores industriais com carteira assinada naquele mês, ante 24.460 em dezembro de 2017. Uma queda relativa de 26,85%. Portanto, acima de São Bernardo e bem abaixo de São Caetano.
O salário médio do trabalhador industrial em Santo André perdeu para a inflação, mas por margem reduzida. Em dezembro de 2014 era R$ 3.662,41, contra R$ 4.154,23 em dezembro de 2017. Para acompanhar a inflação, o salário médio de dezembro de 2017 deveria ser de R$ 4.433,35. Portanto, houve perda de 6,29%. A combinação de perda de postos de trabalho e salário médio rebaixado refluiu a massa salarial em Santo André.
Perdas tríplices
Diadema perdeu 24,87% do estoque de trabalhadores, teve o salário médio aquém da inflação e acumulou perda da massa salarial equivalente a 17,39% do que registrara em dezembro de 2014. Uma tríplice coroa de derrotas que se tornou lugar comum nos municípios da região, sempre quando se leva em conta os dados de dezembro de 2014 e dezembro de 2017. Eram 53.028 carteiras assinadas na indústria de Diadema, R$ 3.084,26 de média salarial e massa salarial de R$ 163.552,14 milhões em dezembro de 2014. Passou para 39,838 trabalhadores (perda líquida de 13.190 postos de trabalho), média salarial de R$ 3.638,23, com avanço nominal de 17,96% (abaixo dos 21,05% de inflação) e massa salarial de R$ 144.939,81 milhões. Quando se atualizam os valores da massa salarial de Diadema de dezembro de 2014, aplicando a inflação até dezembro de 2017, o valor sobe para R$ 197.979,86. Uma diferença negativa, em 2017, de R$ 53.040,04 milhões e de 17,39% ao efetivamente pago aos trabalhadores.
Mauá diferente
Mauá não viveu roteiro de emprego industrial diferente dos demais municípios da região no período de análise (exceto o empate técnico da média salarial em São Bernardo): perdeu 14,47% dos postos de trabalho entre os três dezembros, a média salarial ficou muito aquém da inflação (7,39% contra 21,05%) e a massa salarial sofreu derramamento de 16,99%. Nos postos de trabalho Mauá saiu do patamar de 24.099 em dezembro de 2014 para 20.610 em dezembro de 2017; na média salarial de R$ 3.410,71 para R$ 4.007,27 em valores nominais, que não levam em conta a inflação; e a massa salarial praticamente empatou em termos nominais (R$ 82.194,70 milhões contra R$ 82.589,83 milhões) mas sofreu queda de 16,99% ao se considerar o IPCA.
Ribeirão e Rio Grande
Ribeirão Pires contava em 2017 com menos de 4% dos trabalhadores industriais do Grande ABC, mas não escapou da hecatombe dos dezembros distanciados por 36 meses. Em 2014 Ribeirão Pires registrava 7.968 carteiras assinadas no setor de produção, salário médio mensal de R$ 2.617,12 e massa salarial de R$ 20.853,21 milhões. Já em dezembro de 2017 eram 6.676 carteiras assinadas (queda de 1.292, ou 16,21%), salário médio mensal de R$ 2.992,87 (crescimento nominal de 14,35%, abaixo da inflação) e massa salarial de R$ 19.980,04 milhões (deveria ser R$ 25.242,81 com correção inflacionária), ou 20,85% aquém da base de comparação.
Completando o quadro regional, a pequena Rio Grande da Serra seguiu o ritual de perdas. Em dezembro de 2014 registrava 1.567 empregos industriais formais, média salarial de R$ 2.505,51 e massa salarial de R$ 3.926,13 milhões. Três dezembros depois, em 2017, eram 1.481 trabalhadores (86 a menos), média salarial de R$ 2.665,69 (6,40% de crescimento nominal, abaixo da inflação) e massa salarial de R$ 3.947,89 milhões (17,39% abaixo da correção monetária do valor registrado três dezembros antes).
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