Imprensa

30ANOS: uma curadoria para
corrigir Imprensa profissional

DANIEL LIMA - 06/05/2020

Procurei no Google e não encontrei rastro de informação atualizada sobre a revista Content. A publicação norte-americana chamou minha atenção há 22 anos. Escrevi para a edição de junho de 1998 um texto que dava conta do lançamento daquela novidade no mundo jornalístico. O objetivo da inovação era não dar tréguas a jornalistas profissionais.

Mais de duas décadas depois, e salvo equívoco, não há nada semelhante nos quadrantes do mundo. No Brasil, nem pensar. Aqui há confraria da Grande Mídia que trata exclusivamente de se proteger. Mais que se proteger, também ataca as redes sociais, que lhes tomaram importantes nacos de audiência, além de exporem críticas muitas vezes exageradas, outras tantas providenciais, da atuação desse conglomerado ainda dominante na opinião publicada.

Este é o trigésimo-nono capítulo de série 30ANOS do melhor jornalismo regional do País, representado pela revista LivreMercado (março de 1990 a janeiro de 2009) e de CapitalSocial (2001). Vale a pena acompanhar:

Responsabilidade de informar 

 DANIEL LIMA - 05/06/1998

Tomara que a moda pegue por aqui. Começa a circular este mês nos Estados Unidos a revista Content (Conteúdo), que pretende tratar a mídia com o mesmo desvelo dos cães perdigueiros. Segundo as informações, Content não vai dar trégua aos jornalistas, sobre as cabeças dos quais estarão sendo esgrimidos atributos como honestidade, integridade, justiça e precisão. A publicação não estará sendo distribuída restritamente ao corporativista mundo jornalístico, como é comum na área. Vai para a massa formadora de opinião, com tiragem inicial de 150 mil exemplares. Sustentada por pesquisa em que o público tem sério interesse em saber quem é quem no mercado da comunicação, Content promete esmiuçar a vida profissional de gente que trabalha com a commoditie mais importante da atualidade: informação. 

O jornalismo nacional está por merecer algo semelhante. Certamente num primeiro momento o prestígio da classe sofreria tranco duríssimo e acabaria se debatendo nas profundezas da ética e da moralidade que atinge a imagem dos políticos, personagens mais expostos no mundo da comunicação. Há jornalistas preguiçosos, irresponsáveis, imprecisos e desinteressados em profusão bem maior do que os exatamente opostos. Por incrível que pareça, grande parte de quem tem na informação a matéria-prima de trabalho simplesmente não se empenha para aprofundar-se na atividade, sobretudo por meio do intransferível exercício da leitura obsessiva. Até porque, a maioria das redações estende a carga horária muito além do recomendável a uma atividade intensamente estressante. 

Mordomias do capitalismo

Os leitores de revista análoga à Content no Brasil poderiam conhecer mais detalhadamente alguns nomes supostamente ilustres da mídia que, convidados a participar de seminários e palestras tão desconfortáveis quanto uma bola pingando na entrada da área para um centroavante, usam da demagogia para confirmar os aplausos previamente programados. É comum que responsabilizem os meios de comunicação, inclusive os que estão vinculados profissionalmente e nos quais exercem funções de comando, por eventuais posturas editoriais que contradizem compromissos ideológicos próprios. 

Fazedores de média e carreiristas contumazes, os integrantes dessa turma adoram cultivar na vida privada as mordomias do capitalismo, mas têm de exibir a cara pública de preocupação social. São falsos apóstolos. Gozam de tantas liberdades, contrariamente ao que dizem em seus guetos, que tornam suas intervenções profissionais exercício de permanente infiltração ideológica pessoal, espancando a realidade.

Baixo conhecimento

Batem para valer (e nem poderia ser diferente) quando uma Light apressadamente privatizada no Rio de Janeiro entra em pane e prejudica os consumidores de energia. Mas se calam -- e não poderia ser diferente, também segundo sua ótica muito particular -- quando uma então estatal Eletropaulo repete as barbeiragens da concessionária carioca e causa prejuízos a milhares de usuários do sistema, pessoas físicas e jurídicas. Enfim, antepõem Estado e mercado com a inflexibilidade dos ignorantes, quando se sabe que Estado, mercado e sociedade desenham um novo conceito de gerenciamento de conflitos e interesses que só sobreviverá se houver equilíbrio de forças e de representatividade. 

Esses profissionais, só para citar outro exemplo, não sabem distinguir Tony Blair, primeiro-ministro britânico eleito pelos trabalhistas, mas de corte social atualizado, de um Lionel Jospin, dinossáurico primeiro-ministro francês socialista. Botam, segundo suas conveniências, tudo no mesmo saco político, estabelecendo paralelos entre premiês tão díspares.



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