Não se assustem com o número relativo acima. Até porque assustar-se seria prova cabal de ignorância, já que vem de longe a desindustrialização da Capital Econômica do Grande ABC (e de seus satélites na região). A perda se refere à participação do PIB Industrial em confronto com o PIB Geral nos últimos 14 anos medidos pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e metabolizados por CapitalSocial.
Trata-se de velocidade muito acima da média nacional. Somente Santo André e São Caetano, na região, rivalizam-se com São Bernardo, porque perderam 61,49% e 49,23% no mesmo período. É riqueza para lá de Bagdá. É empobrecimento latente e comprovado. Afinal, a indústria paga os melhores salários. Em São Bernardo, então, é uma grandeza. A média salarial industrial está muito acima da média salarial de outras atividades.
Portanto, como se observa, não será uma Ford substituída pela Caoa que vai fazer o verão da ressurreição da economia de São Bernardo. E tampouco os investimentos tecnológicos (e desempregadores em várias situações) de outras montadoras de veículos locais. Uma Caoa não tapará os buracos da canoa furada da desindustrialização, para ser mais claro.
Tempestade permanente
O prefeito Orlando Morando faz papel que compete a um chefe municipal. Ele procura amenizar as agruras da desindustrialização com uma oratória motivacional. O problema é que não se trata de chuva de verão. É uma tempestade que se repete quase sem parar durante as quatro estações do ano.
Tempestade quase sem parar porque só ganha fôlego de recuperação parcial após perdas passadas e sequenciais quando a indústria automotiva sai em disparada. Algo cada vez mais complexo. Não respondemos nem por 20% da produção nacional no setor. Tem gente que ainda acha que somos a capital do automóvel no sentido de maioria absoluta da produção, como por volta dos anos 1970. Ainda somos a maior concentração geográfica de produção, mas a soma dos concorrentes altera o produto final porque levamos uma surra no placar final de nós contra todos. Antes, no período de fartura, eram nós contra o resto.
São centenas de textos sobre desindustrialização à disposição dos leitores em nosso acervo. Mas, nesse momento, essa contabilidade do PIB Industrial dos municípios do Grande ABC em confronto com o PIB geral decorre de uma matéria publicada na Folha de S. Paulo de ontem. A reportagem dá conta do nível de desindustrialização no Brasil entre 2009 e 2019.
Temperatura elevada
No caso do Grande ABC, medi a temperatura da desindustrialização num período mais longo: a base é 2002 (último ano do governo federal de Fernando Henrique Cardoso) e o topo é 2016 (último ano liberado pelo IBGE e praticamente coincidente com a trajetória do PT na Administração Federal). Ou seja: ainda não contamos com dados do período dos novos prefeitos da região. Os números de 2017 do PIB dos Municípios só serão conhecidos em dezembro próximo. Se não vierem novamente negativos, serão pífios na recuperação.
Quem não quer conhecer os números do PIB de São Bernardo de 2017? Afinal, o prefeito Orlando Morando é o mais atento, embora pouco planejado e organizado, chefe de Executivo a colocar a questão da indústria de transformação em pauta.
Nem poderia ser diferente: além de São Bernardo contar com o maior parque produtivo da região, anda às voltas com a debandada da Ford.
Caindo sem parar
O PIB Industrial perdeu 70,28% de participação no PIB Geral de São Bernardo entre janeiro de 2003 e dezembro de 2016. São 5,02% de perda média anual de participação relativa. Bem mais que a média nacional de 3,93% apurada na reportagem da Folha de S. Paulo. Para ser mais preciso: a perda relativa do PIB Industrial de São Bernardo é 27,73% maior que a perda média anual também relativa do PIB Industrial do Brasil.
Lembramos apenas a título de esclarecimento que os períodos são diferentes e, portanto, não necessariamente conexos nos resultados finais, mas, de qualquer modo, esclarecedores. Quando estiverem disponíveis os números dos municípios, sempre com dois anos de atraso em relação aos números nacionais, poderemos estabelecer uma junção temporal mais apropriada. Mas, insisto, não necessariamente reparadora dos conceitos desta análise.
Segundo a reportagem da Folha de S. Paulo, que divulgou pesquisa de estudo considerado inédito do Departamento de Economia, Competitividade e Tecnologia da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), “na contramão da tendência mundial, a indústria de transformação perdeu participação no PIB (Produto Interno Bruto) do país desde o final de 2009 e, dez anos depois, retornou aos patamares da década de 1950. O movimento foi puxado pelo encolhimento dos segmentos de alta tecnologia” –escreveu a Folha.
Rotina de estudos
Insisto em lembrar que se tornaram rotina nossos estudos sobre o comportamento do PIB do Grande ABC, em vários ângulos, inclusive em comparações com outros municípios do Estado de São Paulo, especialmente os integrantes do G-22, o grupo dos 20 maiores endereços paulistas.
Pegar carona na reportagem da Folha de S. Paulo é uma espécie de provocação para lembrar que a velocidade de quebra de participação da indústria de transformação no PIB Geral do Grande ABC é mais acentuada. Vivemos um inferno de desindustrialização que vem mais acentuadamente desde o começo dos anos 1990. Não fosse aquele tranco, os dados regionais seriam ainda piores. Nossa desindustrialização começou bem mais cedo que em outros territórios. A guerra fiscal, principalmente, fez a diferença.
Claro que São Bernardo sempre ganhará prioridade de abordagem. A condição de liderança econômica da região impõe não uma espécie de seletividade discriminatória, mas sobretudo exploratória. Ou seja: uma ação jornalística mais focada nas consequências das transformações.
Nada de triunfalismo
Seria estupidez própria dos triunfalistas de plantão trombetear em manchetíssima que no período agora pesquisado por este jornalista, de 2002 a 2016, Rio Grande da Serra avançou na participação relativa do PIB Industrial. Trata-se de crescimento de apenas 1,05% numa economia municipal que não chega a meio por cento (0,5%) do PIB Regional.
Os demais municípios da região foram sacudidos por perdas sequenciais. Até chegarem aonde chegaram, com índices escandalosos de rebaixamento. Especialmente São Bernardo, Santo André e São Caetano, além de Diadema, todos na faixa de dois dígitos.
Só para acentuar o problema: o PIB Industrial de Diadema caiu 10 pontos percentuais no período de 14 anos; em Santo André a perda foi de 10,30 pontos percentuais; em São Caetano de 10,93 pontos percentuais e, como já anunciamos, em São Bernardo chegou a 13,72 pontos percentuais, ou 70,28%. Nem Mauá do Polo Petroquímico escapou da desindustrialização ante o PIB Geral, com queda de 5,91 pontos percentuais. Ribeirão Pires caiu 4,83 pontos percentuais.
Esse assunto está longe de ser esgotado, mesmo que restritamente a essa nova tomada de análise.
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21/11/2024 QUARTO PIB DA METRÓPOLE?